Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia

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Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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Paride Bollettin
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
CONTRO-SGUARDI
Diálogos de antropologia visual entre Brasil e Itália
Dialoghi di antropologia visuale tra Brasile e Italia
curador – a cura di
Paride Bollettin
3
Uma realização
Una realizzazione
Traduções do italiano para o português e do português para o italiano/
Traduzioni dall’italiano al portoghese e dal portoghese all’italiano
Paride Bollettin
Martina Forti
Revisão dos textos/Revisione dei testi
Maria Aparecida Viviane Ferraz
André Lopes
Andrea Ravenda
Bollettin, Paride (org.)
Contro-Sguardi - Diálogos de antropologia Visual entre Brasil e Itália/
Dialoghi di Antropologia Visuale tra Brasile e Italia / Paride Bollettin
São Paulo: Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária - USP, 2014.
232 p. ; 21 X 15 cm.
1. Cinema 2. Antropologia 3. Antropologia Visual 4. Festivais de Cinema
CDD 791.300
CDU 791. 572
Prima edizione: aprile 2014
ISBN 978 88 6787 211 4
© 2014 Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária
Cleup - Cooperativa Libraria Editrice Università di Padova
Cleup
Cooperativa Libraria Editrice Università di Padova
Via Belzoni 118/3 – Padova – Italia
(t. +39.049.8754936 – f. +39.049.650261)
www.cleup.it
Projeto gráfico/Progetto grafico
Cleup
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Paride Bollettin
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
Sumario/Indice
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15
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31
43
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Renato Poma
Mensagem do Diretor do Istituto
Italiano di Cultura di São Paulo
Messaggio del Direttore dell’Istituto
Italiano di Cultura di São Paulo
Patrícia Moran
Mensagem da Diretora do CINUSP
Messaggio della Direttrice del CINUSP
Paride Bollettin
Contro-Sguardi: olhares, encontros
e diálogos em antropologia visual
Contro-Sguardi: sguardi, incontri
e dialoghi in antropologia visuale
Sylvia Caiuby Novaes
Filmes etnográficos e Antropologia
Film etnografici e Antropologia
Rose Satiko Gitirana Hikiji
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
em um laboratório de imagens, sons e antropologia
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
in un laboratorio di immagini, suoni e antropologia
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8
81
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147
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183
207
223
Sylvia Caiuby Novaes
Renato Athias
Filme etnográfico – o exótico,
o diferente e o respeito ao outro
Il film etnografico – l’esotico, il diverso
e il rispetto per l’altro
Allison Jablonko
Olhares compartilhados e troca de visões:
histórias de “nos” e “eles”
Sguardi condivisi e scambi di visioni:
storie di “noi” e “loro”
Tullio Seppilli
Sul e magia: pesquisa etnográfica e cinema documentário
sobre o Mezzogiorno da Itália, no segundo pós-guerra
Sud e Magia. Ricerca Etnografica e Cinema Documentario
sul Mezzogiorno d’Italia nel Secondo Dopoguerra
Andrea F. Ravenda
Imagens disputadas: As produções visuais nas
disputas entre companhias energéticas e movimentos
contra a poluição industrial, no sudeste da Itália
Immagini contese: Le produzioni visuali nelle contese
tra compagnie energetiche e movimenti contro
l’inquinamento industriale nel sud-est Italia
Fabrizio Loce Mandes
Do invisível ao visível. Uma análise etnográfica da
representação visual da surdez, nos âmbitos artístico e clínico
Dall’invisibile al visibile. Un’analisi etnografica
della rappresentazione visuale della sordità
nell’ambito artistico e clinico
Os autores/Gli autori
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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O Istituto Italiano di Cultura de São Paulo está especialmente
contente em oferecer ao público brasileiro o Festival Internacional
de Cinema Antropológico Contro-Sguardi. Os filmes que serão
apresentados pela primeira vez em São Paulo, além de terem um
valor significativo do ponto de vista da linguagem cinematográfica,
permitem aproximar o grande público a uma disciplina, a
antropologia, que a maior parte das pessoas acredita estar relegada a
um pequeno círculo de estudiosos. Mas evidentemente não é assim,
se é verdade que o estudo dos comportamentos e das ideias dos seres
humanos, em qualquer lugar que eles vivam, é para ser situado na
fundação de qualquer tentativa de diálogo e de reconhecimento do
outro. Os filmes que a Associação Contro-Sguardi tem selecionado
atentamente demostram como cada ser humano não é somente
capaz de comunicar, mas como ele mesmo é comunicação, pelo fato
mesmo de existir. A partir desse pressuposto, o nome da associação,
Contro-Sguardi (“Contra-Olhares”), adquire um valor especialmente
significativo, porque somente um olhar que se oponha a uma visão
banal e estereotipada do “outro” – um olhar que vai “contra” aos
clichês demasiadamente simples de um eurocentrismo que não
mais se sustenta – pode tentar compreender realmente e, ao mesmo
tempo, abrir a própria cultura à variedade do mundo e da vida.
Estou firmemente convencido que ações culturais como o Festival
Internacional de Cinema Antropológico Contro-Sguardi contribuem
na direção de fazer com que o público local entenda como e quanto
a cultura italiana é rica e variada; e como a atenção para com certos
temas é extraordinariamente e culturalmente muito viva, em uma terra
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Paride Bollettin
que, por razões ligada à sua longa e complexa história milenar, viu se
subseguir numerosas dominações de povos e exércitos estrangeiros.
Um país que soube aprender, para o bem e para o mal, a conviver
com culturas e tradições diferentes, e muitas vezes muito ricas, mesmo
que distantes.
Renato Poma
Mensagem do Diretor
do Istituto Italiano di Cultura de São Paulo
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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L’Istituto Italiano di Cultura di San Paolo è particolarmente lieto
di offrire al pubblico brasiliano il Festival internazionale del cinema
antropologico Contro-Sguardi. La rassegna di film che verranno
presentati per la prima volta a San Paolo, oltre ad avere un valore
significativo dal punto di vista del linguaggio cinematografico, permette
di avvicinare il grande pubblico ad una materia, l’antropologia,
che i più ritengono relegata ad una stretta cerchia di studiosi. Ma
evidentemente, non è cosi se è vero che lo studio dei comportamenti
e delle idee degli esseri umani, ovunque essi vivano, è da situarsi alla
base di ogni tentativo di dialogo e di riconoscimento dell’altro. I
film della rassegna che l’Associazione Contro-Sguardi di Perugia ha
selezionato con molto criterio, mostrano come ogni essere umano sia,
non solo capace di comunicare, ma come sia egli stesso comunicazione
per il fatto stesso di esistere. Partendo da questo presupposto, il nome
dell’Associazione, Contro-Sguardi, acquisisce una valenza decisamente
significativa giacche’ solo uno sguardo che si oppone ad una visione
banale e stereotipata dell’altro – uno sguardo che va “contro” ai
cliché’ fin troppo facili di un eurocentrismo che non tiene più – può
cercare di capire davvero e, allo stesso tempo, di aprire la propria
cultura alla varietà del mondo e della vita. Sono fermamente convinto
che operazioni culturali quali quella del Festival Internazionale del
Cinema Antropologico Contro-Sguardi contribuiscano a far intendere
al pubblico locale come e quanto la cultura italiana sia varia e ricca;
e come l’attenzione per certe tematiche sia straordinariamente e
culturalmente assai viva in una terra che, per motivi legati alla sua
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Paride Bollettin
lunga e composita storia millenaria, ha visto succedersi numerose
dominazioni di popoli ed eserciti stranieri. Un Paese che, tuttavia,
ha saputo apprendere, nel bene e nel male, a convivere con culture
e tradizioni differenti e spesso anche molto ricche, benché lontane.
Renato Poma
Messaggio del Direttore
dell’Istituto Italiano di Cultura di São Paulo
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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Criar espaço para ouvir povos e grupos sistematicamente silenciados é um dos objetivos do Festival Internacional de Cinema Antropológico Contro-Sguardi, em português “Contra-Olhares”. Para
a primeira edição fora de Perugia, cidade italiana onde o Festival
acontece desde 2008, selecionaram-se filmes e vídeos expressivos da
heterogeneidade de problemas e olhares contemplados pelo Festival. A Mostra ora sediada pelo CINUSP expressa o diálogo entre o
Festival e a Universidade de São Paulo, iniciado pela parceria com o
Laboratório de Imagem e Som em Antropologia (LISA). Ao receber
Contra-Sguardi esperamos amplificar experiências cuja missão se alinha à do CINUSP, por exemplo, criar vias de mão dupla na produção
de conhecimento. Como órgão de extensão vislumbramos socializar e
sistematizar saberes com lastro acadêmico e simultaneamente, acolher
saberes engendrados na vida cotidiana. Tencionar linhas divisórias
entre poderes e saberes, em prol do reconhecimento de sua transversalidade, é um caminho para se minorar abismos de diversas naturezas.
As questões apontadas pelos autores reunidos neste livro traduzem
este debate da transversalidade do conhecimento. O texto de Paride
historiciza as opções políticas e estéticas do Festival ao selecionar
tanto realizadores consagrados quanto amadores, linguagens pautadas por gramáticas consolidadas historicamente e a experimentação,
destinando sua programação ao público especialista da antropologia e
ao comum. Os cruzamentos de formas expressivas e metodologias da
antropologia visual e etnografia são problematizados pela professora
e coordenadora do LISA Sylvia Cauby Novaes, que ao preterir um
recorte temporal em sua leitura, aproxima Jean Rouch à antropologia
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Paride Bollettin
denominada “pós-moderna”. Rose Satiko Hikiji, também professora
da USP e integrante do LISA recupera a história das pesquisas do
LISA, destacando o papel do audiovisual como experimentação e
obra performativa, incluindo na pesquisa o pesquisador e o sujeito
ou grupo pesquisado. O direito à produção de representações da
própria imagem, questão cara à antropologia e etnografia, tem espaço
nos ensaios de Andrea Ravenda, Fabrizio Mandes e Allison Jablonko.
Renato Athias parte de filmes pioneiros como Nanook do Norte de
Robert Flaherty, O homem da câmera de Vertov e pesquisadores também pioneiros como André Leroi-Gourhan para traçar um panorama
de festivais etnográficos no Brasil. Tullio Seppilli retoma a produção
antropológica do cinema italiano após a segunda grande guerra. Os
problemas e autores deste livro não são ponto de chegada de um estado da arte, mas ponto de partida para o investimento na pesquisa
continuada de encontros aqui sintetizados. Novamente rua de mão
dupla, a pesquisa como o encontro e debate de novos problemas desta
nossa era de excessos de imagens e de técnicas, que sob a rubrica da
globalização tende a minimizar a diferença e o pequenos, que ganham
na Mostra e publicação a singularidade necessárias para conferir ao
Outro um lugar de relevo, oferecendo mapas de problemas contemporâneos relacionados ao documentário, seja ele etnográfico ou não.
Patrícia Moran
Mensagem da Diretora do CINUSP
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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Uno degli obbiettivi del Festival Internazionale di Cinema Antropologico Contro-Sguardi, in portoghese “Contro-Sguardi”, è di
creare spazi nei quali ascoltare popoli e gruppi sistematicamente
silenziati. Per la prima edizione al di fuori di Perugia, città italiana
nella quale in Festival ha luogo dal 2008, sono stati selezionati film e
video espressivi dell’eterogeneità di problemi e sguardi contemplati
dal Festival. La retrospettiva sostenuta dal CINUSP esprime il dialogo
tra il Festival e l’Università di São Paulo, iniziato con la collaborazione con il Laboratório de Imagem e Som em Antropologia (LISA).
Ricevendo Contro-Sguardi speriamo di amplificare esperienze la cui
missione si allinea a quella del CINUSP, ad esempio nel creare strade
a doppio senso nella produzione di conoscenze. In quanto organo di
estensione della Universidade de São Paulo cerchiamo di socializzare
e sistematizzare saperi di stampo accademico e simultaneamente accogliere saperi scaturiti dalla vita quotidiana. Mettere in tensione le
linee di divisione tra poteri e saperi, in favore del riconoscimento della
loro trasversalità, è una strada per ridurre abissi di diversa natura. Le
questioni indicate dagli autori raccolti in questo libro traducono questa
discussione della trasversalità della conoscenza. Il testo di Paride storicizza le opposizioni politiche ed estetiche del Festival al selezionare
sia realizzatori consacrati quanto amatoriali, linguaggi marcati da
grammatiche consolidate storicamente e la sperimentazione, destinando la programmazione al pubblico specialista dell’antropologia
ed al pubblico comune. L’incrocio di forme espressive e metodologie
dell’antropologia visuale e dell’etnografia vengono problematizzate
dalla professoressa e coordinatrice del LISA Sylvia Caiuby Novaes,
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Paride Bollettin
che al tracciare un ritaglio temporale nella sua lettura avvicina Jean
Rouch all’antropologia cosiddetta “post-moderna”. Rose Satiko Hikiji,
anche lei professoressa della USP ed integrante del LISA, recupera
la storia delle ricerche del LISA come tema, mettendo in risalto il
ruolo dell’audiovisuale come sperimentazione ed opera performativa, includendo nella ricerca il ricercatore ed il soggetto del gruppo
investigato. Il diritto alla produzione delle rappresentazioni della
propria immagine, questione cara all’antropologia ed all’etnografia,
trova spazio negli articoli di Andrea Ravenda, Fabrizio Loce Mandes
e Allison Jablonko. Renato Athias comincia dai film pionieri Nanook
do Norte di Robert Flaherty, O Homem da câmera di Vertov, e anche
ricercatori precursori, come André Leroi-Gourham, per tracciare un
panorama dei Festival etnografici in Brasile. Tullio Seppilli ripercorre la produzione antropologica del cinema italiano dopo la seconda
guerra mondiale. I problemi e gli autori di questo libro non sono un
punto di arrivo di uno stato dell’arte, ma il punto di partenza per un
investimento in una continua ricerca di quegli incontri qui sintetizzati. Nuovamente una strada nei due sensi di marcia, la ricerca come
l’incontro, e la discussione di nuovi problemi di questa nostra era di
eccessi di immagini e di tecniche, che nella rubrica della globalizzazione tende a minimizzare la differenza e il piccolo, che guadagnano nella
Retrospettiva e nel libro le singolarità necessarie a conferire all’Altro
un luogo di rilievo, offrendo una mappa dei problemi contemporanei
in relazione al documentario, sia esso etnografico o no.
Patrícia Moran
Messagggio della Direttrice CINUSP
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
CONTRO-SGUARDI
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Paride Bollettin
Paride Bollettin
Contro-Sguardi: olhares, encontros
e diálogos em antropologia visual
Contro-Sguardi: sguardi, incontri
e dialoghi in antropologia visuale
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
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Introduzir um Festival de cinema antropológico é falar de olhares,
encontros e diálogos: muitas motivações estão em jogo e muitas pessoas
se envolvem para realizar o evento. Razões e pessoas que trazem seus
próprios “olhares”, cruzando-os e (re)produzindo miscigenações, em
constante transformação. Isso vale ainda mais quando se pensa em
um Festival que já no nome apresenta a proposta de ser um “ContraOlhares”, um olhar sobre o olhar, ou um encontro de olhares. A
primeira edição do Contro-Sguardi fora de Perugia, cidade que sediou
as edições anteriores, marca mais um deslocamento de olhares e,
mais do que isso, suscita vários encontros de olhares. A escolha de
realizar essa retrospectiva do Festival em São Paulo deriva da vontade
de ampliar esses diálogos, esses encontros e esses contra-olhares.
Convém, por isso, percorrer novamente alguns dos momentos mais
relevantes da trajetória do Festival, para melhor introduzir as danças
de aproximação e distanciamento que seguem, tanto visuais como
escritas.
Focarei aqui nas atividades do Festival, por serem aquelas
apresentadas no evento paulistano. Contro-Sguardi, porém, é um
projeto maior, daí o fato de ser também o nome da Associação que
organiza o Festival. A Associação realizou outras atividades, como
as pesquisas etnográficas – que também utilizaram os instrumentos
audiovisuais – sobre os pescadores do lago Trasimeno na Úmbria
(região do centro da Itália) ou sobre a Corsa dei Ceri di Gubbio, festa
tradicional dessa cidade da Úmbria, ou ainda sobre os impactos das
centrais elétricas de carvão na Puglia (região do sul da Itália). Outras
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Paride Bollettin
atividades envolvem publicações, como o livro Ripescare il Trasimeno1
e eventos em colaboração com outras entidades, tanto na Itália como
no exterior, como o projeto Aowa Donne di Palestina, em colaboração
com a Associação Ponte Solidale, ou os dias de antropologia visual no
Congresso Internacional de Americanística, organizado pelo Centro
Studi Americanistici “Circolo Amerindiano”.2 Um leque de atividades
que mostra claramente a vontade de ampliar o alcance da antropologia,
e da antropologia visual em especificadamente, para além dos diálogos
acadêmicos, buscando constantemente novos e inesperados parceiros.
Em 2008, no âmbito do curso de doutorado em antropologia,
desenvolvido em colaboração pelas universidades de Perugia, de
Cagliari e de Siena, um pequeno grupo de alunos estava à procura
de formas de ultrapassar as barreiras, etnográficas e temáticas, entre
as respectivas pesquisas.3 Esse primeiro encontro teria marcado os
desenvolvimentos posteriores, pois, encontrar um terreno de reflexão
comum não constituía um movimento fácil. A escolha assim foi
recaindo sobre o que apareceu ser um instrumento promissor: o vídeo
etnográfico. O uso das mídias visuais, de fato, permite aproximações
Pequeno livro de divulgação da pesquisa homônima: Contro-Sguardi (a cura
di). Ripescare il Trasimeno. Perugia: Core Books, 2012.
2
A Associazione Ponte Solidale desenvolve atividades de cooperação com o povo
Palestino. O Centro Studi Americanistici “Circolo Amerindiano” é o principal centro de pesquisa sobre as Américas, de forma inter e transdisciplinar, da Itália, e
organiza todo ano um Congresso em Perugia, no mês de maio, no âmbito do qual
recentemente se começou, em colaboração com Contro-Sguardi, a apresentar filmes
etnográficos sobre vários temas.
3
O grupo era constituído por Andrea Ravenda, que desenvolvia uma pesquisa
sobre os fenômenos migratórios na Itália (e que foi o primeiro Presidente da Associação Contro-Sguardi, fundada em 2010), Alexander Koensler, que estudava os
movimentos políticos palestinos e israelenses, na Palestina, e Paride Bollettin, que
trabalhava com o povo indígena Kayapó-Xikrin, na Amazônia brasileira. Progressivamente, também se integrou à equipe organizadora Fabrizio Loce Mandes, que
pesquisa os surdos-mudos em Perugia, e é o atual Presidente da Associação. As
distâncias entre as pesquisas eram compensadas pela vontade de diálogo dentro do
grupo, que contava também com aportes esporádicos de outros colegas, no âmbito
de um grupo de estudos, formado na Università degli Studi di Perugia.
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Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
21
muito mais diretas entre diferentes abordagens e âmbitos teóricos,
por que conectam, de forma criativa e inesperada, múltiplos agentes:
os etnógrafos, os “nativos”, os cineastas e o próprio público em
geral. A escolha do vídeo etnográfico respondia também a um outro
desejo: como levar a reflexão antropológica para fora das elitistas
aulas acadêmicas e colocá-la para dialogar de forma produtiva com
um público não especialista? O vídeo, além de aproximar olhares
treinados no exercício antropológico de observação do “outro”,
permite colocar em diálogo os olhares mais distantes – e essa foi a
aposta do Contro-Sguardi – sobre as mais variadas possibilidades de
se organizar a vida humana na contemporaneidade.
A primeira edição do Festival, realizada entre 15 e 29 de novembro
de 2008, conseguiu juntar onze filmes,4 divididos por temas e com a
presença de “especialistas”, ou seja, de pessoas que pesquisam aquelas
áreas, para que comentassem o filme, quando possível, com o próprio
diretor. O tema que surgiu como eixo do evento foi Contro-Sguardi
e Transmigrações Visuais, para evidenciar essa vontade de propor
formas de ultrapassar barreiras, com o intuito de buscar construir
diálogos através do vídeo. A escolha dos filmes levou em consideração
a manutenção de um equilíbrio entre autores que já tivessem um
histórico na produção de vídeos etnográficos e outros que fossem
iniciantes. Isso porque a proposta geral do Festival não queria excluir
os jovens autores, privilegiando os já consolidados, mas sim colocar
em diálogo a experiência e a inovação, a tradição e a experimentação.
Seguindo essa proposta, os “especialistas” não eram necessariamente
acadêmicos, mas também jovens estudantes interessados no tema. O
resultado desses encontros foi uma presença maciça de público, que
compreendia universitários, professores, interessados em cinema e
outros curiosos. A Associação Cultural Macadam,5 que ofereceu o
Ver http://www.controsguardi.com/index.php?lang=it
A Associação Cultural Macadam é uma realidade da cidade de Perugia, que
desenvolve múltiplas atividades no campo da divulgação da arte e de sensibilização cívica na cidade. Os espaços da sede dessa Associação compreendem uma
grande sala versátil que, naquela oportunidade e nas seguintes, foi adaptada a
cinema.
4
5
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Paride Bollettin
espaço, conseguiu abrigar todo o público, juntando os participantes
em momentos de reflexão geral sobre as obras projetadas e em ocasiões
de diálogos mais informais, nos buffets do evento.
Diante do ótimo resultado da primeira edição, decidiu-se
continuar com a organização do evento, envolvendo novos parceiros:
a prefeitura da cidade de Perugia, a Universidade de Perugia e,
sobretudo, abrindo o primeiro espaço de diálogo internacional por
meio da parceria oficial com o Festival do Filme Etnográfico do
Recife.6 O programa do Festival, realizado entre 12 de novembro
e 19 de dezembro de 2009, enriqueceu-se também com exposições
fotográficas e apresentações de livros, além de manter a proposta
da exibição de filmes com debates consecutivos com os diretores
e especialistas do tema. Especialistas que, como na edição anterior,
não se limitavam aos pesquisadores experientes, mas também eram
representados por pessoas de outra formação. Pudemos assim contar
com a participação de representantes do povo africano Saharawi7
e de representantes dos Tribal Peoples da Índia,8 por exemplo.
Dessa forma, o Festival continuou com a proposta de multiplicar
os encontros e as trocas de olhares, como também emerge do título
proposto: Permanências, Transmutações, Encontros. A multiplicação
dos espaços expositivos e cinematográficos, desde cinemas públicos
até salas de associações culturais, de salas universitárias até espaços
públicos, gerou assim uma proliferação de momentos de encontro,
de diálogos e de mistura. Isso consolidou a proposta de enfatizar o
evento do Festival como um momento de reflexão e diálogo sobre
a variedade da contemporaneidade, a polissemia da experiência
Essa parceria permitiu ao Festival obter o apoio e um patrocínio da Embaixada
do Brasil na Itália. Além disso, a parceria previa que os filmes vencedores de cada
Festival fossem em seguida apresentados no outro, reciprocamente, de forma a criar
um diálogo entre os dois eventos, além da abertura de possibilidades de ver filmes
em mais de um contexto.
7
O povo Saharawi habita a região do Saara Ocidental, e há anos luta pelo reconhecimento da sua própria independência do Marrocos.
8
“Tribal Peoples” é o termo genérico utilizado oficialmente para se referir a comunidades “tradicionais” do subcontinente indiano.
6
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
23
audiovisual, o panorama das situações experimentadas pelas pessoas,
em diferentes contextos e momentos.
A possibilidades de um aumento progressivo dos participantes
e de um aprofundamento das trocas recíprocas incentivou vários
novos colaboradores a se envolverem com a organização do evento,
ampliando as linhas de interesse na direção de experimentações
visuais, como a vídeo-arte, que entraram nas propostas das edições
posteriores. Desse modo, na edição de 19 a 29 de novembro de 2010,
o Festival ganhou mais momentos de diálogo e reflexão, com uma
abertura mais sistemática da antropologia em direção à dita “sociedade
civil”, e de outras formas de expressão estética e visual, com um
evento dedicado especialmente a esses outros olhares. Manteve-se
porém, ao mesmo tempo, uma ênfase nos filmes etnográficos, como
forma peculiar de direcionar o olhar cinematográfico. O programa,
focado em Contro-Sguardi, Cortes, Rasgos, Costuras, contou com cerca
de 40 filmes, além de exposições fotográficas e eventos musicais.
Mas outras novidades entraram no Festival. Abriram-se maiores
possibilidades de colaboração internacional: com o Laboratório
de Imagem e Som em Antropologia da Universidade de São
Paulo (LISA-USP), com o Sensory Ethnography Lab da Harvard
University e o Laboratório de Antropologia Visual da Universidade
de Moscow, além de colaborações com outras instituições italianas.
Além disso, outra importante novidade foi a formalização da primeira
edição, em formato de concurso do Festival com a formação de um
júri internacional e a entrega de três prêmios aos melhores filmes
apresentados. Nesse evento, dando continuidade à proposta inicial
do Festival, foi feita a escolha de dividir as categorias premiáveis entre
filmes de autores já consagrados e de novos diretores, e também entre
filmes de grande orçamento e de pequeno orçamento, de forma a
incentivar a participação de jovens diretores no Festival.
Essas condições também continuaram com a quarta edição do
Festival, dedicada ao tema Multimídia, Trabalho, Cultura, realizada
entre 22 e 24 de junho de 2012. Pela primeira vez, nessa oportunidade,
resolveu-se projetar os filmes de forma “paralela” e realizar os debates
somente quando estivesse presente o diretor do filme. Dessa forma,
24
Paride Bollettin
foi possível expandir a oferta de filmes apresentados, chegando a um
número de 60, nos três dias de programação. Nessa edição, como
nas anteriores, os eventos fílmicos continuaram a ser acompanhados
de outras atividades complementares, como exibições fotográficas,
performances de vídeo-arte e espetáculos musicais, além de poder
contar com a participação de convidados estrangeiros. A escolha de
mostrar um maior número de filmes ampliou o panorama de discussões
e de reflexões no âmbito do Festival, mas sempre mantendo uma
postura dialógica, que abrisse a reflexão na direção da sociedade civil.
Por isso, participaram personalidades da esfera operária, do sindicato
e das instituições, enfatizando desse modo o tema eixo do Festival: o
“trabalho”, entendido nas suas mais variadas facetas. Tratou-se de um
momento denso e colaborativo, no qual se desenvolveu um diálogo
que visava refletir, a partir de um olhar especificamente etnográfico,
apresentado nos filmes da programação, sobre as múltiplas formas de
pensar a agência humana. Dessa forma, procurou-se, com sucesso, dar
continuidade ao diálogo entre a produção etnográfica e antropológica
e os não especialistas, ampliando o alcance das reflexões acadêmicas
na direção de um público maior.
A partir dessas experiências é fácil reconhecer algumas caraterísticas
marcantes da proposta do Contro-Sguardi. Uma primeira é que a
trajetória do Festival evidencia a importância de construir diálogos
em múltiplos níveis: o evento surgiu a partir da busca de pontos
comuns entre “campos” diferentes, o que evidencia a importância de
se contaminar no encontro com “outros” diversos, traço caraterístico
da prática antropológica. Assim, o filme etnográfico se torna
instrumento de confronto e de troca entre pesquisadores, gerando a
possibilidade de uma primeira camada de “contra-olhar”, na busca
incessante de novas sugestões. Mas essa possibilidade deriva de uma
peculiaridade própria dessa modalidade visual específica, que busca
um outro encontro: com o “nativo” capturado na sua cotidianidade.
Mas esse nativo já não é mais um objeto estático e subjugado da
pesquisa, e sim, como bem evidenciam os filmes apresentados nos
vários Festivais – assim como a evolução histórica da antropologia
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
25
visual, ou ainda os textos reunidos nessa coletânea – um sujeito ativo
que tem que ser levado a sério na sua capacidade de apropriação e
ressignificação das próprias ferramentas audiovisuais. Encontramos
assim produções fílmicas que apresentam um olhar externo sobre o
exótico, outras que buscam uma produção compartilhada, e outras
ainda que invertem esse olhar. Contro-Sguardi procurou evidenciar
essas três modalidades de encontro visual, percorrendo um contínuo
movimento de ida e volta, e construindo, ao redor de eixos temáticos
específicos, as múltiplas formas de utilizar o vídeo.
Essas diferentes formas, por sua vez, permitem, além do diálogo
entre campos etnográficos diferentes, perpassar a linha temporal,
colocando ideias e metodologias umas diante das outras, ao lado das
outras, em cima das outras, num outro “contra-olhar” que permite
observar um filme com o olhar de outro. Como já deve estar claro, o
filme não é uma simples reprodução de imagens neutras, mas veicula
dinâmicas específicas de produção (mais ou menos compartilhadas e
dialógicas) de verdades diferentes. Assim, a possibilidade de contrapor
filmes, contemporâneos ou de épocas diferentes, produzidos por
etnógrafos ou cineastas exóticos, de longa ou curta duração, abre
múltiplos olhares novos. A contraluz, ou no contra-olhar, de um
filme, o seu outro fílmico adquire novos sentidos, novas dimensões
semânticas antes ocultas ou de difícil percepção. Temos assim um
Festival – essa foi uma das finalidades explícitas de Contro-Sguardi
– que nos oferece um espaço e um momento para revisar produções
“clássicas” da etnografia sob uma nova luz, e ao mesmo tempo
para contaminar as produções mais recentes, de jovens e muitas
vezes talentosos cineastas, com novas ideias, oriundas de outros
filmes, de outras trajetórias etnográficas, de outras preocupações
epistemológicas.
Mas isso não esgota as possibilidades. Temos mais um nível de
encontro, ou olhar recíproco, que Contro-Sguardi perseguiu, ao
longo de seu percurso. A partir da constatação que muitas vezes
a discussão antropológica tem dificuldades em alcançar o grande
público, por várias razões que não cabem aqui, os organizadores
26
Paride Bollettin
sempre perceberam a urgência de abrir o Festival para um público de
não especialistas, um público que por sua vez pudesse acrescentar e
enriquecer o evento com outros olhares alternativos e peculiares. Ao
longo do Festival, portanto, sempre se procurou organizar projeções
em lugares públicos, abrindo um diálogo entre as salas universitárias
e os espaços utilizados também pelos não acadêmicos. Da mesma
forma, debater os filmes de forma conjunta entre “especialistas
oficiais” e “especialistas profanos” foi uma forma de deslocar o olhar
recíproco na direção de novos contra-olhares. O diálogo entre um
operário e um pesquisador do trabalho, ou entre um representante
do povo Saharawi e um pesquisador dos povos africanos, ou entre
um etnomusicólogo e um musicista, constitui, assim, não somente
uma forma de rever distinções vetustas na produção do saber, mas
também um enriquecimento coletivo e compartilhado, que visa a um
maior envolvimento no conhecimento mútuo.
Todos esses aspectos, a busca por diálogos entre velhas e novas
formas de produzir antropologia visual, a vontade de contaminar
os diferentes campos de pesquisa num movimento de aproximação
recíproca e a marca da horizontalidade do encontro fizeram de
Contro-Sguardi um momento especial e específico no panorama dos
festivais de antropologia visual. Desse modo o Festival adquiriu uma
personalidade própria, como momento de encontro entre diferentes
propostas, incluindo também formas expressivas aparentemente
desconexas aos materiais audiovisuais de cunho etnográfico, como a
vídeo-arte ou as performances artísticas e musicais, e assim por diante.
A direção que o Festival tomará não nos é possível saber, pois ele
mesmo se propõe como um evento em constante transformação e
redefinição pelo encontro de outros olhares. O evento realizado em
São Paulo, uma retrospectiva das edições anteriores do Festival em
Perugia, acompanha justamente a trilha seguida até hoje. Teremos
aqui a possibilidade de assistir uma seleção de filmes que passaram no
Festival Contro-Sguardi, permitindo um novo olhar sobre essas obras.
Um novo olhar que poderá encontrar a visão do próprio Festival, por
meio do processo de seleção das obras, que buscou conectar produções
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
27
da escola de antropologia visual italiana com produções selecionadas
no panorama internacional, a serem apresentadas no Brasil num
encontro a três, uma multiplicação de perspectivas recíprocas que
constituirá um importante momento dialógico. Diálogos que se desde
sempre ofereceram à antropologia a possibilidade de estender o
próprio olhar para além das fronteiras de “casa”, hoje nos permitem
interrogarmo-nos sobre as várias multiplicações de olhares e de
“casas”, e que o vídeo etnográfico permite explicitar de maneira
exemplar.
O vídeo é o instrumento principal desses encontros de olhares,
mas não somente, pois dialoga de forma densa com os textos aqui
impressos, cuja publicação, ao mesmo tempo em português e italiano,
evidencia a principal finalidade desse evento: abrir conexões, diálogos
e afetações, de acordo com a proposta de Contro-Sguardi. Escolhemos
assim incluir algumas contribuições italianas e brasileiras sobre o
tema da antropologia visual, de forma a sugerir possíveis caminhos a
serem percorridos dialogicamente entre os dois lados do Atlântico.
Os textos que se seguem, portanto, querem ser tanto panorâmicas
de perspectivas sobre o olhar da antropologia visual, como também
aproximações e encontros (às vezes desencontros), que possam abrir
mais diálogos.
Os textos de Sylvia Caiuby Novaes e de Rose Satiko Gitirana Hikiji
apresentam de forma muito pontual e densa as reflexões propostas no
Laboratório de Imagem e Som em Antropologia da Universidade de
São Paulo, conectando-as ao mesmo tempo com aquelas desenvolvidas
no Contro-Sguardi, trazendo à luz as possibilidades de entendimentos
recíprocos. Por outro lado, o trabalho de Renato Athias, diretor do
Festival do Filme Etnográfico de Recife, debruça-se sobre a relação
entre os festivais e seus públicos, outro tema central na história de
Contro-Sguardi. Por sua vez, Allison Jablonko interroga-se sobre
a evolução dos encontros de olhares veiculados pela antropologia
visual, mostrando como Contro-Sguardi constitui uma interessante
oportunidade de repensar as interações no vídeo etnográfico. Em
seguida, Tullio Seppilli relembra a importância das influências
28
Paride Bollettin
da antropologia italiana no desenvolvimento da escola italiana de
documentários no pós-guerra. Enfim, Andrea Ravenda e Fabrizio
Loce Mandes apresentam duas pesquisas em andamento, nas quais a
imagem e o visual surgem como elementos primários na compreensão
da realidade etnográfica. Trata-se, como se pode ver, de um conjunto
heterogêneo de reflexões que visam apresentar possíveis caminhos a
serem percorridos, traçando familiaridades e distanciamentos entre
as produções desenvolvidas nas duas tradições.
Mas se o evento constitui em si essa significativa experiência
de deslocamento, em múltiplos planos de olhares, encontros e
diálogos, ele permitiu também aproximar entidades e perspectivas
já em seu processo de organização. Uma colaboração sem a qual,
pragmaticamente, não teria sido possível realizar o evento, mas que
veio a abrir um cruzamento fecundo de caminhos. Agradecemos aqui9
ao Laboratório de Imagem e Som em Antropologia da Universidade
de São Paulo, instituição que promoveu e incentivou a realização
desse evento;10 toda a equipe do Cinusp, que disponibilizou espaços,
esforços e valiosas sugestões na sua concretização; o Istituto Italiano di
Cultura di São Paulo, sem o apoio do qual esse encontro não teria sido
possível, do ponto de vista financeiro, institucional e logístico; o Centro
de Estudos Ameríndios da Universidade de São Paulo, estimado
Limito-me a citar as instituições, sem nomear pessoalmente os inúmeros colaboradores fundamentais na organização de um evento como este, mas que seja aqui
registrada a imensa gratidão para com todos eles, na esperança que os diálogos aqui
abertos possam continuar no futuro.
10
Vale a pena evidenciar como essa realização conjunta de uma retrospectiva do
Festival Contro-Sguardi, por parte da Associação Contro-Sguardi e do LISA, abre novos caminhos na direção de promover a circulação das obras de antropologia visual,
num momento em que se multiplicam as cátedras da disciplina, o interesse por parte
da comunidade acadêmica e de parte do grande público, além da profusão de novos
instrumentos técnicos. A parceria entre as duas instituições, que se concretizou com
a participação da diretora do LISA, Sylvia Caiuby Novaes, no júri do Festival em
2012 e na apresentação das produções do LISA no mesmo contexto, permite não
somente a circulação dos trabalhos, mas afetações recíprocas e a abertura de diálogos fecundos.
9
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
29
parceiro na produção da exposição fotográfica “Tempo e Espaço
dos Mebengokré”, que nos oferece um “contra-olhar” fotográfico; os
técnicos que realizaram as legendas; o pessoal do Conjunto Nacional;
e todos os demais que colaboraram com a organização do evento.
A nossa expectativa é que estes momentos de olhares recíprocos,
encontros e diálogos, não se esgotem no âmbito do Festival, mas sim – e
é o que tem acontecido com Contro-Sguardi até hoje e talvez seja essa
a sua especificidade – contaminar quem participa com um contínuo
processo de deslocamento através do encontro com múltiplos outros
olhares, com múltiplos movimentos de contínua abertura de novos
pontos de vista, com inúmeros “contra-olhares”.
30
Paride Bollettin
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
31
Introdurre un Festival di cinema antropologico significa parlare di
sguardi, incontri e dialoghi: molte motivazioni sono in gioco e molte
persone sono coinvolte per realizzare l’evento. Ragioni e persone che
portano propri “sguardi”, incrociandoli e (ri)producendo meticciati in
costante evoluzione. Questo vale ancora di più quando si pensa ad un
Festival che già nel nome presenta la proposta di essere un “ControSguardi”, uno sguardo sullo sguardo, o un incontro di sguardi. La
prima volta di Contro-Sguardi fuori da Perugia, città che ha ospitato
le precedenti edizioni, segna un ulteriore dislocamento di sguardi e
ancora di più suscita vari incontri di sguardi. La scelta di realizzare
questa retrospettiva del Festival a São Paulo deriva dalla volontà
di ampliare questi dialoghi, questi incontri e questi contro-sguardi.
Conviene, per questo, ripercorrere nuovamente alcuni dei momenti
più rilevanti della traiettoria del Festival per meglio introdurre le
danze di avvicinamento e distanziamento che seguono, tanto visuali
come scritte.
Mi concentrerò qui sulle attività del Festival perché sono queste
quelle presentate nell’evento paulistano. Contro-Sguardi, però, è un
progetto maggiore, da ciò anche il fatto di essere il nome dell’Associazione che organizza il Festival. L’Associazione ha realizzato innumerevoli attività nella sua storia, come ricerche etnografiche, le quali hanno
utilizzato anche o strumento audiovisuale, sui pescatori del Lago
Trasimeno in Umbria (regione dell’Italia centrale) o sulla Corsa dei
Ceri di Gubbio, festa tradizionale di questa città dell’Umbria, o ancora
sugli impatti delle centrali elettriche a carbone in Puglia (regione del
sud Italia). Altre attività comprendono pubblicazioni, come il libro Ri-
32
Paride Bollettin
pescare il Trasimeno1 ed eventi in collaborazione con altre entità tanto
in Italia come all’estero, come il progetto Aowa Donne di Palestina,
in collaborazione con l’Associazione Ponte Solidale, o le giornate di
antropologia visuale nel Convegno Internazionale di Americanistica
organizzato dal Centro Studi Americanistici “Circolo Amerindiano”2.
Una gamma di attività che mostra chiaramente la volontà di ampliare
il raggio d’azione dell’antropologia, e dell’antropologia visuale nello
specifico, al di là dei dialoghi accademici, ricercando costantemente
nuovi ed inattesi compagni.
Nel 2008, nell’ambito del corso di dottorato in antropologia, sviluppato in collaborazione tra le università di Perugia, Cagliari e Siena,
un piccolo gruppo di alunni era alla ricerca di forme di oltrepassare
le barriere, etnografiche e tematiche, tra le rispettive ricerche3. Un
primo incontro che avrebbe segnato gli sviluppi successivi, perché
incontrare un terreno di riflessione comune non costituiva un facile
movimento. La scelta così ricadde su ciò che apparve essere uno
strumento promettente: il video etnografico. L’uso dei media visuali,
di fatto, permette approssimazioni molto più dirette tra differenti
Libro di divulgazione dell’omonima ricerca: Contro-Sguardi (a cura di), Ripescare il Trasimeno, Perugia, Core Books, 2012.
2
L’Associazione Ponte Solidale porta avanti attività di cooperazione con il popolo Palestinese. Il Centro Studi Americanistici “Circolo Amerindiano” è il principale centro di ricerca sulle Americhe, in maniera inter- e transdisciplinare, d’Italia
e organizza ogni anno un Congresso a Perugia nel mese di maggio, in questa sede
recentemente si è cominciato, in collaborazione con Contro-Sguardi, a presentare
film etnografici su vari temi.
3
Il gruppo era costituito da Andrea Ravenda, che portava avanti una ricerca sui
fenomeni migratori in Italia (e che è stato il primo Presidente della Associazione
Contro-Sguardi, fondata nel 2010), Alexander Koensler, che studiava i movimenti
politici palestinesi e israeliani in Palestina e Paride Bollettin, che lavorava con il
Popolo indigeno Mebengokré-Xikrin nell’Amazzonia brasiliana. Successivamente
è entrato a far parte dell’equipe organizzatrice anche Fabrizio Loce Mandes, che
fa ricerca con i sordo-muti a Perugia e che è l’attuale Presidente dell’Associazione,
Le distanze tra le ricerche erano colmate dalla volontà di dialogo all’interno del
gruppo, che contava anche sul supporto sporadico di altri colleghi, nell’ambito di
un gruppo di studio informale formato nell’Università degli Studi di Perugia.
1
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
33
approcci e ambiti teorici, perché connettono in maniera creativa ed
inattesa molteplici agenti compresenti: gli etnografi, i “nativi”, i registi
e lo stesso pubblico. La scelta del video etnografico rispondeva anche
ad un altro desiderio: come portare la riflessione antropologica al di
fuori delle elitiste aule accademiche e farla dialogare in maniera produttiva con un pubblico non specialista? Il video, oltre ad avvicinare
sguardi allenati all’esercizio antropologico di osservazione dell’“altro”,
permette di far e dialogare sguardi anche distanti – e questa è stata la
scommessa di Contro-Sguardi – sulle più varie possibilità di organizzarsi della vita umana nella contemporaneità.
La prima edizione del Festival, che è stata realizzata tra i giorni 15
e 29 novembre del 2008, riuscì a raggruppare undici film4, divisi per
ambiti tematici e con la presenza di “specialisti”, ossia di persone che
indagassero il tema, perché commentassero il film, assieme col regista
quando possibile. Il tema che sorse come colonna portante dell’evento
fu Contro-Sguardi e Trasmigrazioni Visuali, per evidenziare questa volontà di proporre forma di oltrepassare barriere nella direzione di una
ricerca di costruzione di dialoghi attraverso il video. La scelta dei film
seguì un equilibrio tra autori che già avessero una storia nella produzione di video etnografici e altri autori ancora all’inizio della carriera.
Questo perché la proposta generale del Festival non voleva escludere i
giovani autori privilegiando quelli già affermati, ma invece far dialogare
esperienza ed innovazione, esercizio e nuove proposte, tradizione e
sperimentazione. Seguendo questa proposta, gli “specialisti” non erano
necessariamente accademici, ma anche giovani studenti interessati ai
temi. Il risultato di questi incontri fu una massiccia presenza di pubblico, che comprendeva universitari, professori, interessati al cinema e altri
curiosi. L’Associazione Culturale Macadam5, che ha offerto lo spazio,
Ver http://www.controsguardi.com/index.php?lang=it
L’Associazione Culturale Macadam è una realtà della città di Perugia che porta
avanti molteplici attività nel campo della divulgazione dell’arte e della sensibilizzazione civica nella città. Gli spazi della sede dell’Associazione comprendono una
grande sala versatile che in quella opportunità, come nelle successive, è stata adattata a cinema.
4
5
34
Paride Bollettin
riuscì a contenere tutto il pubblico, mettendo assieme i partecipanti
in momenti di riflessione generale sulle opere proiettate e momenti di
dialogo più o meno informale durante i successivi banchetti.
Di fronte all’ottimo risultato della prima edizione, si decise di continuare nell’organizzazione dell’evento, coinvolgendo nuovi compagni:
il comune della città di Perugia, l’università di Perugia e soprattutto
aprendo un primo dialogo internazionale attraverso la collaborazione
ufficiale con il Festival do Filme Etnográfico do Recife6. Il programma
del Festival, realizzato tra i giorni 12 novembre e 19 dicembre del 2009,
si arricchì anche con esposizioni fotografiche e presentazioni di libri,
oltre a mantenere la proposta di visione dei film seguita da successive
discussioni con i registi e specialisti sul tema. Specialisti che, come
nell’edizione precedente, non si limitavano ai ricercatori affermati,
ma erano rappresentati anche da persone con altra formazione. Potemmo così contare con la partecipazione di rappresentati del Popolo
africano Saharawi7 e di rappresentati dei Tribal People dell’India8, ad
esempio. In questa maniera il Festival continuò lungo la proposta di
moltiplicare gli incontri e gli scambi di sguardi, come emerge anche
dal titolo: Contro-Sguardi, Permanenze, Trasmutazioni, Incontri. La
moltiplicazione degli spazi espositivi e cinematografici, dai cinema
pubblici alle sale di associazioni culturali, dalle aule universitaria agli
spazi pubblici, generò così una proliferazione di momenti di incontro,
dialogo e mescolanza. Ciò ha consolidato la proposta di enfatizzare
l’evento del Festival come un momento di riflessione e dialogo sulla
varietà della contemporaneità, la polisemia dell’esperienza visuale,
Questa collaborazione ha permesso al Festival di ottenere l’appoggio e un patrocinio della Ambasciata del Brasile in Italia. Oltre a ciò, la collaborazione prevedeva che i film vincitori di ogni Festival fossero successivamente presentati nell’altro
Festival, in maniera tale da creare un dialogo tra i due eventi ma anche di aprire la
possibilità di visionare i film in più contesti.
7
Il Popolo Saharawi è una popolazione che abita nella regione del Sahara Occidentale e che da anni lotta per il riconoscimento della propria indipendenza dal
Marocco.
8
“Tribal Peoples” è il termine generico utilizzato ufficialmente per riferirsi alle
comunità tradizionali del subcontinente indiano.
6
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
35
il panorama delle situazioni sperimentate dalle persone in diversi
contesti e momenti.
Le possibilità di un progressivo aumento dei partecipanti e di
un approfondimento dei reciproci scambi incentivarono vari nuovi
collaboratori a partecipare all’organizzazione dell’evento, ampliando
le linee di interesse nella direzione delle sperimentazioni visuali come
la video-arte, che entrarono nelle proposte delle edizioni successive.
In questo modo, nell’edizione dal 19 al 29 novembre del 2010, così,
il Festival ha guadagnato ulteriori momenti di dialogo e riflessione,
con una apertura più sistematica dell’antropologia verso la cosiddetta
“società civile” e le altre forme di espressione estetica e visuale, con
un evento dedicato specialmente a questi altri sguardi. Si è mantenuta, però, allo stesso tempo, l’enfasi sui film etnografici come forma
specifica di dirigere lo sguardo cinematografico. Il programma, incentrato su Contro-Sguardi, Tagli, Strappi, Cuciture, ha previsto circa
quaranta film, oltre ad esposizioni fotografiche ed eventi musicali.
Ma altre novità sono entrate nel Festival. Sono state aperte ulteriori
collaborazioni internazionali: con il Laboratório de Imagem e Som
em Antropologia della Universidade de São Paulo (LISA-USP), con il
Sensory Ethnography Lab della Harvard University, con il Laboratorio
di Antropologia Visuale della Università di Mosca; oltre a collaborazioni con altre istituzioni italiane. Oltre a ciò, un’altra importante
novità fu la formalizzazione della prima edizione del Festival in formato di concorso, con la formazione di una giuria internazionale e
l’assegnazione di tre premi ai migliori film presentati. In questo evento,
dando continuità alla proposta iniziale del Festival, fu fatta la scelta
di dividere le categorie premiabili tra film di autori già consacrati e
nuovi registi, e anche tra film di grande budget e di piccolo budget,
in maniera tale da incentivare i giovani registi a partecipare al Festival.
Questa impostazione è continuata anche nella quarta edizione
del Festival, dedicata al tema: Contro-Sguardi, Multimedia, Lavoro,
Cultura, realizzata tra i giorni 22 e 24 di giugno del 2012. Per la
prima volta, in questa opportunità, si è deciso di proiettare i film in
maniera “parallela” e di realizzare le discussioni solamente quando
36
Paride Bollettin
fosse presente il regista del film. In questa maniera è stato possibile
espandere l’offerta di film presentati, arrivando a quota 60 nei tre
giorni di programmazione. In questa edizione, come nelle precedenti,
si è continuato ad accompagnare gli eventi filmici con altre attività
complementari, come le esibizioni fotografiche, performance di videoarte e spettacoli musicali, oltre a poter contare con la partecipazione
di ospiti internazionali. La scelta di mostrare un numero maggiore
di film ha ampliato il panorama delle discussioni e delle riflessioni
nell’ambito del Festival, ma sempre mantenendo una postura dialogica che aprisse la riflessione nella direzione della società civile. Per
questo parteciparono personalità del mondo operaio, del sindacato
e delle istituzioni, che si concentrarono sul tema cardine del Festival:
il “lavoro”, inteso nelle sue più varie sfaccettature. Si trattò di un
momento denso e collaborativo nel quale si sviluppò un dialogo che
cercava di riflettere, a partire da uno sguardo specificatamente etnografico, presentato nel film della programmazione, sulle molteplici
forme di pensare l’agentività umana. In questa maniera si è cercato, con
successo, di dare continuità all’incontro tra produzione etnografica e
antropologica e i non specialisti, ampliando la portata delle riflessioni
accademiche verso un pubblico maggiore.
A partire da queste esperienze è facile riconoscere alcune caratteristiche marcanti della proposta di Contro-Sguardi. Una prima
è che la traiettoria del Festival evidenzia l’importanza di costruire
dialoghi a molteplici livelli: l’evento è sorto a partire dalla ricerca di
punti comuni tra “campi” diversi, il che sottolinea l’importanza del
contaminarsi nell’incontro con altri “altri”, tratto caratteristico della
pratica antropologica. Così, il film etnografico diviene strumento di
confronto e scambio tra ricercatori, generando nuove possibilità di
un primo livello di contro-sguardi, alla ricerca di incessanti nuove
suggestioni. Ma questa possibilità deriva da una peculiarità propria
di questa specifica maniera di osservare, la quale cerca un altro incontro: con il “nativo” catturato nella sua quotidianità. Ma questo
“nativo” già non è più un oggetto statico e soggiogato alla ricerca, ma
al contrario, come evidenziano i film presentati nei vari Festival, così
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
37
come l’evoluzione storica dell’antropologia visuale, o ancora i testi
riuniti in questa raccolta, un soggetto attivo e che deve essere preso
sul serio nella sua capacità di appropriazione e re-significazione dello
stesso strumento audio-visuale. Troviamo così produzioni filmiche
che presentano uno sguardo esterno sull’esotico, altre che cercano
una produzione condivisa, e altre ancora che invertono lo sguardo.
Contro-Sguardi ha cercato di evidenziare queste tre modalità di incontro visuale, ripercorrendo in un continuo movimento di andata e
ritorno, costruito attorno a specifici assi tematici, le molteplici forme
di utilizzare il video.
Questa differenti forme, a loro volta, permettono, oltre a far dialogare campi etnografici differenti, di attraversare la linea temporale,
mettendo idee e metodologie differenti una di fronte all’altra, una
sopra all’altra, in un contro-sguardo che permette di osservare un film
con lo sguardo di un altro. Come già deve essere chiaro, il film non è
una semplice riproduzione di immagini neutre, ma veicola specifiche
dinamiche di produzione (più o meno condivisa e dialogica) di verità
differenti. Cosi, le possibilità di contrapporre film, contemporanei o di
epoche diverse, prodotti da etnografi o cineasti esotici, di lunga o corta
durata, apre molteplici nuovi sguardi. In controluce, o nel controsguardo, di un film, il suo altro filmico acquisisce nuovi significati,
nuove dimensioni semantiche prima occulte o di difficile percezione.
Vediamo così che il Festival, e questa era una delle finalità esplicite
di Contro-Sguardi, ci offre uno spazio e un momento per rivedere
produzioni “classiche” dell’etnografia in una nuova luce, e allo stesso
tempo di contaminare le produzioni più recenti, di giovani e molto
spesso talentuosi cineasti, con nuove idee, oriunde di altri film, di
altre traiettorie etnografiche, di altre preoccupazioni epistemologiche.
Ma questo non esaurisce le possibilità. Abbiamo un ulteriore livello
di incontro, o di sguardo reciproco, che Contro-Sguardi ha cercato
lungo il suo percorso. A partire dalla constatazione che molto spesso
la discussione antropologica ha difficoltà a raggiungere il grande
pubblico, per varie ragioni che non discutiamo qui, gli organizzatori
hanno sempre sentito l’urgenza di aprire il Festival ad un pubblico
38
Paride Bollettin
di non specialisti, un pubblico che a sua volta potesse aggiungere e
arricchire l’evento con altri sguardi alternativi e specifici. Nel corso
del Festival, quindi, si è sempre cercato di organizzare proiezioni in
luoghi pubblici, aprendo un dialogo tra le aule universitarie e gli spazi
utilizzati anche dai non accademici. Allo stesso modo, discutere i film
in maniera congiunta tra “specialisti” ufficiali e “specialisti” profani
è stata una maniera di dislocare lo sguardo reciproco verso nuovi
scontro-sguardi. Il dialogo tra un operaio e uno studioso del lavoro, o
tra un rappresentante del Popolo Saharawi e uno studioso dei popoli
africani, o tra un etnomusicologo e un musicista, costituisce così non
solo una maniera di rivedere vetuste distinzioni nella produzione di
conoscenza, ma anche un arricchimento collettivo e condiviso che
cerca un maggiore coinvolgimento nella reciproca conoscenza.
Tutti questi aspetti, la ricerca di dialoghi tra vecchie e nuove forme
di produrre antropologia visuale, la volontà di contaminare i diversi
campi di ricerca in un movimento di reciproca approssimazione, la
marcata orizzontalità nel mutuo incontro, hanno fatto di ControSguardi un momento speciale e specifico nel panorama dei Festival
di antropologia visuale. Il Festival, così, ha acquisito una propria
personalità come momento di incontro tra differenti proposte, includendo anche le forme espressive apparentemente avulse ai materiali
audiovisuali di fattura etnografica, come la video-arte, o performances
artistiche e musicali, e così via.
Non è dato di sapere la direzione che il Festival prenderà in futuro,
perché esso stesso si propone come un evento in costante evoluzione e
ridefinizione nell’incontro di altri sguardi. Per questa ragione, l’evento
realizzato a São Paulo, questa retrospettiva delle edizioni anteriori
del Festival a Perugia (Italia) si muove proprio nel sentiero tracciato
fino ad oggi. Avremo qui la possibilità di assistere ad una selezione
dei film che sono passati al Festival di Contro-Sguardi, permettendo
ad nuovo sguardo di avvicinarsi a queste opere. Un nuovo sguardo
che potrà incontrare lo sguardo proprio del Festival, attraverso un
processo di selezione di opere che ha cercato ci connettere produzioni
della scuola di antropologia visuale italiana con produzioni selezionate
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
39
dal panorama internazionale, che saranno presentate in Brasile, un
incontro a tre, una moltiplicazione di sguardi reciproci che necessariamente costituirà un importante momento dialogico. Dialoghi che,
se da sempre hanno offerto all’antropologia la possibilità di estendere
il proprio sguardo al di là delle frontiere di “casa”, oggi ci permettono
di interrogarci sulle varie moltiplicazioni di sguardi e case, e che il
video etnografico permette di rendere esplicite in maniera esemplare.
Il video come strumento principe di questi incontri di sguardi, così.
Ma non solo, perché questo dialoga in maniera intensa con i testi qui
stampati, che già nella scelta di essere pubblicati allo stesso tempo in
portoghese e in italiano evidenziano la principale finalità di questo
evento: aprire connessioni, dialoghi e contaminazioni, nel migliore stile
di Contro-Sguardi. Abbiamo scelto così di includere alcuni contributi
italiani e brasiliani sul tema dell’antropologia visuale, in maniera di
suggerire, ma senza esaurire, i possibili percorsi da percorrere in
maniera unitaria e dialogica tra i due lati dell’Oceano Atlantico. I
testi che seguono quindi vogliono essere tanto una panoramica di
sguardi sugli sguardi dell’antropologia visuale, quanto avvicinamenti
e incontri (a volte disincontri) che possono aprire ulteriori dialoghi.
Cosí, i testi di Sylvia Caiuby Novaes e Rose Satiko Gitirana Hikiji
presentano in maniera molto densa e puntuale le riflessioni proposte
al LISA, mettendole in relazione allo stesso tempo con quelle sviluppate da Contro-Sguardi, mettendo in luce le possibilità di reciproche
comprensioni. Per altro lato, il lavoro di Rentao Athias, Direttore del
Festival do Filme Etnográfico do Recife, si sofferma sulla relazione
tra i Festival ed il loro pubblico, altro tema centrale nella traiettoria
di Contro-Sguardi. A sua volta, Allison Jablonko si interroga sull’evoluzione degli incontri di sguardi veicolati dall’antropologia visuale,
mostrando come Contro-Sguardi costituisca un interessante opportunità di ripensare le interazioni nel video etnografico. In seguito Tullio
Seppilli ricorda l’importanza delle influenze dell’antropologia visuale
italiana nello sviluppo della scuola italiana del documentario nel post
guerra. Infine, Andrea Ravenda e Fabrizio Loce Mandes presentano
due ricerche in corso, nelle quali l’immagine ed il visuale sorgono come
40
Paride Bollettin
primari nella comprensione della realtà etnografica. Si tratta, come
si può vedere, di un insieme eterogeneo di riflessioni che cercano di
presentare possibili percorsi da percorrere, tracciando familiarità e
distanziamenti tra le produzioni sviluppate nelle due tradizioni.
Ma se l’evento costituisce in sé questa significativa esperienza di
dislocamento, in molteplici piani di sguardi, incontri e dialoghi, esso
ha permesso anche di avvicinare entità e prospettive già nel processo di
organizzazione. Una collaborazione senza la quale, pragmaticamente,
non sarebbe stato possibile realizzare l’evento, ma che ha aperto un
fecondo incrociarsi di percorsi. Ringraziamo qui9 il Laboratório de
Imagem e Som em Antropologia della Universidade de São Paulo,
istituzione che ha promosso e incentivato la realizzazione dell’evento10;
tutta la squadra del Cinusp, che ha messo a disposizione spazi, sforzi e
validi suggerimenti nella concretizzazione della retrospettiva; l’Istituto
Italiano di Cultura a São Paulo, senza l’appoggio finanziari, istituzionale e logistico del quale questo incontro non sarebbe stato possibile,
il Centro de Estudos Ameríndios della Universidade de São Paulo, valido compagno nella produzione dell’esposizione fotografica “Tempo
e Espaço dos Mebengoré” che ci offre un contro-sguardo fotografico;
i tecnici che hanno realizzato i sottotitoli; le persone del Conjunto
Nacional e degli altri cinema; e tutti glia altri che hanno collaborato
Mi limiterò qui a citare le istituzioni, senza nominare personalmente gli innumerevoli collaboratori fondamentali nell’organizzazione di un evento come questo,
ma venga qui registrata l’immensa gratitudine verso tutti loro, nella speranza che i
dialoghi qui aperti possano continuare in futuro.
10
Vale la pena di evidenziare come questa realizzazione congiunta di una retrospettiva del Festival Contro-Sguardi da parte della Associazione Contro-Sguardi
e del LISA apra nuovi spazi nella direzione di promuovere la circolazione delle
opere di antropologia visuale, in un momento in cui si moltiplicano le cattedre della
disciplina, l’interesse da parte della comunità accademica e in parte del grande pubblico, oltre alla profusione di nuovi strumenti tecnici. La collaborazione tra le due
istituzioni, che si era concretizzata nella partecipazione della Direttrice del LISA,
Sylvia Caiuby Novaes, nella giuria del Festival nel 2012, o nelle presentazioni delle
produzioni del LISA nello stesso contesto, permette non solo la circolazione dei
lavori, ma reciproche contaminazioni e l’apertura di fecondi meticciati.
9
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
41
all’organizzazione dell’evento. La speranza è che questi momenti di
reciproci sguardi, incontri e dialoghi non si esauriscano nell’ambito
del Festival, ma, ed è ciò che è successo con Contro-Sgaurdi fino ad
oggi, e forse è questa la sua specificità, che contaminino chi partecipa
con un continuo processo di dislocamento attraverso l’incontro con
molteplici altri sguardi, con molteplici movimenti di continua apertura
di nuovi punti di vista, con innumerevoli contro-sguardi.
42
Paride Bollettin
Sylvia Caiuby Novaes
Filmes etnográficos e Antropologia*
Film etnografici e Antropologia**
Agradeço a Paride Bollettin o convite para a participação em 2012 no júri do Festival Contro-Sguardi, assim como por sua incansável atividade no sentido de aproximar os diálogos
entre a Itália e o Brasil. Agradeço ainda a Rose Hikiji, pelas sugestões e comentários a este
texto. Finalmente, à FAPESP, por financiar nossos projetos temáticos que ensejam discussões
como as apresentadas aqui. (Apoio FAPESP, Projeto temático 09/52880-9).
**
Ringrazio Paride Bollettin per l’invito a partecipare nel 2012 come giurata al Festival ControSguardi, così come la sua infaticabile attività nel senso di avvicinare i dialoghi tra Italia e Brasile. Ringrazio anche Rose Hikiji per i suggerimenti e commenti a questo testo. Infine, ringrazio la
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo per il finanziare i nostri progetti tematici che danno luogo a discussioni come quella che qui presento (Apoio FAPESP, Projeto temático
09/52880-9).
*
Filmes etnográficos e Antropologia
43
A possibilidade de termos uma seleção dos filmes que concorreram
aos vários Festivais do Contro-Sguardi exibida em São Paulo deve ser
festejada. Participei em 2012 do júri de um desses festivais e posso
dizer que, quanto mais intercâmbios conseguirmos com diferentes
associações que promovem o cinema documentário e o filme etnográfico, melhor. Melhor por que esse constitui um momento privilegiado
para intercâmbios e diálogos, o que nos permite trazer para primeiro
plano a importância destas novas linguagens para a Antropologia.
Dentre essas novas linguagens, certamente a que com maior vigor
se inseriu em nossa disciplina é o filme etnográfico. Caberia, então,
perguntar: quais os paralelos possíveis entre o filme etnográfico e a
teoria antropológica? Quais as aproximações e distâncias que historicamente ocorreram entre a teoria antropológica, a elaboração de
etnografias e a realização de filmes etnográficos?
Não precisamos retomar aqui paralelos já desenvolvidos em outros
estudos,1 e que mostram a enorme afinidade entre os trabalhos de
Malinowski e de Flaherty, que não apenas reconstituem o chamado
“presente etnográfico” como procuram captar o ponto de vista do
nativo em seus trabalhos, ou a aproximação entre a obra de Jean Rouch
àquela dos chamados antropólogos pós-modernos. É verdade que, ao
contrário da simultaneidade temporal dos trabalhos de Malinowski
e Flaherty, Jean Rouch antecede em duas décadas as colocações dos
pós-modernos, ao problematizar o papel do cineasta. Em seus filmes,
Rouch renega as convenções do cinema referentes ao papel do cineasta
1
Vide, por exemplo, Grimshaw 2001.
44
Sylvia Caiuby Novaes
enquanto um sujeito transmissor de verdades, criando o cinema verité
onde o que está em jogo é ainda a verdade, mas a verdade do cinema.
Ao propor a antropologia compartilhada, Jean Rouch assume a
condição do observador participante, cujo olhar e voz se misturam às
dos sujeitos filmados. A grande contribuição de Rouch ao filme etnográfico e à antropologia contemporânea encontra-se na abordagem da
forma de análise antropológica e sobre a relação que os antropólogos
travam com os sujeitos pesquisados. Ao tratar da relação entre sujeito
cognoscente e cognoscível, Rouch questiona em seus filmes a ilusão
do presente etnográfico, onde a presença do antropólogo é obliterada, antecipando temas que, na década de 1980, serão abordados
pelos pós-modernos, com ênfase na questão da falência da noção
de representação. A participação do cineasta na narrativa do filme,
preconizada por Rouch, teve uma influência profunda nos filmes de
François Truffaut e Jean-Luc Godard.2
Continuando, em rápidas pinceladas, esta relação entre as teorias
antropológicas e o filme etnográfico, busca-se mais recentemente a
possibilidade de levar para o filme as grandes questões de uma antropologia mais contemporânea. Como perceber e introduzir, nos filmes
realizados, a noção de experiência, tal como vem sendo discutida por
autores como Benjamim, Turner, Favret-Saada, Goldman e que, de
certo modo, aparecem nos filmes de MacDougall, como Tempus de
Baristas. Ou ainda a noção de agência, tal como proposta por Gell,
e que pode ser observada em El Terremoto y el Señor e Cruces Vivas,
Cruces Protectoras, ambos de Aristóteles Barcellos Neto. Nestes dois
filmes, realizados por Aristóteles no povoado de Huaraz, no Peru
andino, tanto o Señor de la Soledad quanto as Cruzeds, cuidadosamente trançadas e benzidas anualmente, são a garantia de boas
colheitas e fartura por todo o ano. Ou ainda as noções de produção,
autoria e construção do texto etnográfico, tal como pensadas pelos
pós-modernos e que norteiam os filmes de Trinh Minh-Ha. Como
Para um maior aprofundamento na obra de Rouch, vide os trabalhos de Sztutman (2004; 2005); Gonçalves (2008) e Henley (2009).
2
Filmes etnográficos e Antropologia
45
sair da suposição do filme como representação, ao mesmo tempo
exterior e essencializada, para passar a pensá-lo como experiência de
uma relação que é, ao mesmo tempo, sensível e corpórea, que envolve
o diálogo e o encontro entre o pesquisador e os sujeitos filmados, tal
como propõe MacDougall (2006).
Mais recentemente, o desenvolvimento estético do documentário
influenciou profundamente os moldes do filme etnográfico. Se, por um
lado, os cineastas contribuem para o questionamento da objetividade
e do realismo do registro fílmico – e deste aspecto a Antropologia
dificilmente conseguirá se desvencilhar –, por outro lado, os antropólogos contribuem para o questionamento da forma de apreensão
e interpretação da realidade filmada. O ficcional e o documental
interpenetram-se, ficção e realidade confundem-se, reconstrução,
representação e interpretação são mescladas. Etnoficção e biografias
são novos gêneros apropriados pela disciplina e pela própria antropologia visual, como se pode ver nos filmes dos antropólogos Johannes
Sjöberg, que realizou Transfiction, sobre travestis que interpretam um
filme ficcional sobre eles mesmos, e Segredos da Mata, de Dominique
Gallois, em que os Waiampi encenam alguns mitos. O modo como
o já saudoso Eduardo Coutinho incorporou estas questões e a própria pesquisa antropológica a seus documentários é evidente. Como
afirmou Amir Labaki, a obra de Eduardo Coutinho é um cinema do
encontro e da escuta, dos gestos e da palavra. A influência marcante
deste documentarista, nos filmes da antropóloga Maira Bühler – Elevado 3,5 e Exterior, é também muito clara.
A história recente da Antropologia mostra que a observação não
pode ser feita unicamente de acordo com o olhar do sujeito cognoscente. A observação etnográfica está centrada em um olhar compartilhado, resultante da interação e do confronto entre universos culturais
distintos, como mostram os filmes A Arte e a Rua e Lá do Leste, assim
como as reflexões a respeito da experiência deste compartilhamento
por Rose Satiko Hikiji.3 É este aspecto de subjetividades em interação
3
Vide Hikiji (2013; 2012; 2010).
46
Sylvia Caiuby Novaes
que o filme etnográfico irá enfatizar, distanciando-se substancialmente
do filme documentário clássico.
O exame da relação entre o filme etnográfico e a teoria antropológica permite não apenas perceber que a relação entre cinema e antropologia acompanha toda a história da Antropologia, mas igualmente
nos permite entender os caminhos possíveis da realização de filmes e
o desenvolvimento da antropologia visual. Isso nos leva a uma questão
subjacente, que é a análise das possibilidades de incorporação de novas
linguagens – aqui penso fundamentalmente no audiovisual – na difusão
do conhecimento antropológico. A Antropologia passa hoje por uma
profunda revisão dos conceitos com que até então vinha trabalhando.
O próprio texto etnográfico é repensado, e a possibilidade de uso das
novas linguagens para expressar o conhecimento antropológico é uma
pauta presente na disciplina, que começa a ser reconhecida inclusive
por agências de fomento. Em várias das pesquisas que realizamos nos
últimos anos na USP, o audiovisual surge como um recurso metodológico e também como um meio de expressão de conhecimento, com
suas particularidades.
As possibilidades de inovação, seja em termos de pesquisa de
métodos de conhecimento ou em termos de divulgação de resultados, implicam investir num melhor domínio do uso da linguagem
audiovisual, o que pode ser uma novidade para muitos dos cientistas
sociais, ainda confinados ao universo da palavra. Pesquisadores que
vêm se dedicando ao uso de novas linguagens na Antropologia devem
incorporar esta reflexão e este domínio à realização de seus filmes
etnográficos.
Como nas Ciências Sociais e mesmo na Antropologia o universo
das palavras é hegemônico, procuramos no Departamento de Antropologia da USP vincular a antropologia visual à área da Antropologia
das Formas Expressivas, que engloba estudos de cinema, fotografia,
literatura e teatro, e pretende atentar para estas formas de expressão
inseridas em contextos culturais específicos. A realização de filmes
etnográficos implica o uso de uma linguagem em que é importante
levar em conta as relações entre estruturas expressivas e estruturas
Filmes etnográficos e Antropologia
47
sociais, assim como analisar as diferentes formas de oralidade e de
manifestações corporais, enquanto expressões simbólicas e de comunicação, que podem ter um enorme rendimento em filmes, mais até
do que em textos.
Uma das experiências mais ricas na formação de um antropólogo
é a sua imersão numa pesquisa de campo. Neste sentido, como fazer
para levar a nossos filmes a experiência etnográfica que temos em
campo, com todas as descobertas que essa experiência traz?
Uma experiência recente com alunos do curso de graduação em
Ciências Sociais mostrou-me que a fotografia pode ser um excelente
recurso para introduzir uma metodologia de pesquisa baseada na
observação e no estabelecimento de uma boa relação com os fotografados. O olhar desnaturalizado e curioso, a correta relação entre
proximidade e distância do que se fotografa, o bom recorte, são características da fotografia que devem igualmente estar presentes na
pesquisa de campo. Se na fotografia a menor abertura corresponde
a uma maior profundidade de campo, essa pode ser também uma
boa metáfora para pensar a pesquisa antropológica.4 O domínio da
fotografia, que pode ter como resultado imagens eloquentes, mas
sempre mudas, talvez seja um passo importante para a boa elaboração
de filmes etnográficos, em que o discurso verbal não roube a cena.
Bons antropólogos sabem também que dificilmente uma boa pesquisa
poderá se basear exclusivamente em entrevistas estruturadas.
Este é nosso grande desafio e festivais como esses, promovidos
pelo Contro-Sguardi, podem ser bons para pensar mais a fundo nestas novas possibilidades abertas pelo campo da imagem na disciplina
antropológica.
Sobre a relação entre fotografia e pesquisa de campo, vide Caiuby Novaes, no
prelo.
4
48
Sylvia Caiuby Novaes
Film etnografici e Antropologia
49
La possibilità di avere una selezione dei film che hanno concorso
alle varie edizioni del Festival Contro-Sguardi in mostra a São Paulo
deve essere festeggiata. Ho partecipato nel 2012 come parte della
giuria di uno di questi Festival e posso dire che quanti più scambi
riusciamo ad avere con diverse associazioni che promuovono il cinema
documentario e il film etnografico, tanto meglio. Meglio perché ciò
costituisce un momento privilegiato di scambio e dialogo e perché
ci permette di portare in primo piano l’importanza di questi nuovi
linguaggi per l’antropologia.
Tra questi nuovi linguaggi, certamente, quello che con più vigore
si è inserito nella nostra disciplina è il film etnografico. Dovremmo,
allora, domandarci: quali sono i possibili paralleli tra il film etnografico
e la teoria antropologica? Quali i possibili avvicinamenti e distanziamenti che storicamente si sono avuti tra la teoria antropologica,
l’elaborazione di etnografie e la realizzazione di film etnografici?
Non c’è bisogno qui di riprendere paralleli già tracciati in altri
lavori1 e che mostrano l’enorme affinità tra i lavori di Malinowski
e di Flaherty, che non solo ricostituiscono il cosiddetto “presente
etnografico” come anche cercano di cogliere il punto di vista del
nativo nei loro lavori. O l’accostamento tra l’opera di Jean Rouch a
quella dei cosiddetti antropologi post moderni. È vero che al contrario
della simultaneità temporale tra i lavori di Malinowski e Flaherty,
Jean Rouch precede di due decenni le posizioni dei post moderni,
problematizzando il ruolo del cineasta. Nei suoi film, Rouch rinnega
1
Si veda, per esempio, Grimshaw (2001).
50
Sylvia Caiuby Novaes
le convenzioni del cinema sul ruolo del cineasta come trasmittente di
verità, creando il cinema verité dove ciò che viene messo in gioco è
ancora la verità, ma la verità del cinema.
Al proporre una antropologia condivisa, Jean Rouch assume la
condizione di osservatore partecipante, il cui sguardo e la cui voce
si mescolano a quelli dei soggetti filmati. Il grande contributo di
Rouch al film etnografico e all’antropologia contemporanea s’incontra nell’approccio alla forma dell’analisi etnografica e alla relazione
che gli antropologi instaurano con i soggetti indagati. Affrontando la
relazione tra un soggetto conoscente e uno conoscibile, Rouch mette
in discussione nei suoi film l’illusione del presente etnografico in cui
la presenza dell’antropologo viene obliterata, tema che precede ciò
che, negli anni Ottanta, sarà affrontato dai post moderni, che enfatizzeranno la questione della fallacità della nozione di rappresentazione.
La partecipazione del cineasta alla narrazione del film, preconizzata
da Rouch, ebbe una profonda influenza nei film di François Truffaut
e Jean-Luc Godard2.
Continuando per rapidi cenni, più recentemente questa relazione
tra teorie antropologiche e film etnografico ha provato a portare il film
alle questioni antropologiche più contemporanee. Come realizzare ed
introdurre nei film prodotti la nozione di esperienza, così come viene
discussa da autori come Benjamim, Turner, Favret-Saada, Goldman,
e che in un certo modo appare nei film di MacDougall, come in
Tempus de Baristas? O ancora la nozione di agentività, proposta da
Gell e che può essere osservata in El Terremoto y el Señor e Cruces
Vivas, Cruces Protectoras, entrambi di Aristóteles Barcelos Neto? In
questi due film, realizzati da Aristóteles nella cittadina di Huaraz,
nelle Ande peruviane, sia il Señor de la Soledad, quanto le Cruzes
attentamente intrecciate e benedette annualmente, sono garanzia di
buoni raccolti e abbondanza per tutto l’anno. O ancora le nozioni di
produzione, autorialità e costruzione del testo etnografico, come sono
Per un maggiore approfondimento dell’opera di Rouch si vedano i lavori di
Sztutman (2004 e 2005); Gonçalves (2008) e Henley (2009).
2
Film etnografici e Antropologia
51
state pensate dai post moderni e che guidano i film di Trinh Minh-Ha.
Come sfuggire dalla supposizione del film come rappresentazione,
allo stesso tempo esterna e essenzializzata, per cominciare a pensarlo
come esperienza di una relazione che è, allo stesso tempo, sensibile
e corporea, che coinvolge il dialogo e l’incontro tra il ricercatore ed i
soggetti filmati come la propone MacDougall (2006)?
Più recentemente lo sviluppo estetico del documentario ha influenzato profondamente le forme del film etnografico. Se, da un lato, i
cineasti contribuiscono alla messa in discussione dell’oggettività e del
realismo della registrazione filmica – aspetto questo che difficilmente
l’antropologia riuscirà a districare –, per altro lato gli antropologi
concorrono a rivedere la forma di prendere e interpretare la realtà
filmata. Il fittizio e il documentale si interpenetrano, finzione e realtà
si confondono, ricostruzione, rappresentazione e interpretazione si
mescolano. L’etnofiction e le biografie sono i nuovi generi appropriati
dalla disciplina e dalla stessa antropologia visuale, come si può vedere
nei film degli antropologi Johannes Sjöberg, che ha realizzato Transfiction, sui travestiti che interpretano un film di finzione su se stessi
e Segredos da Mata, di Dominique Tilkin Gallois, in cui i Waiampi
inscenano alcuni miti. La maniera in cui Eduardo Coutinho, di cui
già si sente la nostalgia, ha incorporato queste questioni e la stessa
ricerca antropologica, nei suoi documentari è evidente. Come ha
affermato Amir Labaki, l’opera di Coutinho è un cinema di incontro
e di ascolto, dei gesti e della parola. La marcante influenza di questo
documentarista sui film dell’antropologa Maira Bühler – Elevado 3,5
e Exterior – è anch’essa molto chiara.
La storia recente dell’Antropologia mostra che l’osservazione non
può essere realizzata unicamente secondo lo sguardo del soggetto
conoscente. L’osservazione etnografica è centrata su di uno sguardo
condiviso, risultante dall’interazione e dal confronto tra universi culturali distinti, come mostrano i film A Arte e a Rua e Lá do Leste, tanto
quanto le riflessioni a riguardo dell’esperienza di questa condivisione
52
Sylvia Caiuby Novaes
da parte di Rose Satiko Hikiji3. È quest’aspetto delle soggettività in
interazione che il film etnografico andrà a enfatizzare, distanziandosi
sostanzialmente dal film documentario classico.
L’esame della relazione tra il film etnografico e la teoria antropologica permette non solo di percepire che la relazione tra cinema e
antropologia accompagna tutta la storia dell’Antropologia, ma allo
stesso modo ci permette di comprendere i possibili percorsi per la
realizzazione di film e lo sviluppo dell’antropologia visuale. Ciò ci
porta ad una questione soggiacente, che è l’analisi delle possibilità
di incorporazione di nuovi linguaggi – penso qui fondamentalmente
all’audiovisuale – nella diffusione della conoscenza antropologica.
L’antropologia attraversa oggi una profonda revisione dei concetti
sui quali fino ad oggi aveva lavorato. Lo stesso testo etnografico è
ripensato e la possibilità di utilizzo di nuovi linguaggi per esprimere
la conoscenza antropologica è un tema presente nella disciplina, che
comincia a essere riconosciuto anche dalle agenzie di finanziamento.
In molte delle ricerche che abbiamo realizzato negli ultimi anni alla
Universidade de São Paulo, l’audiovisuale sorge come una risorsa
metodologica e anche come mezzo di espressione di conoscenza con
le sue peculiarità.
Le possibilità di innovazione, sia in termini di ricerca di metodi di
conoscenza, sia in termini di divulgazione di risultati, implica un investimento in un miglior dominio dell’uso del linguaggio audiovisuale, il
che può essere una novità per molti scienziati sociali, ancora confinati
nell’universo della parola. Ricercatori che si dedicano all’uso di nuovi
linguaggi nell’Antropologia devono incorporare questa riflessione e
questo dominio nella realizzazione dei loro film etnografici.
Dato che nelle Scienze Sociali e anche in Antropologia l’universo
delle parole è egemonico, al Departamento de Antropologia della
Universidade de São Paulo cerchiamo di vincolare l’antropologia visuale all’area dell’Antropologia delle Forme Espressive, che include gli
studi del cinema, fotografia, letteratura e teatro e pretende di osservare
3
Si vedano Hikiji (2010, 2012 e 2013).
Film etnografici e Antropologia
53
queste forme di espressione inserite in specifici contesti culturali. La
realizzazione di film etnografici implica l’utilizzo di un linguaggio in
cui è importante tenere a mente le relazioni tra strutture espressive e
strutture sociali, cosi come analizzare le differenti forme dell’oralità
e delle manifestazioni corporee in quanto espressioni simboliche e di
comunicazione, che possono avere un enorme rendimento nei film,
anche maggiore che nei testi.
Una delle esperienze più ricche nella formazione di un antropologo è la sua immersione in una ricerca sul campo. In questo senso,
come fare per portare nei nostri film la nostra esperienza etnografica
che proviamo sul campo, con tutte le scoperte che questa esperienza
porta con sé?
Una recente esperienza degli studenti del corso di laurea in Scienze
Sociali mi ha mostrato che la fotografia può essere un’eccellente risorsa
per introdurre una metodologia di ricerca basata sull’osservazione e
sullo stabilirsi di una buona relazione con i fotografati. Lo sguardo
snaturalizzato e curioso, la corretta relazione tra vicinanza e distanza
di ciò che si fotografa, la buona inquadratura, sono caratteristiche
della fotografia che devono ugualmente essere presenti nella ricerca
sul campo. Se nella fotografia una minore apertura corrisponde a una
maggiore profondità di campo, questa può essere anche una buona
metafora per pensare la ricerca antropologica4. Il dominio della fotografia, che può avere come risultato immagini eloquenti, ma sempre
mute, forse è un passo importante per la buona elaborazione di film
etnografici, nei quali il discorso verbale non rubi la scena. I buoni
antropologi sanno anche che difficilmente una buona ricerca può
basarsi esclusivamente in interviste strutturate.
Questa è la nostra grande sfida e Festival come questo promosso
da Contro-Sguardi possono essere buoni per pensare più in profondità a queste nuove possibilità aperte dal campo dell’immagine nella
disciplina antropologica.
Sulla relazione tra fotografia e ricerca sul campo, si veda Caiuby Novaes (in
stampa).
4
54
Sylvia Caiuby Novaes
Bibliografia
Caiuby Novaes, Sylvia. “O silêncio eloquente das imagens e sua importância
na etnografia”. Cadernos de Arte e Antropologia. (no prelo).
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Hikiji, Rose Satiko Gitirana e Caffé, Carolina. “Film as shared ethnography
- In the field, in the editing suite, on the air”. Vibrant (Florianópolis), v.
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Hikiji, Rose Satiko Gitirana. “Video, Music and Shared Anthropology”.
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MacDougall, David. The Corporeal Image – Film, Ethnography and the
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49-62, 2004.
Sztutman, Renato. “Imagens Perigosas: a possessão e a gênese do cinema
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115-124, 2005.
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dos Países de Língua Portuguesa, 2010.
Film etnografici e Antropologia
55
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Café, Carolina e Hikiji, Rose Satiko: A Arte e a Rua. 44’. Realização Lisa-Usp,
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Café, Carolina e Hikiji, Rose Satiko: Lá do Leste. 44’. Realização Lisa-Usp,
Instituto Polis e W.S. Produções, 2010.
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Rouch, Jean. Jaguar. Paris, Les Films de la Pleiade. Cor, 93 min.
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Rouch, Jean Les Maîtres Fous. Paris, Films de la Plêiade. Cor, 34 min. 19531954.
Sjöberg, Johannes. Transficção/Transfiction. Suécia/Inglaterra. 56’. 2007
56
Paride Bollettin
Rose Satiko Gitirana Hikiji
Caminhos, conversas, engenhos
e amores – experimentos em
um laboratório de imagens,
sons e antropologia*
Cammini, conversazioni, mulini e
amori – esperimenti in un laboratorio
di immagini, suoni e antropologia**
Este texto, que rememora algumas atividades do LISA nos últimos anos, é dedicado a
Miriam Moreira Leite, que nos deixou em fevereiro de 2013, depois de tanto ensinar sobre as
imagens, a memória e o amor. Agradeço aos colegas do GRAVI, do NAPEDRA, do PAM, aos
funcionários do LISA e em especial a Sylvia Caiuby Novaes, que tornou possível a história aqui
narrada.
**
Questo testo, che ricorda alcune attività del LISA negli ultimi anni, è dedicato a Miriam Moreira Leite, che ci ha lasciato nel febbraio del 2013, dopo aver tanto insegnato sulle immagini, la
memoria e l’amore. Ringrazio in particolare i colleghi del GRAVI, del NAPEDRA, del PAM, i funzionari del LISA e specialmente Sylvia Caiuby Novaes, che ha reso possibile la storia qui narrata.
*
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
57
A memória da fotografia é diferente da memória do texto escrito. A sua
memória é feita através da convocação de outras imagens parecidas.
Miriam Moreira Leite, em Caminhos da Memória
Com as palavras de Miriam inicio o percurso. São imagens que o
constituem. Imagens que convocam imagens. Memórias gravadas em
fitas, cartões. Memórias que ficam dessas gravações.
Caminhos, conversas, engenhos, amores. Palavras impressas nos
programas de 2010 e 2012 do Festival italiano de filme antropológico
Contro-Sguardi. Pedaços de títulos de filmes brasileiros, produzidos
por antropólogos que têm trabalhado junto ao Laboratório de Imagem
e Som em Antropologia da Universidade de São Paulo (LISA-USP).
Termos bons para pensar relações que estabelecemos com o mundo,
por meio do fazer da antropologia visual. Um jeito de começar a contar
as aproximações com o filme etnográfico, que temos experimentado
nos últimos anos, no LISA, e com parceiros de pesquisa no Brasil e
no exterior.
Amores
Na edição de 2012, o Contro-Sguardi exibe Amores de Circo, filme
de Ana Lúcia Ferraz, de 2009. Nele, acompanhamos a chegada de
uma companhia de Circo-Teatro a uma pacata cidade do interior de
São Paulo. O cotidiano da família circense, o encanto que provoca
58
Rose Satiko Gitirana Hikiji
nos moradores da cidade, as relações do pessoal do circo com a prefeitura e os temas do casamento e do adultério, abordados em uma
etnoficção, que parte de histórias vividas ou imaginadas pelos atores
e atrizes da companhia.
Ana Lúcia integra o Grupo de Antropologia Visual da USP (GRAVI-USP), desde o seu início, em 1993. Também participa do Núcleo de
Antropologia, Performance e Drama (NAPEDRA), criado em 2001.
Ambos os grupos reúnem-se no LISA, e suas histórias confundem-se
com a do próprio Laboratório, criado em 1991.
O GRAVI, coordenado por Sylvia Caiuby Novaes, começa suas
atividades, a partir de uma coincidência que une um grupo de alunos
de Sylvia: o amor ao cinema. Em 1995, após um pós-doutorado no
Granada Centre for Visual Anthropology, da Universidade de Manchester, na Inglaterra, Sylvia trazia para a USP a discussão, ainda
recente no Brasil, sobre a antropologia visual, o filme etnográfico e a
análise de imagens a partir das Ciências Sociais.
Nós, seus alunos, encantados com a possibilidade de pesquisar o
que amávamos (o cinema, as imagens), nos reuníamos no LISA para
assistir filmes, discuti-los, ler sobre imagens, experimentar a produção
de um “olhar antropológico sobre o cinema”.1
De 1993 para cá, os pesquisadores do GRAVI envolveram-se em
três grandes projetos temáticos, financiados pela Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), e pudemos, então,
aprofundar as questões relativas à análise de imagens, mas também
enfrentar outro grande desafio: a produção de imagens a partir da
pesquisa antropológica.
Por meios destes projetos e do apoio da USP, pudemos equipar o
LISA com ilhas de edição e instrumentos de gravação de imagens e
sons (desde as câmeras Hi-8 e minidv, nos anos de 1990, às câmera de
alta definição lançadas nos últimos anos), e também assistir e discutir
“Um Olhar Antropológico sobre o Cinema – Seminários em Antropologia Visual” é o título do primeiro seminário organizado pelo GRAVI/USP, em abril de
1997, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
1
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
59
filmes que vêm sendo produzidos em mais de um século de cinema,
parte deles disponíveis hoje no acervo do LISA, que possui mais de
1500 títulos de filmes, principalmente (mas não só) documentários.2
A história do Napedra, no LISA, é mais recente. Desde 2005, o
grupo, coordenado por John Cowart Dawsey, reúne-se no Laboratório,
e, nos últimos cinco anos, desenvolveu também um projeto temático
apoiado pela FAPESP. O núcleo é constituído por pesquisadores do
campo das artes, interessados no diálogo com a Antropologia, e por
antropólogos que buscam conhecimentos nos estudos da performance.
O audiovisual apresenta-se para o Napedra como um instrumento
de registro de performances, de experimentação e como obra performática. A performance dos sujeitos pesquisados e do próprio
pesquisador, no momento de produção do filme, é também tema de
nossas reflexões.3
Amores de circo, filme de Ana Lúcia, experimenta os pontos de
contato entre o visual e a performance, entre antropologia e cinema,
entre documentário e ficção. O jogo de papéis experimentado na
produção do filme etnográfico é analisado em uma pesquisa que
reflete sobre as dimensões patéticas da vida social: o drama vivido,
percebido e apresentado em sua tensão experimentada. Ana Lúcia
trabalha com a noção de “dramaturgia” da vida social, com atenção
particular ao conflito e à ação, em suas dimensões subjetivas, tais
como percebidas e concebidas pelos sujeitos pesquisados. Filia-se à
invenção rouchiana da etnoficção.4
Jean Rouch – e sua proposta de uma antropologia compartilhada
– é grande fonte de inspiração para os realizadores ligados ao LISA.
Para Rouch, o cinema seria o meio de compartilhar o conhecimento
O Lisa abriga ainda um acervo de cerca de 8000 imagens (entre fotos, cromos
e chapas de vidro), e 500 mídias com gravações sonoras (músicas, diálogos, narrações míticas), além de documentos de referência, como livros, teses e catálogos. Os
acervos sonoro e visual estão em fase final de digitalização, em projeto apoiado pela
Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP. Ver: http://www.lisa.usp.br
3
Ver Caffé; Hikiji (2013), por exemplo.
4
Ver Ferraz (2013).
2
60
Rose Satiko Gitirana Hikiji
com os sujeitos pesquisados, em todas as etapas da produção: seus
filmes tornam-se produção coletiva da qual participam ativamente
os atores-sujeitos, alguns dos quais se tornarão coautores.5 O antropólogo-cineasta francês, que desenvolveu extensa cinematografia,
principalmente na África, desde os anos de 1940 e até 2006, ano de sua
morte, esteve em São Paulo, em 1996, para o Festival Internacional do
Filme Etnográfico, realizado no CINUSP Paulo Emílio Salles Gomes.
Nesta ocasião, conversou conosco no LISA. Parte desta visita pode
ser vista em Jean Rouch, subvertendo fronteiras, finalizado em 2000,
e dirigido por Ana Lúcia Ferraz, Edgar Teodoro da Cunha, Paula
Morgado e Renato Sztutman, pesquisadores do GRAVI, reunidos
no LISA. O filme foi exibido na edição de 2010 do Contro-Sguardi.6
Conversas
O filme com Jean Rouch foi uma das primeiras produções do LISA,
sendo realizado entre 1996 e 2000. As conversas com pesquisadores
e cineastas tornaram-se parte de nossa rotina no LISA. Discutimos,
em nosso anfiteatro, não apenas os trabalhos realizados pelos pesquisadores ligados ao GRAVI, ao Napedra e mais recentemente ao PAM
– Pesquisas em Antropologia Musical, grupo que criei em 2011 – mas
também produções de realizadores que têm marcado de alguma forma
o cenário do filme etnográfico e do documentário brasileiro e mundial.
Algumas destas conversas ganham a forma de filmes. Pequenos
retratos do trabalho destes pesquisadores-cineastas que integram a
série que chamamos “Trajetórias”. Conversas com MacDougall, diri-
Desenvolvo tal reflexão em Hikiji, 2013. Sobre Rouch, ver também os textos de
Renato Sztutman, pesquisador do GRAVI e professor do Departamento de Antropologia da USP, em duas coletâneas organizadas pelo grupo: Escrituras da imagem
(São Paulo: Edusp, 2004) e Imagem-conhecimento (São Paulo: Papirus, 2009)
6
O filme recebeu o Prêmio Especial do Júri, no Concurso Pierre Verger 2001, e
Menção Honrosa no Projeto Nascente, promovido pela USP, no mesmo ano.
5
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
61
gido por Caio Pompéia e Lilian Sagio Cezar, filme de 2007, exibido
na edição de 2010 do Contro-Sguardi, integra esta série.
O GRAVI vinha discutindo, já há algum tempo, os trabalhos do
antropólogo e cineasta David MacDougall. Ele é um dos poucos realizadores que, além de extensa produção fílmica (desde 1967, realizou
mais de 20 filmes com Judith MacDougall, em Uganda, Austrália,
Itália, Índia, entre outros), escreveu também muitos artigos e livros que
tematizam o fazer audiovisual na antropologia. MacDougall ministrou
o minicurso “Documentário etnográfico: uma arte empírica” no LISA,
em maio de 2006, quando pudemos acompanhar seu percurso – que
é parte da história do filme etnográfico – por meio de seus filmes e
de todas as questões que extrai de suas experiências com a câmera
em campo. No documentário, somos levados a refletir sobre temas
como o uso da câmera na pesquisa de campo, o cinema observacional,
a relação com as pessoas filmadas.
As palavras iniciais de David MacDougall no filme revelam uma
forma muito especial de pensar o filme etnográfico: “para mim, fazer
filmes é parte da vida, é uma forma de me relacionar (engage) com o
mundo, com outras pessoas... e, é claro, um aprendizado, um processo,
não é apenas uma produção”.
MacDougall tematiza em alguns de seus textos o fazer fílmico
como o resultado de um encontro. Interessa-se pelos espaços entre
cineasta e sujeito: de imagens, linguagem, memória e sentimento.
Espaços carregados de ambiguidade, potentes lugares de criação de
consciência (MacDougall, 1998).
Esta perspectiva do filme como processo, aprendizado e encontro,
está presente em muitos dos trabalhos desenvolvidos no LISA.7 Filmes
que resultam de pesquisas de longa duração: doutorados, mestrados,
pós-doutorados, iniciações científicas. Em diferentes estágios da
carreira acadêmica, pesquisadores têm experimentado o audiovisual
O livro Imagem-conhecimento: antropologia, cinema e outros diálogos (Barbosa;
Cunha; Hikiji, 2009) traz, além de um artigo de MacDougall, diversas reflexões
inspiradas pelos trabalhos do autor. Ver também Cunha; Ferraz; Hikiji, 2007.
7
62
Rose Satiko Gitirana Hikiji
como uma ferramenta, no trabalho de campo, como um meio de
escrita etnográfica e uma forma de compartilhar o conhecimento em
todas as etapas de sua produção.
Caminhos
Caminhos da memória – Miriam Moreira Leite (2007) é outro filme
da série Trajetórias, exibido na edição de 2010 do Contro-Sguardi.8
Ana Lúcia Ferraz, Andréa Barbosa e Francirosy Ferreira percorrem,
de forma extremamente carinhosa, alguns dos itinerários de memórias
que Miriam – então nossa companheira de pesquisas no GRAVI –
traça com as fotos que guarda em caixas, com os contos escritos em
momentos diversos de sua trajetória, com as lembranças de uma vida
inteira. A própria Miriam é fotografada por Mariana Chama para o
documentário.
Traçar trajetórias com imagens e sons é um exercício que Miriam
havia experimentado no filme Maria Lacerda de Moura – Trajetória de
uma rebelde (2003), codirigido com Ana Lúcia Ferraz e que contou
com uma equipe formada por 10 pesquisadores e técnicos ligados
ao GRAVI e ao LISA, em um exercício bastante intenso de criação
colaborativa. O filme apresenta a professora mineira, que lutou pela
liberdade de pensamento, contra todas as formas de autoritarismo e
discutiu, em seus livros, a repressão feminina pela família e pela Igreja
e a guerra suicida realizada pelo Estado. É considerado pelas autoras
como um trabalho experimental de adaptação histórica, baseado em
documentação recolhida em extensa pesquisa de Miriam Moreira Leite
sobre a vida de Maria Lacerda, no período de 1918 a 1939.
Interessante pensar nos cruzamentos de caminhos. Miriam, que é
convidada por Sylvia Caiuby Novaes a integrar o GRAVI e a trazer
Integram também a série Trajetórias os filmes Catarina Alves Costa (de Nadja
Marin e Rose Satiko Hikiji, 2007) e Maybury-Lewis Trajetória de Vida No Brasil
Central (de Francisco Simões Paes, 2002).
8
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
63
seu acervo sobre os viajantes do século XIX para o LISA, em 1997,
já nos era familiar: seu livro Retratos de família (Edusp, 1993), sobre
a documentação fotográfica de imigrantes que vieram para o Brasil,
entre 1890 e 1930, fazia parte da bibliografia que estudávamos para
compreender a especificidade das imagens nas relações que estabelecemos com o mundo.
A trajetória de Miriam também se aproxima da de Maria Lacerda:
Miriam foi das primeiras intelectuais em São Paulo a se envolver na
luta pelos direitos das mulheres e a história de Maria Lacerda foi por
ela contada em livro, editado em 1984.
Miriam e as pesquisadoras que a retrataram no filme da série Trajetórias percorreram caminhos juntas, alguns físicos, como o Jardim
da Luz, em que a historiadora e amiga é filmada sob uma luz muito
bonita. Outros, epistemológicos e afetivos: o aprendizado da criação
coletiva, o carinho na transmissão de conhecimento, a leitura muito
atenta, a busca sem fim de novas referências. Alguns destes caminhos
pudemos, todos os pesquisadores do GRAVI, percorrer junto com
Miriam.9
Engenhos
Sigamos com a brincadeira, conduzindo-a a uma finalização.10 Em
2012, o Contro-Sguardi exibiu Os Engenhos de Chiquinho Carneiro,
filme de 2007, dirigido por Priscilla Ermel, pesquisadora que realizou
seu pós-doutorado junto ao GRAVI, produzindo diversos filmes que
Os textos de Sylvia Caiuby Novaes (2013) e Francirosy Ferreira (2013) publicados
quando do falecimento de Miriam apresentam a intensidade de nossa convivência.
10
Os caminhos para contar essa história seriam inúmeros, mas optei por ter como
eixo a abordagem de filmes exibidos no Contro-Sguardi, cujos títulos me animaram a pensar em relações criadas na experiência de 23 anos do Laboratório. Não
comento os meus próprios filmes, nem obras que considero fundamentais ao nosso
percurso. Todos os filmes aqui comentados e a maior parte da produção do LISA
podem ser assistidos na íntegra na internet. Ver: www.lisa.usp.br
9
64
Rose Satiko Gitirana Hikiji
abordam o universo das oralidades brasileiras, com ênfase na música,
cantada e tocada nos arquinhos dos índios Gavião, dançada e percutida pelos brincantes do boi, em São Luiz do Maranhão ou no Morro
do Querosene, em São Paulo, festejada pelos cirandeiros de Paraty,
no litoral do Rio de Janeiro.11
O filme Os Engenhos de Chiquinho Carneiro compõe a trilogia que
Priscilla intitulou A trama das águas, que se completa com O canto
das canoas e A história em versos. Águas dos mares de Paraty, do seu
Ditinho canoeiro e cirandeiro, de João Bento e os foliões do Divino e
de São Benedito. Águas que caem, escorrem e fazem girar o monjolo
Engenho D’Ouro de Seu Francisco Carneiro. Águas que cantam a seu
modo, e viram trilha sonora nos filmes desta pesquisadora e música,
tão engenhosamente lida com os sons.
Seu Francisco Carneiro nos é apresentado em seu habitat: a Paraty
da Serra da Bocaina, longe do mar, no meio do mato. Circula entre a
casa de farinha e o engenho de cana. O filme revela este espaço como
engenho de relações – familiares, amorosas, de amizade. “Engenho é a
pessoa que engenha trabalho e constrói... o amor”, diz Seu Chiquinho.
O trabalho faz música. As coisas cantam. As coisas são belas. Este é
um filme de coisas e pessoas, e suas relações amorosas.12
Como Ana Lúcia Ferraz, que aproxima teatro e cinema, Priscilla
faz uma antropologia musical, que também é visual e poética. A
música que surge em seus filmes é parte da vida social, a constitui, a
interpreta, torna audíveis as experiências.
Em Os Engenhos de Chiquinho Carneiro, há a música da água e
do monjolo, dos pássaros e do vento. Priscilla mostra a musicalidade
presente em tudo: no rio, no trabalho de ralar, de pilar. Os sons remetem a uma temporalidade lenta, ritmada e cíclica. Como o movimento
do próprio engenho, do velho trabalhando e caminhando, da criança
brincando com o velho.
Ver Fogo das Marés (2000), O Arco e a Lira (2002), Brilho da Noite (2004) e
Prazer com Sagrado (2005), todos disponíveis em http://www.lisa.usp.br
12
Com Alexandre Kishimoto, analiso esta trilogia em resenha (Hikiji; Kishimoto,
2008). Alguns trechos desta análise são reproduzidos aqui.
11
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
65
As imagens complementam a construção deste movimento. Neste,
como em outros filmes, Priscilla explora planos fechados, pouco usuais, recortes. O uso de muitas imagens em slow-motion nos introduz
numa espécie de tempo poético.
Esse engenho – no sentido de arte, capacidade inventiva – é talvez
a possibilidade que mais prezo, dentre as oferecidas pelo trabalho
junto ao LISA e nosso grupo de pesquisadores. Estamos sim num
laboratório, criado no seio da principal universidade da América
Latina. De 1991 para cá, podemos dizer que consolidamos um centro de produção antropológica de imagens e sons que é reconhecido
como uma referência no país e tem tido sua produção veiculada e
premiada também no exterior. Em reuniões frequentes (do GRAVI,
NAPEDRA e PAM), discutimos calorosamente a produção audiovisual, performática, musical e textual, com a preocupação em pensar
a relação entre as linguagens expressivas e a etnografia. Mas o rigor
não tolhe a criação. Trabalhos como o de Priscilla apontam para o
potencial do encontro da ciência com a arte.
Encontros como o que celebramos em festivais, encontros de
olhares, audições compartilhadas, espantos com performances com
que nós, etnógrafos, somos presenteados e, por vezes, temos a sorte
de guardar em fitas, cartões de memória, discos, pedaços de papel.
66
Rose Satiko Gitirana Hikiji
> Miriam, fotografia, afeto e memória. Foto de Mariana Chama
Caminhos, conversas, engenhos e amores – experimentos
> Miriam Moreirea Leita com as diretoras de Caminhos da Memória no Jardim da Luz
67
68
Paride Bollettin
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
69
La memoria della fotografia è diversa dalla memoria del testo scritto.
La sua memoria è fatta attraverso la convocazione di altre immagini simili
Miriam Moreira Leite, Caminhos da Memória
Con le parole di Miriam inizio il cammino. Sono immagini che
lo costituiscono. Immagini che richiamano altre immagini. Memorie
registrate in cassette, cartoline. Memorie di queste registrazioni che
restano.
Percorsi, conversazioni, mulini e amori. Parole impresse nei programmi del 2010 e del 2012 del Festival italiano di Film Antropologico
Contro-Sguardi. Frammenti di titoli di film brasiliani, prodotti da
antropologi che hanno lavorato presso il Laboratório de Imagem e
Som em Antropologia della Universidade de São Paulo (LISA-USP).
Termini buoni per pensare le relazioni che stabiliamo col mondo attraverso l’antropologia visuale. Un modo per cominciare a raccontare
gli avvicinamenti al film etnografico che abbiamo provato negli ultimi
anni al LISA e con i compagni di ricerca in Brasile e all’estero.
Amori
Nell’edizione del 2012, Contro-Sguardi esibisce Amores de Circo,
film di Ana Lúcia Ferraz, del 2009. In esso, raccontiamo l’arrivo di
una compagnia di Circo-Teatro in una pacata cittadina dell’interno
di São Paulo. La quotidianità della famiglia circense, l’incanto che
70
Rose Satiko Gitirana Hikiji
provoca negli abitanti della cittadina, le relazioni delle persone del
circo con il municipio e i temi del matrimonio e dell’adulterio vengono
affrontati in una etnofiction, che parte da storie vissute o immaginate
dagli attori e attrici della compagnia.
Ana Lúcia integra il Grupo de Antropologia Visual della USP
(GRAVI-USP) dal suo inizio, nel 1993. Partecipa anche del Núcleo de
Antropologia, Performance e Drama (NAPEDRA), creato nel 2001.
Entrambi i gruppi si riuniscono nel LISA e le loro storie si confondono
con quella del Laboratório stesso, creato nel 1991.
Il GRAVI, coordinato da Sylvia Caiuby Novaes, comincia le sue
attività a partire da una coincidenza che unisce un gruppo di studenti
di Sylvia: l’amore per il cinema. Nel 1995, dopo un post dottorato al
Granada Center for Visual Anthropology, della Manchester University,
in Inghilterra, Sylvia portava alla USP il dibattito allora ancora recente
in Brasile sull’antropologia visuale, il film etnografico, l’analisi delle
immagini a partire dalle Scienze Sociali.
Noi, suoi studenti, incantati con la possibilità di fare ricerca su
ciò che amavamo (il cinema, le immagini), ci riunivamo al LISA per
assistere alle proiezioni dei film, discuterli, leggere riguardo le immagini, sperimentare la produzione di uno “sguardo antropologico
sul cinema”1.
Dal 1993 ad oggi, i ricercatori del GRAVI sono stati coinvolti in
tre grandi progetti tematici, finanziati dalla Funadação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), e abbiamo potuto, così,
approfondire le questioni relative all’analisi delle immagini, ma anche
affrontare un’altra grande sfida: la produzione di immagini a partire
dalla ricerca antropologica.
Attraverso questi progetti e con l’appoggio della USP, abbiamo
potuto equipaggiare il LISA con sale di montaggio e strumenti di
registrazione di immagini e suoni (da telecamere Hi-8 e minidv, negli
“Uno Sguardo Antropologico sul Cinema – Seminario di Antropologia Visuale”
è il titolo del primo seminario organizzato dal GRAVI/USP, nell’aprile del 1987, alla
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas della USP.
1
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
71
anni Novanta, alle telecamere in alta definizione lanciate negli ultimi
anni), ed anche assistere e discutere film che venivano prodotti in più
di un secolo di cinema, parte dei quali oggi disponibili nell’archivio
del LISA, che possiede più di 1500 titoli di film, principalmente (ma
non solo) documentari2.
La storia del NAPEDRA nel LISA è più recente. Dal 2005 il gruppo, coordinato da John Cowart Dawsey, si riunisce nel Laboratório
e, negli ultimi cinque anni, ha sviluppato anche un progetto tematico
appoggiato dalla FAPESP. Il nucleo è costituito da ricercatori del campo delle arti interessati al dialogo con l’antropologia e da antropologi
che cercano conoscenze negli studi della performance. L’audiovisuale
si presenta al NAPEDRA come uno strumento di registrazione della
performance, di sperimentazione e come opera performativa. Anche
la performance dei soggetti ricercatori e dello stesso ricercatore nel
momento della produzione del film è un tema delle nostre riflessioni3.
Amores de Circo, il film di Ana Lúcia, sperimenta i punti di contatto tra il visuale e la performance, tra l’antropologia e il cinema, tra il
documentario e la fiction. Il gioco di ruoli sperimentato nella produzione del film etnografico è analizzato in una ricerca che riflette sulle
dimensioni patetiche della vita sociale: il dramma vissuto, percepito
e presentato nella sua tensione sperimentata. Ana Lúcia lavora con la
nozione di “drammaturgia” della vita sociale, con una speciale attenzione per il conflitto e l’azione, nelle sue dimensioni soggettive, così
come vengono percepite e concepite dal soggetti indagati. Si affilia
alla invenzione rouchiana della etnofiction4.
Jean Rouch – e la sua proposta di una antropologia condivisa – è
la grande fonte di ispirazione dei realizzatori legati al LISA. Secondo
Il LISA ospita anche un archivio di 8.000 immagini (tra foto, cromo e lastre di
vetro), e altro come registrazioni sonore (musiche, dialoghi, narrative mitiche), oltre
a documentazione di riferimento, come libri, tesi e cataloghi. Gli archivi sonoro e
visuale sono in fase di digitalizzazione, un progetto appoggiato dalla Pró-Reitoria de
Cultura e Extensão della USP. Si veda: http://www.lisa.usp.br
3
Si veda Hikiji (2013), ad esempio.
4
Si veda Ferraz (2013).
2
72
Rose Satiko Gitirana Hikiji
Rouch, il cinema sarebbe lo strumento di condivisione della conoscenza con i soggetti indagati, in tutte le fasi della sua produzione: i suoi
film sono divenuti produzione collettiva alla quale hanno partecipato
attivamente gli attori-soggetti, alcuni dei quali divenuti co-autori5.
L’antropologo-cineasta francese, che ha sviluppato una estesa cinematografia principalmente in Africa fin dagli anni Quaranta fino al
2006, anno della sua morte, visitò São Paulo nel 1996, per il Festival
Internacional do Filme Etnográfico, realizzato al Cinusp Paulo Emílio
Salles Gomes. In quella occasione, ha conversato con noi al LISA.
Parte di questa visita può essere vista in Jean Rouch, subvertendo
fronteiras, finalizzato nel 2000 e diretto da Ana Lúcia ferraz, Edgar
Teodoro da Cunha, Paula Morgado e Renato Sztutman, ricercatori
del GRAVI, riuniti al LISA. Il film è stato esibito nella edizione 2010
di Contro-Sguardi6.
Conversazioni
Il film con Jean Rouch è stato una delle prime produzioni del LISA,
realizzata tra il 1996 e il 2000. Le conversazioni con ricercatori e cineasti sono divenute parte della routine del LISA. Abbiamo discusso
nel nostro anfiteatro non solo i lavori realizzati dai ricercatori legati
al GRAVI, al NAPEDRA e più recentemente al PAM – Pesquisa em
Antropologia Musical, gruppo che ho creato nel 2011 – ma anche le
produzioni di realizzatori che hanno segnato in qualche modo lo scenario del film etnografico e del documentario brasiliano e mondiale.
Porto avanti tale riflessione in Hikiji (2013). Su Jean Rouch, si vedano anche i
testi di Renato Sztutman, ricercatore del GRAVI e Professor al Departamento de
Antropologia della USP, in due raccolte organizzate dal gruppo: Escrituras da Imagem (São Paulo: Edusp, 2004) e Imagem-conhecimento (São Paulo: Papirus, 2009).
6
Il film ha ricevuto il Premio Speciale della Giuria al Concurso Pierre Verger nel
2001 e la Menzione d’onore al Projeto Nascente, promosso dalla USP nello stesso
anno.
5
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
73
Alcune di queste conversazioni hanno ricevuto la forma di film.
Piccoli ritratti del lavoro di questi ricercatori-cineasti integrano la
serie che abbiamo chiamato “Traiettorie”. Conversas com MacDougall,
diretto da Caio Pompéia e Lilian Sagio Cezar, film del 2007 esibito
nella edizione del 2010 di Contro-Sguardi, fa parte di questa serie.
Il Gravi discuteva da qualche tempo i lavori dell’antropologo e
cineasta David MacDougall. Egli è uno dei pochi registi che, oltre ad
una vasta produzione filmica (dal 1967, ha realizzato più di 20 film
con Judith MacDougall, in Uganda, Australia, Italia, India, tra gli
altri), ha scritto anche molti articoli e libri che problematizzano il fare
audiovisuale in antropologia. MacDougall ha proferito il minicorso
“Documentario etnografico: un’arte empirica” al LISA, nel maggio
del 2006, quando abbiamo potuto incontrare il suo percorso – che è
parte della storia del film etnografico – per mezzo dei suoi film e di
tutte le questioni che estrae dalle sue esperienze con la telecamera in
campo. Nel documentario siamo portati a riflettere su temi come l’uso
della telecamera nella ricerca sul campo, il cinema di osservazione, la
relazione con le persone filmate.
Le parole iniziali di David MacDougall nel film rivelano una forma
molto speciale di pensare al film etnografico: “per me, fare film è parte
della vita, è una maniera di relazionarmi (engage) con il mondo, con
altre persone… e, è chiaro, un apprendistato, un processo, non solo
una produzione”.
MacDougall discute in alcuni dei suoi testi il fare filmico come il
risultato di un incontro. S’interessa agli spazi tra cineasta e soggetto:
immagini, linguaggi, memoria e sentimento. Spazi carichi di ambiguità,
potenti luoghi di creazione di conoscenza (MacDougall, 1998).
Questa prospettiva del film come processo, apprendistato e incontro è presente in molti dei lavori sviluppati al LISA7. Film che sono il
risultato di ricerche di lunga durata: dottorati, lauree specialistiche,
Il libro Imagem-conhecimento: antropologia, cinema e outros diálogos (Barbosa,
Cunha & Hikiji, 2009), contiene, oltre ad un articolo di MacDougall, diverse riflessioni ispirate dai lavori dell’autore. Si veda anche Cunha, Ferraz & Hikiji (2007).
7
74
Rose Satiko Gitirana Hikiji
post dottorati, iniziazioni scientifiche. In differenti momenti della
carriera accademica, ricercatori hanno sperimentato l’audiovisuale
come strumento nel lavoro di campo, come mezzo di scrittura etnografica, forma di condividere la conoscenza in tutte le tappe della sua
produzione.
Percorsi
Caminhos da memória – Miriam Moreira Leite (2007) è un altro film
della serie Traiettorie esibito nell’edizione 2010 di Contro-Sguardi8.
Ana Lúcia Ferraz, Andrea Barbosa e Francirosy Ferreira percorrono in
maniera estremamente amorevole alcuni degli itinerari della memoria
che Miriam – allora nostra compagna di ricerca al GRAVI – traccia con
le foto che custodisce in casse, con i racconti scritti in diversi momenti
del suo percorso, con i ricordi di una vita intera. La stessa Miriam è
fotografata da Mariana Chama per il documentario.
Tracciare traiettorie con immagini e suoni è un esercizio che Miriam
aveva sperimentato nel film Maria Lacerda de Moura – Trajetória de
uma rebelde (2003), codiretto con Ana Lúcia Ferraz e che ha contato
su una equipe di 10 ricercatori e tecnici legati al GRAVI ed al LISA,
in un esercizio di creazione collettiva molto intenso. Il film presenta
la professoressa di Minas Gerais, che ha lottato per la libertà di pensiero, contro tutte le forme di autoritarismo e ha discusso nei suoi
libri la repressione femminile da parte della famiglia e della chiesa e
la guerra suicida realizzata dallo Stato contro le donne. È considerato
dalle autrici un lavoro sperimentale di adattazione storica, basato su
una documentazione raccolta in una estesa ricerca di Miriam Moreira
Leite sulla vita di Maria Lacerda nel periodo tra il 1918 e il 1939.
Fanno parte della serie Trajetórias i film Catarina Alves Costa (di Nadja Marin
e Rose Satiko Hikiji, 2007) e Maybury-Lewis. Trajetória de vida no Brasil Central (di
Francisco Simões Paes, 2002).
8
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
75
Interessante pensare in incroci di percorsi. Miriam, che è stata
invitata da Sylvia Caiuby Novaes ad integrare il GRAVI e portare il
suo archivio sui viaggiatori del XIX Secolo al LISA nel 1998, ci era
già da anni familiare: il suo libro Retratos de Família (1993), sulla
documentazione fotografica degli immigranti che vennero in Brasile
tra il 1930 e il 1980, faceva parte della bibliografia che studiavamo
per comprendere la specificità delle immagini nelle relazioni che
stabiliamo col mondo.
La traiettoria di Miriam si avvicina anche a quella di Maria Lacerda:
Miriam è stata una delle prime intellettuali di São Paulo a compromettersi con la lotta per i diritti delle donne ed ha raccontato in un
libro, pubblicato nel 1984, la storia di Maria Lacerda.
Miriam e le ricercatrici che la tratteggiano nel film della serie
Traiettorie hanno seguito lungo percorsi condivisi, alcuni fisici, come
Jardim da Luz, in cui la storica e amica è filmata con una bellissima
luce. Altri, epistemologici e affettivi: l’apprendistato della creazione
collettiva, l’affetto nella trasmissione di conoscenza, la lettura molto
attenta, la ricerca senza fine di nuovi riferimenti. Noi ricercatori del
GRAVI, abbiamo potuto seguire alcuni percorsi assieme a Miriam9.
Mulini
Continuiamo con il gioco, portandolo ad una conclusione10. Nel
2012, Contro-Sguardi ha esibito Os Engenhos de Chiquinho Carneiro,
film del 2007 diretto da Priscilla Ermel, ricercatrice che ha realizzato
I testi di Sylvia Caiuby Novaes (2013) e Francirosy Ferreira (2013) pubblicati in
occasione della morte di Miriam presentano l’intensità di questa convivenza
10
I percorsi per raccontare una storia sarebbero innumerevoli, ma ho optato per
mantenere come bussola la prospettiva dei film esibiti a Contro-Sguardi, i cui titoli
mi hanno animato a pensare alle relazioni create in 23 anni di esperienza del Laboratorio. Non commento i miei propri film, ne altre opere che considero fondamentali
per il nostro percorso. Tutti i film qui commentati, e la maggior parte di quelli prodotti al LISA, possono essere visti integralmente in internet: http://www.lisa.usp.br
9
76
Rose Satiko Gitirana Hikiji
il suo post dottorato presso il GRAVI, producendo diversi film che
affrontano l’universo delle oralità brasiliane, enfatizzando la musica,
cantata e suonata negli archetti degli indigeni Gavião, danzata e
percossa dai giocatori del Boi a São Luiz do Maranhão o nel Morro
do Querosene a São Paulo, festeggiata dai cirandeiros di Paraty, nel
litorale di Rio de Janeiro11.
Il film Os Engenhos de Chiquinho Carneiro fa parte di una trilogia
che Priscilla ha intitolato A trama das águas, che è composta anche da
O canto das canoas e A história em versos. Le acque dei mari di Paraty,
del signor Ditinho canoista e ballerino, di João Bento e dei foliões do
Divino e di São Benedito. Acque che cadono, scorrono e fanno girare
il Mulino d’Oro di Francisco Carneiro. Acque che cantano, a modo
loro, e che divengono la colonna sonora dei film di questa ricercatrice
e musicista, che tanto orgogliosamente lavora con i suoni.
Francisco Carneiro viene presentato nel suo ambiente: a Paraty
della Serra da Bocaina, lontano dal mare, in mezzo alla foresta. Circola tra la casa della farina e il mulino della canna da zucchero. Il film
rivela questo spazio come mulino di relazioni – familiari, amorose, di
amicizia. “Il mulino [engenho] è la persona che mulinella [engenha]
lavoro e costruisce… l’amore”, dice Chiquinho. Il lavoro fa musica. Le
cose cantano. Le cose sono belle. Questo è un film di cose e persone,
e delle loro relazioni – amorose12.
Come Ana Lúcia Ferraz, che avvicina teatro e cinema, Priscilla fa
un’antropologia musicale, che è anche visuale e poetica. La musica che
sorge nei suoi film è parte della vita sociale, la costituisce, la interpreta,
rende ascoltabili le esperienze.
In Os Engenhos de Chiquinho Carneiro, c’è la musica dell’acqua
e del mulino, degli uccelli e del vento. Priscilla mostra la musicalità
presente in tutto, nel fiume, nel lavoro di grattugiare, di ammassare.
I suoni rimettono ad una temporalità lenta, ritmica e ciclica. Come il
Si veda: Fogo das Marés (2005), O Arco e a Lira ( 2002), Brilho de Noite (2004) e
Prazer com Sagrado (2005), tutti disponibili in http://www.lisa.usp.br
12
Con Alexandre Kishimoto analizzo questa trilogia in una recensione (Hikiji &
Kishimoto, 2008). Alcuni frammenti dell’analisi vengono riprodotti qui.
11
Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
77
movimento del mulino stesso, del vecchio che lavora e cammina, del
bambino che gioca col vecchio.
Le immagini completano la costruzione di questo movimento. In
questo, come in altri film, Priscilla esplora piani chiusi, poco frequenti,
ritagli. L’uso di molte immagini in slow motion ci introduce in una
specie di tempo poetico.
Questo ingegno – nel senso di arte, capacità inventiva – è forse
la possibilità che più apprezzo, tra quelle offerte dal lavoro presso il
LISA e nel nostro gruppo di ricercatori. Siamo sì in un laboratorio,
creato nel seno della principale università dell’America Latina. Dal
1991 a oggi, possiamo dire di aver consolidato un centro di produzione antropologica di immagini e suoni che è riconosciuto come un
riferimento in Brasile e ha avuto la sua produzione veicolata e premiata
anche all’estero. In frequenti riunioni (di GRAVI, NAPEDRA e PAM),
discutiamo calorosamente la produzione audiovisuale, performativa,
musicale e testuale, con la preoccupazione di pensare la relazione tra
i linguaggi espressivi e l’etnografia. Ma il rigore non toglie nulla alla
creazione. Lavori come quello di Priscilla indicano la direzione di un
potenziale incontro della scienza con l’arte.
Incontri come quelli che celebriamo nel Festival, incontri di
sguardi, ascolti condivisi, stupore di fronte alle performance che noi,
etnografi, riceviamo in dono e, a volte, abbiamo la fortuna di osservare
in nastri, schede di memoria, dischi, ritagli di carta.
78
Rose Satiko Gitirana Hikiji
Bibliografia
Barbosa, Andréa, Cunha, Edgar T. e Hikiji, Rose S. (orgs.). Imagem-Conhecimento. Antropologia, cinema e outros diálogos. Campinas: Papirus, 2009.
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Nome/ Fapesp, 2013.
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da ABA - Associação Brasileira de Antropologia, Brasília e Florianópolis,
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Dawsey, Hikiji, Monteiro, Muller (orgs.). Antropologia e Performance Ensaios Napedra. São Paulo: Terceiro Nome/ Fapesp, 2013.
Ferraz, Ana Lúcia. “Dramaturgia da vida social e a dimensão patética da
pesquisa antropológica”. In: Dawsey, Hikiji, Monteiro, Muller (orgs.).
Antropologia e Performance - Ensaios Napedra. São Paulo: Terceiro
Nome/ Fapesp, 2013.
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php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832008000200017&lng=en&nrm=iso]
Hikiji, Rose Satiko G. “Rouch Compartilhado: Premonições e Provocações
para uma Antropologia Contemporânea”. Iluminuras. v.14: 113-122,
2013. [http://seer.ufrgs.br/iluminuras/article/view/37743]
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Cammini, conversazioni, mulini e amori – esperimenti
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Campinas: Papirus, 2009: 229-254.
Sztutman, Renato. “Jean Rouch: um antropólogo-cineasta”. In Barbosa,
Cunha, Ferrari, Hikiji, Novaes e Sztutman (orgs.). Escrituras da Imagem.
São Paulo: Edusp/Fapesp: 49-62, 2004.
Filmografia citada (todos os filmes estão disponíveis para visualização em
http://www.lisa.usp.br/producao/videos.shtml)
Barbosa, Ferraz & Ferreira. Caminhos da memória – Miriam Moreira Leite
(Série Trajetórias). 34’. Realização LISA-USP, 2007.
Cezar, Lilian S. & Pompeia, Caio. Conversas com MacDougall (Série Trajetórias). 27’. Realização LISA-USP, 2007.
Cunha, Ferraz, Morgado & Sztutman. Jean Rouch – Subvertendo Fronteiras
(Série Trajetórias). 41’. Realização LISA-USP, 2000.
Ermel, Priscilla. A trama das águas (Trilogia com os filmes: Os Engenhos
de Chiquinho Carneiro; O canto das canoas e A história em versos). 78’.
Realização LISA-USP, 2007.
Ermel, Priscilla. Brilho da noite. 30’. Realização LISA-USP, 2004.
Ermel, Priscilla. Fogo das Marés. 16’. Realização LISA-USP, 2000.
Ermel, Priscilla. O Arco e a Lira. 18’. Realização LISA-USP, 2002.
Ermel, Priscilla. Prazer com sagrado. 12’. Realização LISA-USP, 2005.
Ferraz, Ana Lúcia. Amores de circo. 38’. Realização LISA-USP, 2009.
Hikiji, Rose & Marin, Nadja. Catarina Alves (Série Trajetórias). 27’. Realização LISA-USP, 2007.
Paes, Francisco. Maybury-Lewis Trajetória de Vida No Brasil Central (Série
Trajetórias). 24’. Realização LISA-USP, 2002.
80
Paride Bollettin
Renato Athias
Filme etnográfico – o exótico,
o diferente e o respeito ao outro
Il film etnografico – l’esotico,
il diverso e il rispetto per l’altro
Filme etnográfico – o exótico, o diferente e o respeito ao outro
81
O que nos interessa, neste texto, é explorar algumas questões relacionadas ao gênero de documentário, que costumamos denominar
de “filme etnográfico”. Essas reflexões, aqui colocadas, têm a ver
com o que chamamos de “estudos de recepção” (principalmente no
campo disciplinar da comunicação social), e estão baseadas na minha
experiência de organizador das últimas cinco edições do Festival Internacional do Filme Etnográfico do Recife, que se realiza anualmente
na cidade de Recife no Brasil.
Acredito ser interessante relembrar aqui que esse gênero de documentário está na raiz da discussão, iniciada por André Leroi-Gourhan
(1948), quando ele assinalava uma possível definição do filme etnográfico ou etnológico, como ele o denomina. Ao desenvolver uma possível
definição, ele classificou os filmes documentários em três categorias,
que são as seguintes: 1) Filmes de Pesquisa – “a pesquisa de Cinema é
um meio de” gravação científica; 2) Documentário Público – (o filme
“onde o exotismo está presente” e que é uma forma de filme de diário
de viagem), e o 3) Filme do “Meio especializado” (le film de milieu)
–, realizado sem uma intenção científica, mas que assume um valor
etnológico, pela maneira como uma história é contada, ultrapassando
o meio especializado para o qual o filme foi realizado. As definições
são tantas e aqui também evidenciamos aquela de Timothy Asch
(1973), que enfatiza o filme etnográfico como um instrumento de
ensino na antropologia. Nesse caso, nós colocamos em evidência que
um filme etnográfico se situa, justamente, na referência ao retrato de
uma realidade específica, e na descrição, através dos movimentos de
uma câmara, e com um importante elemento reflexivo na composição
82
Renato Athias
da narrativa imagética, o que Vertov (1929) insistia em colocar em
seus filmes.
Na realidade, nós, que trabalhamos nesse campo disciplinar da
antropologia, podemos dizer que essas três características em conjunto envolvem o que denominamos de “filme etnográfico”. O cinema
etnográfico diz respeito às relações sociais no mundo, e todos estão
de acordo que Robert Flaherty foi um dos pioneiros do gênero, especialmente com Nanook do Norte, que, em 1922, nos permitiu descobrir
os povos das regiões polares. O gênero vai experimentar um segundo
fôlego, e um revival, no final dos anos de 1950, com o advento das
câmeras leves de 16 mm. Alguns cineastas irão explorar a técnica do
cinema direto, como Jean Rouch, o mais famoso deles, e que está fortemente associado a essa “Nova Vaga”.1 Mas será nos finais dos anos de
1980 e início dos anos de 1990, com as novas tecnologias digitais, que
vai surgir um interesse muito maior nesse gênero de documentários.
Como diz Jean Rouch, em uma entrevista sobre o “Bilan du Filme
Ethnográphique” e a visualização de filmes etnográficos:
Au départ c’est André Leroi-Gourhan, le véritable créateur du film ethnographique, qui dès 1948, avait organisé une première confrontation
des films ethnographiques. Plus récemment, il nous a semblé intéressant
de faire suivre le Festival du Cinéma du Réel, qui se tient à Beaubourg
et présente des films sociologiques et ethnographiques, par un bilan où
il serait possible de montrer des films qui n’avaient pas été sélectionnés
car “trop ethnographiques”, le “Cinéma du Réel” s’orientant en effet de
plus en plus vers le cinéma documentaire. Ces deux manifestations sont
donc complémentaires. (Rouch, 1986)
André Leroi-Gourhan foi sempre lembrado como pioneiro em
desenvolver um debate, sob o ângulo metodológico, em torno do
filme etnográfico, e em geral todos os que trabalham com esse gênero
Apenas em 1967, a Unesco publica um primeiro e um único catálogo de filme
etnográfico sobre a “África Negra”, dando maior ênfase ao caráter etnográfico dos
filmes.
1
Filme etnográfico – o exótico, o diferente e o respeito ao outro
83
de documentário se referem a seu artigo germinal sobre o filme etnológico (Freire, 2011, p. 155). Ele reconheceu nos primeiros filmes
de Jean Rouch essa perspectiva antropológica do debate em torno
do “outro”, em filmes que davam uma nova importância à imagem
em movimento, em sua discussão, e concebidos como o produto de
uma longa batalha entre o gesto técnico e os de fala, depois de uma
mudança marcada por profundas transformações nas técnicas gerais
de expressão.
Nos anos de 1950, de acordo com José da Silva Ribeiro (2007),
é que o filme etnográfico se torna uma disciplina institucional, com
especialistas de critérios reconhecidos (Brigard, 1979). Aparecem
os primeiros realizadores e seus primeiros filmes, notadamente, Jean
Rouch, Les Maîtres Fous (1955), John Marshall, The Hunters (1958),
Robert Gardner, Dead Birds (1964) e Tim Asch, The Feast (1969).
Durante esse período, foram criados os primeiros programas de formação. Dentre estes, encontra-se a criação do Comité du Film Ethnographique, em 1953, por Jean Rouch, Enrico Fulchignoni, Marcel
Griaule, André Leroi-Gourhan, Henri Langlois e Claude Lévi-Strauss,
domiciliado no Musée de L’Homme e os programas de formação:
PIEF – Program in Ethnographic Film, criado em 1966 por Robert
Gardner e Asen Balicki, na Universidade de Harvard, e no mesmo
ano a criação do Laboratoire de Audiovisuel en Sciences Religieuses,
por Jean Rouch, Claude Lévi-Strauss, Germaine Dieterlen, na École
Pratique des Hautes Études.
Marc Piault explora, em um artigo de 1995, um debate que me
parece oportuno, e que diz respeito ao propósito do espaço e do
tempo de visualização; e o que ele chama de “ruptura com o cruzeiro
colonial”, com relação à exibição de filmes etnográficos na Europa
até os anos de 1990. Piault coloca em evidência que:
Il n’y avait plus de place pour un cinéma ethnologique qui aurait tenté
de rendre compte de la dynamique et de l’autonomie d’une société –
autochtone en même temps que des modalités réelles du changement.
La colonisation en état de marche ne pouvait accepter des images que
dans la mesure où elles contribuaient à la justification de cette éventuelle
84
Renato Athias
transition de la sauvagerie ou de la simplicité – primitives à l’instrumentalisation indigène. (1995, p. 14)
No caso do Brasil, e talvez de outros países, a década de 1980 vai
acondicionando por mais tempo e mais espaço esse tipo de produção.
E talvez a isso possamos associar que, na história da antropologia,
nasce uma crítica aos estudos antropológicos vinculados a posturas
colonialistas.
Com propriedade, Faye Guinsburg assinala que:
o filme etnográfico na atualidade não pode pretender (assim como não
pode mais a Antropologia em geral) ocupar a mesma posição no mundo
que ocupou até mesmo vinte e cinco anos atrás [...]. O gênero faz parte
agora de um inquietante leque de imagens provenientes de todo o planeta e de uma igualmente complexa diversidade de tecnologias para sua
produção e circulação. (1995, p. 74)
E são justamente os festivais que colocam, por um tempo e em
um espaço, esse conjunto de imagens sobre a alteridade em telas e
compartilham, com outros grupos sociais, uma série de filmes, narrativas imagéticas que mostram o diferente, o “exótico”, mas sobretudo
colocam a possibilidade de que as pessoas visualizem e, assim, possam
se confrontar consigo mesmas, através dessas imagens, que mostram
os outros e o “exótico”.
O filme etnográfico como gênero documental está presente nas
atividades de antropólogos brasileiros, há muitos anos. O livro organizado por Bela Feldman-Bianco e Miriam Moreira Leite2: Desafios da
imagem. Fotografia, iconografia e vídeo nas ciências sociais, já aponta
algumas das questões importantes, no que se refere à divulgação do
filme etnográfico, especificamente o texto de Patrícia Monte-Mór,
que explora algumas das questões que acredito serem importantes
nos festivais de filmes etnográficos. E, se olharmos algumas produções
Feldman-Bianco, Bela; Moreira Leite, Miriam. Desafios da imagem. Fotografia,
iconografia e vídeo nas ciências sociais. Campinas, SP: Papirus, 1998.
2
Filme etnográfico – o exótico, o diferente e o respeito ao outro
85
fílmicas, podemos perceber que certos filmes produzidos no Brasil,
nos inícios do século XX, fazem parte de um conjunto significativo
de filmes que consideramos etnográficos. Aqui, como exemplos, faço
referência aos filmes e às fotografias produzidos pelo Major Reis para
a Comissão Rondon. Em vários casos, esses filmes são exibidos em
certos festivais, e, em outros casos, alguns filmes utilizam imagens e sequências desses filmes em produções atuais sobre os povos indígenas.
No Brasil, talvez o mais antigo Festival (mostra) de filmes etnográficos tenha sido aquele organizado pela antropóloga Patrícia
Monte-Mór, no Rio de Janeiro, e que acontece desde 1993. A Mostra
Internacional do Filme Etnográfico, como é chamada, é um Festival que coloca em evidência os documentários etnográficos, tendo
foco específico na diversidade das culturas. É um Festival que não
é competitivo, em grande parte realizado através de uma curadoria
esmerada e que certamente aponta a produção clássica, nacional e
internacional. O diálogo entre o Cinema e a Antropologia é muito
antigo, sendo inúmeras as produções sobre essa relação, algo muito
bem desenvolvido no livro de Claudine de France (1998).
Acho importante ressaltar nesse texto que foi a partir dos inícios
dos anos de 1990 que surgiram os principais festivais do filme etnográfico, tanto aqui no Brasil, como a Mostra do Filme Etnográfico
no Rio de Janeiro, o Forum Doc, em Belo Horizonte, a Mostra Amazônica em Manaus, o FIFER em Recife, para citar alguns. Fora do
Brasil, também para citar alguns, ressaltamos o Margaret Mead Film
and Vídeo Festival, em Nova York, o Festival Jean Rouch, em Paris,
o Festival Etnográfico de Nuoro, Sardenha, o Contro-Sguardi, em
Perugia, o Festival de Gottingham, na Alemanha, o Festival do Royal
Anthropological Institute, na Inglaterra, o Festival Etnográfico de
Délhi, na Índia. Não são muitos, porém bastante eficientes em suas
produções.
Assim, o filme etnográfico ou o cinema etnográfico, como gênero
documental, compreende uma vasta gama de interesses que abarca
uma grande variedade de utilização da imagem em movimento, sobretudo relacionada às populações humanas, nos seus aspectos de
86
Renato Athias
sociabilidade e manifestações culturais. Essas produções colocam
em relevo muitos documentos e até mesmo resultados de pesquisas ainda em construção ou ainda não muito bem elaboradas. Os
métodos e as técnicas utilizadas no cinema etnográfico, de acordo
a minha experiência, são bastante variados e estão muitas vezes associados a tradições teóricas diferenciadas, que muitas vezes podem
ser percebidas na exibição de um filme. Essas produções apoiam as
sequências imagéticas na descrição, naquilo que se pode ver, ou melhor, no que a câmara pode captar e passar de uma forma descritiva.
As imagens funcionam como arquivos sobre um determinado grupo social, muitas vezes são recebidas e entendidas, por um público,
como exóticas, fora de um contexto urbano, em sua grande maioria,
criando assim um grande estranhamento.
Nesses cinco anos da existência do Festival Internacional do Filme
Etnográfico do Recife (FIFER), podemos perceber nos filmes que
foram exibidos que estes procuraram, em geral, descrever as técnicas,
o modo de viver, a arte, as formas de subsistência, os rituais, as cerimônias etc. E aqui, talvez possamos entrar na primeira questão desse
debate: sobre o que os festivais de filmes etnográficos querem mostrar
através de sua seleção para um público amplo, além da possibilidade
de revelar outros modos de vida, outros modos de olhar o mundo.
Nesse sentido, nos alinhamos a Marc Piault, que assinala os festivais
de filmes etnográficos como espaços para romper o olhar “colonial”
sobre o outro, permitindo que esse “olhar” possa ser compartilhado
com outros.
Assim, analisando os filmes exibidos durante o FIFER, evidenciamos dois grandes grupos ou duas grandes categorias de produções
visuais que foram vistas durante esse Festival. Evidentemente, podemse organizar em diversas categorias as centenas de filmes que o FIFER
registrou nesses últimos cinco últimos anos, mas não convém, nesse
momento, ampliar a caracterização dessas centenas de filmes, para
além desses dois grandes grupos, tendo em vista discutir o impacto
do Festival em uma determinada audiência.
O primeiro conjunto de filmes, que sem dúvida representa um
número elevado, e que foram vistos nas diversas mostras do FIFER,
Filme etnográfico – o exótico, o diferente e o respeito ao outro
87
são aqueles documentários produzidos sobre os ameríndios, povos
diferentes, sobre as sociedades tradicionais, os povos indígenas, sobre
os quilombolas, sobre os ciganos, por exemplo, que se encontram
vivendo nas fronteiras dos Estados nacionais da América Latina. Essa
produção filmográfica talvez seja a maior, em termos de número, apresentada em festivais de filmes etnográficos no Brasil, e foi, até então, a
categoria de filmes mais inscrita no FIFER. Para muitos, esse grupo de
filmes se enquadraria no que seria, de fato, um filme etnográfico, uma
vez que os outros retratados pertencem a outras sociedades, distintas
daquela a que pertencemos. Nesse caso, uma parcela do exótico é
apresentada como forma de ampliar o estranhamento, e poder servir
como espelho para situações que, nos contextos das sociedades ocidentais, promovem esse tipo de festivais.
Esta produção pode ainda se subdividir em dois grupos, tendo em
vista os realizadores, em conjuntos bem específicos: os filmes, realizados pelos próprios índios ou quilombolas, e os filmes produzidos,
sob uma temática específica, sobre os índios. Entre esses filmes, o
festival recebeu produções muito variadas. Desde o filme “denúncia”
até uma descrição bem específica de um determinado ritual ou prática
tradicional de uma comunidade quilombola. Porém, o que se pode
perceber, durante esses festivais, principalmente através dos filmes
que foram premiados, é que as produções sobre os povos indígenas,
em que houve um grande envolvimento da comunidade indígena na
realização do filme, foram os que mais interessam às pessoas. Esses
filmes são os que mais recebem público, e se pode verificar que é uma
audiência bastante interessada. Nessa mesma categoria, o Festival
recebeu vários filmes sobre os povos indígenas de outros países, o
que nos pareceu muito bom para ampliar o conhecimento sobre essa
alteridade, fora do contexto brasileiro.
O outro conjunto de produções filmográficas, também muito
grande, apresentado nos festivais de filmes etnográficos, diz respeito
aos aspectos dos “modos de vida” da sociedade ocidental. Apresentam
outros olhares sobre o cotidiano. A relação entre as pessoas, nos contextos sociais das cidades ou de comunidades inseridas em distintas
situações, em geral de grupos em situações de risco e marginalizados.
88
Renato Athias
Esses filmes apresentam, geralmente, temáticas muito variadas sobre
o dia a dia da vida das pessoas, principalmente em contexto urbano.
Evidentemente, nesse conjunto de filmes, não deixam de aparecer
os filmes denúncia, relacionados principalmente com as questões
ambientais. São documentários, em geral, com muitas entrevistas e
muitas narrações. Alguns desses filmes envolvem muito bem a audiência na temática apresentada; outros enfatizam a descrição exaustiva
de processos que, em geral, estão desaparecendo e que merecem ser
documentados.
O que pudemos perceber durante as edições do Festival do
Filme Etnográfico do Recife é que o público, em geral, associa muito
mais o caráter etnográfico das produções fílmicas a povos tradicionais. E isso me pareceu ser comum às diversas audiências do Festival,
tanto aquela que se encontra nos auditórios da Universidade, quanto
as outras pessoas que não têm relação com ela e vão a salas fora dos
espaços universitários. Marcius Freire (2006, p. 160), discutindo os documentários, apresenta duas possibilidades, ao olhar os documentários
pela “linguagem” dessas produções, problematizando uma distinção
entre uma “linguagem científica” e uma “descrição literária” muito
próxima a ficção. Ele considera que:
a distinção entre a descrição científica e a descrição literária não está,
portanto, no próprio texto, mas em um status que lhes é dado independentemente dos fatos que as motivaram; e tal status lhes é atribuído por
fatores que lhes são exteriores: o lugar de fala do autor; a crítica especializada; os especialistas em estudos literários, etc. (Freire, 2006, p. 160)
Em outras palavras, nós podemos dizer que será exatamente a relação entre realizador/audiência que dá possibilidade de “sentido” à
produção visual, ou que possibilita a distinção entre as linguagens. As
produções realizadas pelos próprios índios, não só pelo argumento de
autoridade, pois os realizadores são índios, mas pelo fato de passarem
mais diretamente a mensagem, não intermediada, de um determinado
evento fílmico, vão poder fazer a distinção entre um documentário e
uma ficção. Não nos interessa entrar aqui nesse debate, mas simples-
Filme etnográfico – o exótico, o diferente e o respeito ao outro
89
mente problematizar que será justamente essa oposição realizador/
audiência a mais forte e a mais importante, nas diversas audiências
de um Festival etnográfico. É preciso que se diga que não é o contato
que se passa na tela, e na narrativa sonora do filme, que revela se o
que se está assistindo é uma ficção ou um documentário. A representação das pessoas, o cenário, a iluminação e os enquadramentos de
uma sequência fílmica, editados por um realizador, não fornecerão a
evidência de que aquele registro visual pertence a um mundo histórico
ou a um mundo criado para ser filmado.
Diante das questões colocadas, eu acredito ser importante dizer
que os festivais de filmes etnográficos colaboram efetivamente, como
disse Marc Piault, para romper com o discurso colonialista sobre o
outro. As imagens são fortes e têm o grande poder sobre as pessoas de
ampliar, sobretudo, o respeito pelo outro. Esses espaços de visualização são praticamente a única maneira de se observar essas produções
visuais, pois esses filmes não entram em programação de televisões do
“main stream”, estando à margem de qualquer programa, até mesmo
de emissoras públicas. Esses festivais se colocam como um espaço
de respeito, insistindo que as pessoas deveriam ser vistas, principalmente como fazendo parte de uma sociedade intercultural, onde esse
outro etnografado ou exótico possa também ter um lugar específico,
sobretudo participar como protagonista de suas próprias demandas.
No caso do FIFER, sem dúvida, o Festival do filme etnográfico provocou esse olhar, nesses últimos cinco anos, até mesmo no âmbito das
instituições que ajudam a promover esses festivais, tornando-se um
espaço importante para discutir e entender esse outro diferente de nós.
90
Paride Bollettin
Il film etnografico – l’esotico, il diverso e il rispetto per l’altro
91
In questo articolo ci interessa riflettere su alcune questioni in relazione al genere di documentario che siamo abituati a chiamare “Film
Etnografico”. Queste riflessioni qui presentate hanno a che fare con
ciò che comprende gli “studi della ricezione” (principalmente nel
campo della comunicazione sociale), e si basano sulla mia esperienza
di organizzatore delle ultime cinque edizioni del Festival do Filme
Etnográfico do Recife, che è realizzato annualmente nella città di
Recife in Brasile.
Penso sia interessante ricordare qui che questo genere di documentari si situa alla base della discussione iniziata da Leroi-Gourham
(1948), quando indica una possibile definizione del film etnografico o
etnologico, come lui o denomina. Per sviluppare una possibile definizione, egli ha classificato i film documentari in tre categorie: 1) Film
di Ricerca: “le ricerca è uno strumento di” registrazione scientifica; 2)
Film Pubblico: il film “in cui l’esotismo è presente e che” è una forma
di film come diario di viaggio; e il 3) Film di “Ambito Specializzato”
[Le Film de Milieu], realizzato senza un intento scientifico, ma che
assume un valore etnologico per la maniera in cui una storia viene
raccontata ed oltrepassa il campo specializzato per il quale è stato
realizzato. Le definizioni sono molteplici e evidenziamo qui anche
quella di Timothy Ash (1973), il quale enfatizza il film etnografico
come uno strumento di insegnamento in antropologia. In questo
caso noi sottolineiamo che un film etnografico si situa giustamente
nel riferimento ad una realtà specifica e nella descrizione attraverso i
movimenti di una telecamera, con un importante momento riflessivo
92
Renato Athias
nella composizione della narrazione immagetica, ciò che Vertov (1929)
insisteva nel collocare nei suoi film.
In realtà, per noi che lavoriamo con questo campo disciplinare
dell’antropologia, possiamo dire che queste tre caratteristiche assieme
coinvolgono ciò che denominiamo Film Etnografico. Il cinema etnografico parla delle relazioni sociali nel mondo, e tutti sono d’accordo
che Robert Flaherty è stato uno dei pionieri del genere, in particolare
con Nanook do Norte, che, nel 1922, ci ha permesso di scoprire i
popoli della regione artica. Il genere vedrà un secondo respiro, un
“revival”, alla fine degli anni Cinquanta, con l’avvento delle telecamere
da 16mm. Alcuni cineasti esploreranno la tecnica del cinema diretto,
come Jean Rouch, il più famoso di loro e che è fortemente legato a
questa “Nuova ondata”1. Ma sarà alla fine degli anni Ottanta e inizio
dei Novanta con le nuove tecnologie che sorgerà un interesse molto
maggiore per questo genere di documentari.
Come disse Jean Rouch in un’intervista a proposito del Bilan du
Filme ethnográphique e sulla visualizzazione di film etnografici:
Au départ c’est André Leroi-Gourhan, le véritable créateur du film ethnographique, qui dès 1948, avait organisé une première confrontation
des films ethnographiques. Plus récemment, il nous a semblé intéressant
de faire suivre le Festival du Cinéma du Réel, qui se tient à Beaubourg
et présente des films sociologiques et ethnographiques, par un bilan où
il serait possible de montrer des films qui n’avaient pas été sélectionnés
car “trop ethnographiques”, le “Cinéma du Réel” s’orientant en effet de
plus en plus vers le cinéma documentaire. Ces deux manifestations sont
donc complémentaires. (Rouch, 1986)
André Leroi-Gourham è sempre stato ricordato come un pioniere
nello sviluppare una discussione di taglio metodologico a riguardo del
film etnografico, e in generale tutti coloro che lavorano con questo
genere di documentari fanno riferimento ad un suo articolo seminale
Solo nel 1967 l’Unesco pubblica il primo, e unico, catalogo di film etnografici
sulla “Africa Nera”, enfatizzando maggiormente il carattere etnografico dei film.
1
Il film etnografico – l’esotico, il diverso e il rispetto per l’altro
93
sul film etnografico (Freire, 2001: 155). Egli riconobbe nei primi film
di Jean Rouch questa prospettiva antropologica della discussione
su “L’altro”, film che davano una nuova importanza all’immagine
in movimento, nella loro discussione, e che erano concepiti come il
prodotto di una lunga battaglia tra il gesto tecnico e la parola, dopo
un lungo cambiamento segnato da profonde trasformazioni nelle
tecniche generali di espressione.
È negli anni Cinquanta, secondo José da Silva Ribeiro (2007) che
il film etnografico diviene una disciplina istituzionale con specialisti
dai criteri riconosciuti (Brigard, 1979). Appaiono i primi realizzatori
e i loro primi film, notoriamente Jean Rouch, Les Maîtres Fous (1955),
John Marshall, The Hunters (1958), Robert Gardner, Dead Birds (1964)
e Tim Ash, The Feast (1969). Durante questo periodo, furono creati
i primi programmi di formazione. Tra questi si trova la creazione del
Comité du Film Ethnographique, nel 1953, da parte di Jean Rouch,
Enrico Fulchignoni, Marcel Griaule, André Leroi-Gourham, Henri
Langlois e Claude Lévi-Strauss, presso il Musée de l’Homme, ed i
programmi di formazione: Program in Ethnographic Film, creato
nel 1966 da Robert Gardner e Asen Balicki all’Università di Harvard
e, nello stesso anno, la creazione del Laboratoire de Audiovisuel en
Sciences Religieuses da parte di Jean Rouch, Claude Lévi-Strauss,
Germaine Dieterlen, all’École Pratique des Hautes Études – Sorbone.
Marc Piault analizza in un suo articolo del 1995 un dibattito che
mi sembra opportuno, e che riguarda lo spazio ed il tempo di visualizzazione, e che egli definisce di: rottura con la crociera coloniale”
in relazione all’esibizione di film etnografici in Europa fino agli anni
Novanta. Piault mette in evidenza che:
Il n’y avait plus de place pour un cinéma ethnologique qui aurait tenté
de rendre compte de la dynamique et de l’autonomie d’une société –
autochtone en même temps que des modalités réelles du changement.
La colonisation en état de marche ne pouvait accepter des images que
dans la mesure où elles contribuaient à la justification de cette éventuelle
transition de la sauvagerie ou de la simplicité – primitives à l’instrumentalisation indigène (1995 : 14)
94
Renato Athias
Nel caso del Brasile, e forse di altri paesi, la decadenza degli
anni Ottanta, condizionerà per più tempo e più estesamente questo
tipo di produzione. Forse possiamo associare a ciò che nella storia
dell’antropologia nasce una critica agli studi antropologici vincolati
alle posizioni colonialiste.
Con acutezza, Faye Guinsburg segnala che:
il film etnografico nell’attualità non può pretendere (così come non lo
può fare l’Antropologia in generale) di occupare la stessa posizione nel
mondo che ha occupato fino a soli venticinque anni fa […]. Il genere fa
parte adesso di un inquietante ventaglio di immagini provenienti da tutto
il pianeta e di una ugualmente complessa diversità di tecnologie per la
loro produzione e circolazione (1995: 74).
E proprio i Festival mettono, in un tempo ed in uno spazio, questo
insieme di immagini sull’alterità su schermi e condividono con altri
gruppi sociali una serie di film, narrazioni immagetiche, che mostrano il differente, “esotico”, ma soprattutto pongono la possibilità che
le persone visualizzino e, ancor di più, si confrontino con se stesse,
attraverso queste immagini che mostrano gli altri e gli “esotici”.
Il film etnografico come genere documentario è presente nelle
attività degli antropologi brasiliani da molti anni. Il libro organizzato
da Bela Feldman-Bianco e Miriam Moreira Leite, intitolato Desafios da
Imagem. Fotografia, iconografia e vídeo nas ciências sociais, già indica
alcune questioni importanti in riferimento alla divulgazione del film
etnografico, in particolare il testo di Patrícia Monte-Mór che indaga
alcuni temi, che credo siano importanti nei Festival di Film Etnografici.
E, se guardiamo ad alcune produzioni filmiche, possiamo percepire
che certi film prodotti in Brasile all’inizio del XX Secolo fanno parte
di un insieme significativo di film che consideriamo come etnografici.
Qui, ad esempio, faccio riferimento ai film e alle fotografie prodotte
dal Maggiore Reis per la Commissione Rondon. In alcuni casi questi
film vengono esibiti in certi Festival, in altri casi alcuni film utilizzano
immagini e sequenze di questi film nelle produzioni attuali sui popoli
indigeni.
Il film etnografico – l’esotico, il diverso e il rispetto per l’altro
95
In Brasile, forse il più antico Festival (mostra) di film etnografici è
stato quello organizzato dall’antropologa Patrícia Monte-Mór, a Rio
de Janeiro, che esiste dal 1993. La Mostra Internacional do Filme
Etnográfico, come è chiamata, è un Festival che mette in evidenza i
documentari etnografici, avendo come obiettivo specifico la diversità
delle culture. È un Festival che non è competitivo, gran parte del
quale è realizzato con una curatela attenta, e che certamente indica
nella direzione della produzione classica nazionale e internazionale.
Il dialogo tra il Cinema e l’Antropologia è molto antico e sono innumerevoli le produzioni su questa relazione, ben sviluppata nel libro
di Claudine de France (1998).
Credo sia importante mettere in risalto che è stato a partire dall’inizio degli anni Novanta che sono sorti i principali Festival di film
etnografici, sia qui in Brasile, come la Mostra do Filme Etnografico a
Rio de Janeiro, il Forum Doc a Belo Horizonte, la Mostra Amazônica
a Manaus, il FIFER a Recife, per citarne alcuni. Fuori dal Brasile,
sempre per citarne alcuni, evidenziamo il Margaret Mead Film Film
and Video Festival di New York, il Festival Jean Rouch a Parigi, il
Festival Etnografico di Nuoro, in Sardegna, Contro-Sguardi a Perugia, il Festival di Gottingham in Germania, il Festival della Royal
Anthropological Insitute in Inghilterra e il Festival Etnografico di
Delhi, in india. Non sono molti, ma sono abbastanza efficienti nelle
loro produzioni.
Pertanto, il film etnografico o il cinema etnografico, come genere
documentario, comprende una vasta gamma di interessi, e abbraccia
una grande varietà di utilizzi dell’immagine in movimento, e soprattutto mette in relazione le popolazioni umane nei loro aspetti della
sociabilità e delle manifestazioni culturali. Queste produzioni mettono
in risalto molti documenti e perfino i risultati di ricerche i cui esiti sono
ancora in una fase di costruzione non molto ben elaborata. I metodi
e le tecniche utilizzate nel cinema etnografico, secondo la mia esperienza, sono molto variati e sono spesso associati a tradizioni teoriche
differenziate che molte volte possono essere percepite nell’esibizione
di un film. Queste produzioni appoggiano le sequenze immagetiche
96
Renato Athias
nella descrizione, in ciò che si può vedere, o meglio in ciò che la telecamera può captare e trasmettere in maniera descrittiva. Le immagini
funzionano come archivi su di un determinato gruppo sociale, ma
molte volte vengono ricevute e comprese dal pubblico come esotiche,
nella loro grande parte al di fuori del contesto urbano, creando così
un grande straniamento.
In questi cinque anni di esistenza del Festival Internacional do
Filme Etnográfico do Recife (FIFER) abbiamo potuto osservare nei
film che sono stati esibiti che essi cercavano, in generale, di descrivere
tecniche, modi di vivere, arte, forme di sussistenza, rituali, cerimonie,
ecc. Qui, forse, potremmo addentrare la prima questione di questo
dibattito su ciò che i Festival di film etnografici vogliono mostrare
attraverso le loro selezioni a un pubblico ampio, oltre alla possibilità
di rivelare gli altri modi di vivere, altri modi di guardare il mondo.
In questo senso, seguiamo Marc Piault che segnala i Festival di film
etnografici come spazi per rompere lo sguardo “coloniale” sull’altro,
permettendo che questo “sguardo” possa essere condiviso con altri.
Così, analizzando i film esibiti durante il FIFER, evidenziamo due
grandi gruppi o due grandi categorie di produzioni visuali che sono
state visualizzate durante questo Festival. Evidentemente si possono
organizzare in diverse categorie le centinaia di film che il FIFER ha
collezionato in questi ultimi anni, ma non conviene in questo momento
ampliare la caratterizzazione di queste centinaia di film oltre ai due
gruppi per discutere l’impatto del Festival sul pubblico.
Il primo insieme di film, che senza dubbio rappresenta un numero
elevato, e che sono stati visti durante le diverse mostre del FIFER,
sono quei documentari prodotti sui popoli amerindi, popoli diversi,
sulle società tradizionali, i popoli indigeni, sui quilombola, sugli zingari,
ad esempio, che si trovano a vivere alle frontiere degli stati nazionali
dell’America Latina. Questa produzione filmica forse è la maggiore, in
termini numerici, presentata nei Festival di film etnografici in Brasile,
ed è stata, fino ad oggi, la categoria di film che più ha avuto iscritti
al FIFER. Per molti i film di questo gruppo si inquadrerebbero in
ciò che sarebbe, di fatto, un film etnografico, perché gli altri ritratti
Il film etnografico – l’esotico, il diverso e il rispetto per l’altro
97
appartengono a altre società distinte da quella a cui noi apparteniamo.
In questo caso, una parte dell’esotico viene presentata come forma
di ampliamento dello straniamento, e può servire come specchio per
situazioni che, nei contesti delle società occidentali, promuovono
questo tipo di Festival.
Questa produzione può essere anche divisa in due gruppi, osservando i realizzatori, ben determinati. Ossia i film realizzati dagli stessi
indigeni o quilombola e i film prodotti su una tematica specifica relativa
agli indigeni. Tra questi film, il festival ha ricevuto produzioni molto
variate. Da film di “denuncia” ad una descrizione ben specifica di un
determinato rituale o pratica tradizionale di una comunità afrodiscendente. Però, ciò che si può vedere durante questi Festival, principalmente attraverso i film che sono stati premiati, è che le produzioni sui
popoli indigeni nelle quali c’è stato un grande coinvolgimento della
comunità indigena nella realizzazione del film sono stati quelli che più
hanno interessato le persone. Questi film sono quelli che hanno più
pubblico, e si può constatare che è una platea abbastanza interessata.
In questa stessa categoria il Festival ha ricevuto vari film sui popoli
indigeni di altri paesi, e ci è sembrato un bene ampliare la conoscenza
di questa alterità al di fuori del contesto del Brasile.
L’altro insieme di produzioni filmiche, anch’esso molto grande,
presentate nei Festival di film etnografici riguarda gli aspetti dei
“modi di vita” della società occidentale. Presentano altri sguardi
sulla quotidianità. La relazione tra le persone nei contesti sociali delle
città o comunità inserite in diverse situazioni, in generale di gruppi in
situazioni di rischio o marginalizzati. Solitamente questi film presentano temi molto vari sulla quotidianità delle persone principalmente
nei contesti urbani. Evidentemente, in questo insieme non mancano
i film di denuncia in relazione principalmente alle questioni ambientali. Sono documentari, in generale, con molte interviste e molte
narrazioni. Alcuni di questi film coinvolgono molto bene il pubblico
nel tema presentato, altri enfatizzano una descrizione esauriente di
processi che, in generale, stanno scomparendo e meritano di essere
documentati.
98
Renato Athias
Ciò che abbiamo percepito durante le edizioni del FIFER è che
il pubblico, in generale, associa molto di più il carattere etnografico
delle produzioni filmiche ai popoli tradizionali. Questo mi sembra
essere un tratto comune ai diversi pubblici del Festival, sia di quello
che si trova negli auditori dell’università, sia delle altre persone che
non hanno vincoli con l’università e vanno alle sale esterne all’università. Marcius Freire (2006: 160), discutendo i documentari, presenta
due possibilità osservando i documentari attraverso il “linguaggio”
di queste produzioni, problematizzando un “linguaggio scientifico”
e una “descrizione letteraria” molto vicina alla fiction. Egli afferma:
la distinzione tra descrizione scientifica e descrizione letteraria non è,
quindi, nel testo stesso, ma in uno status che gli è dato indipendentemente
dai fatti che le hanno motivate; e tale status gli è attribuito da fattori che
gli sono esterni: il luogo, le parole dell’autore, la critica specializzata, gli
specialisti in studi letterari, ecc. (: 160).
In altre parole, possiamo dire che sarà proprio la relazione tra
realizzatore e pubblico che renderà possibile il “senso” della produzione visuale, o che renderà possibile la distinzione tra i linguaggi.
Le produzioni realizzate dagli stessi indigeni, non solo per l’autorità,
perché i realizzatori sono gli stessi indigeni, ma per il fatto di passare
più direttamente un messaggio, non mediato, di un determinato evento
filmico, possono fare la distinzione tra un documentario e una fiction.
Non ci interessa entrare qui in questa discussione, ma semplicemente
problematizzare che sarà giustamente questa opposizione realizzatore/
pubblico la più forte e la più importante nelle diverse platee di un
Festival etnografico. È importante dire che non è il contatto che viene
trasmesso sullo schermo, e nella narrazione sonora del film, che rivela
se si ciò a cui si sta assistendo è una fiction o un documentario. Non
saranno la rappresentazione delle persone, lo scenario, l’illuminazione,
e le inquadrature di una sequenza filmica editata da una realizzatore
che daranno l’evidenza che quel registro visuale appartiene a un mondo storico o ad un mondo sviluppato per essere filmato.
Il film etnografico – l’esotico, il diverso e il rispetto per l’altro
99
Di fronte alle questioni che abbiamo posto, credo sia importante
dire che i Festival di film etnografici collaborano effettivamente,
come disse Marc Piault, a rompere il discorso colonialista sull’altro.
Le immagini hanno un grande potere sulle persone per ampliare,
soprattutto, il rispetto verso l’altro. E questi spazi di visualizzazione sono praticamente l’unica maniera di vedere queste produzioni
visuali, perché esse non entrano nella programmazione delle televisioni main stream, situandosi ai margini di ogni programma, anche
delle televisioni pubbliche. Questi Festival si collocano come uno
spazio di rispetto, insistendo che le persone dovrebbero essere viste
principalmente come parte di una società interculturale, dove questo
altro etnografato o esotico possa avere anche un suo luogo specifico,
e soprattutto possa partecipare come protagonista delle sue proprie
domande. Nel caso del FIFER, senza dubbio, ha provocato questo
sguardo, negli ultimi cinque anni, perfino all’interno delle istituzioni
che aiutano a promuovere questi Festival ed è diventato uno spazio
importante per discutere e comprendere questo altro diverso da noi.
100
Renato Athias
Bibliografia
Asch, T., Marshal, J. e Spies, P. “Ethnographic Film: Strucuture and Function”. Anual Review of Anthropology, 2(1): 179-187, 1973.
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Piault, Marc-Henri. “L’Exotisme em le Cinéma Ethnographique: La Rupture d’Une Croisière Colonial”. Horizontes Antropológicos, ano 1, n. 2:
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Ginsburg, Faye. “The parallax effect: The impact of aboriginal media on
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Peixoto, C. “Do diário de campo à câmera na mão ou de como virar antropólogo cineasta”. Revista de Antropologia, 39 (2): 225-273, 1996.
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
101
102
Paride Bollettin
Allison Jablonko
Olhares compartilhados e troca
de visões: histórias de “nos” e “eles”
Sguardi condivisi e scambi
di visioni: storie di “noi” e “loro”
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
103
Incentivada por um sentimento de aventura e pela curiosidade
frente ao “outro”, a viagem foi parte da vida humana, desde o nosso
começo – a viagem e o desejo de levar para casa, “para a nossa gente”,
as histórias do que foi visto e ouvido. Como as representações visuais
foram acrescentadas aos tradicionais contos orais frente a frente, as
imagens (desenhos, pinturas) e as palavras escritas fixam as histórias
no tempo. Com o advento da fotografia, ao longo do século XIX,
estas representações foram aumentando em número. A fotografia
expandiu-se até incluir não somente as imagens de parentes em férias ou de exóticos “nativos”, encontrados em lugares distantes, mas
também retratos dos membros da família que residem e trabalham
em mundos longe de casa. Em seguida, a fotografia expandiu-se para
as imagens em movimento, primeiro no filme e depois no vídeo. A
cada mutação da tecnologia, a composição do grupo de espetadores
aumentou, desde as pequenas e íntimas reuniões familiares até a
grande plateia dos cinemas públicos,1 a maior parte dos membros (se
não todos) não tem nenhuma conexão com os autores das imagens
ou com as pessoas representadas.
O foco principal das histórias narradas foi nos termos de “nós” e
“eles”, se não até “nós versus eles”. O “nós” são aqueles que narram,
que veem, as testemunhas, enquanto “eles” são os “outros”, aqueles
que observam – com interesse, talvez apreciando-os, mas, muitas
O maior cinema com uma tela só, existente no mundo, era então o Gaumont Palace, em Paris, França, com uma capacidade de 6.420 espectadores, que foi fechado
em 1970.
1
104
Allison Jablonko
vezes, com um pouco de desprezo ou desdém, e uma escassa atenção
ao compreender as estruturas das diferenças que achamos intrigantes
e inquietantes. Ao longo do século passado, os antropólogos, trabalhando com imagens fixas e em movimento, tentaram reverter essa
depreciável inclinação.2 Etnografias eram escritas e documentários
eram produzidos, na tentativa de comunicar para “nós”, enquanto
observadores, uma mais profunda compreensão de eventos e pessoas
não familiares. Os lugares de apresentação – escolas, festivais cinematográficos3 e cinemas – assim como os autores dessas histórias dos
“outros” ainda eram majoritariamente inseridos no “nosso” mundo.
As histórias sobre “eles” eram feitas por “nós” e para “nós”.
A partir da metade do século XX, a situação foi progressivamente
modificando-se. Uma série de antropólogos trabalharam lado a lado
com os informantes e os film-makers – em alguns casos apenas um
diretor que manuseava tanto a câmara como o microfone, em outros
casos, uma equipe, com um diretor, um operador da câmara e um
outro do microfone. Um precursor exemplo dessas equipes fílmicas
de uma pessoa só foi o projeto de Timothy Asch, com o antropólogo
Napoleon Chanon, entre os indígenas Yanomami das matas da América do Sul, que resultou em um filme de 39 minutos, lançado e editado
entre 1968 e 1975. Desde então, Asch trabalhou com a esposa Pasty,
colaborando com vários antropólogos na Indonésia. A colaboração
do casal Asch com Linda Connor começou graças a um filme, com
uma só sequência que, em 1970, documentava o processo no qual
Connor e a sua informante Jero Tapakan analisavam com atenção o
filme precedente A Balinese Transe Séance. No filme de 1970, Jero
Vejam-se Lutz e Collins (1993), para uma detalhada análise do público e das
fotografias, no National Geographic. Os capítulos 7 e 8 são especialmente interessantes.
3
Os maiores festivais cinematográficos etnográficos do século XX ainda em atividade são: Festival dei Popoli (Firenze, 1959), Margaret Mead Film Festival (New
York, 1976), Cinéma du Réel (Parigi, 1978), Bilan du Film Ethnographique (Parigi,
1982), Royal Anthropological Institute (U.K., 1985), Goettingen International Ethnographic Film Festival (1993).
2
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
105
Tapakan, uma curandeira tradicional, respondia as perguntas de
Connor e explicava os seus procedimentos e as suas experiências de
cura, assim como documentadas no seu primeiro filme. Este segundo
filme, Jero on Jero: “A Balinese Trabce Séance” Observed, é claramente
uma dupla história: aquela da interação entre a antropóloga e a sua
informante e aquela de um específico episódio de cura.
Um exemplo de projeto desenvolvido com uma equipe maior é a
documentação das práticas de iniciação masculina do povo Baruya,
do planalto oriental, da Papua Nova Guiné. Toward Baruya Manhood
(1973) e Baruya Muka Archival (1992) foram realizados por um grupo
composto pelo antropólogo francês Maurice Godelier, uma equipe de
três pessoas do Film Australia dirigidas por Ian Dunlop e os Baruya
do Wonenara Valley. O projeto começou em 1969, seis meses depois
que eu e meu marido tínhamos trabalhado com Godelier, para criar
uma gravação visual das interações entre ele e seus informantes Baruya (Jablonko, 1982; 1998). A equipe da Australia Film chegou a
tempo para filmar as cerimônias da segunda, terceira e quarta partes
da iniciação masculina. As montagens foram realizadas na Austrália e
a edição foi realizada, segundo o senso de duração Baruya do tempo.
Dunlop recusou-se a recortar o material em formato convencional
segundo a visão internacional, permitindo, pelo contrário, que o produto final fosse constituído por nove curtas que somavam um total
de sete horas e meia – longo demais para qualquer filme etnográfico
usual. Esta série foi concluída em 1972. Em 1979, a primeira parte
da iniciação foi celebrada de novo, e novamente Dunlop, com a sua
equipe de cameraman e soundman, encontrou Godelier. As dezessete
horas de gravações, realizadas em um período ritual de mais de quatro
semanas, foram levadas para Port Moresby, onde Godelier e Dunlop
trabalharam por quatro semanas com o linguista que transcreveu a
língua Baruya.4 Eles foram acompanhados por sete homens Baruya,
que atravessavam cada cena, fornecendo detalhadas explicações. O
projeto foi finalmente completado e editado, em 1991, em um vídeo
4
Cick Lloyd del Summer Institute of Linguistics.
106
Allison Jablonko
de 27 partes, com um total de trinta horas e meia. Devido à natureza
ritual de muitas das imagens, os Baruya estipularam um acordo que
nenhum desses filmes seria levado para a Papua Nova Guiné, onde
mulheres e homens não iniciados poderiam assisti-los. Assim, a gravação histórica da sociedade Baruya da década de 1970 existe para o
limitado público dos iniciados Baruya e para os estudiosos dos Baruya
– um “nós” e “eles” muito específico.
Em 1985, Terence Turner, que trabalhava com os Kayapó nos
Estados do Pará e do Mato Grosso, no Brasil, foi um dos primeiros
antropólogos que colocou diretamente a câmara nas mãos das pessoas5
(Turner, 2003). O filme que resultou foi uma declaração direta dos
Kayapó, para o resto do mundo, e parte de uma efetiva campanha para
bloquear a construção de uma hidrelétrica que teria inundado boa
parte de seus territórios. O instrumento visual, nas mãos de grupos
minoritários, demonstrou ser potente no comunicar as mensagens
indígenas aos governos nacionais. As cartas tinham mudado. Os
“outros” agora estavam contando as próprias histórias para “nós”.
O “nós” não era mais o único canal de produção e distribuição das
histórias dos outros.6 Às representações de “eles sendo nós” tinham
que se somar as representações de “eles segundo eles”, lançando essa
mensagem: “Assim é como somos de verdade! Assim é como queremos
que vocês nos vejam!”7
Essa nova direção do olhar chegou em um momento da história
em que as mídias têm alargado a comunicação muito além das mais
lindas esperanças daqueles de nós que, na primeira metade do século
Terence Turner é professor de antropologia na Cornell University. Ele foi muito
envolvido com os direitos humanos e com as atividades de suporte aos indígenas da
América do Sul, trabalhando no Ethics Comitee da AAA, de 1969 a 1972, guiando
a Special Comission para estudar a situação dos Yanomami em 1991. Disponível
em: <http://www.publicanthropology.org/Yanomami/Turner.htm> e <http://www.
comminit.com/?q=media-development/node/1638>.
6
Outro exemplo são os documentários de Alan Ereira, entre os Kogi da Colômbia, em 1990.
7
Disponível em: <http://www.wild.org/main/how-wild-works/wild-in-action
-worldwide/kayapo/kayapo-culture-and-history/>.
5
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
107
XX, tinham trabalhado para documentar as diferentes formas de viver
que esperávamos persistissem, mesmo sabendo que a transformação
já estava a caminho. Os filmes que fizemos na época eram olhados
por um público restrito, principalmente em espaços acadêmicos ou
nas salas do cinema de arte. A mais ampla distribuição ocorria através da televisão educativa. O complexo hodierno das mídias visuais,
que compreende mais de dois bilhões de pessoas, de todas as idades
e todas as nacionalidades no mundo, continua expandindo os tipos
de imagens produzidas e o alcance da sua distribuição.8 O aumento
do número de produções e das possibilidades de exibição irradia-se,
muito além da pequena área do mundo onde começou, e já chegou
nos cantos mais remotos, assim que essa “expansão” ulterior tem
um retorno, causando novas e indefinidas modalidades de reflexão e
interseção de olhares, na periferia e no centro.
Uma nova reviravolta surgiu em alguns filmes recentes, especificadamente a representação do “nós” para “nós”, por parte de um
“outro”. A mensagem é: “Assim é como nós vemos vocês. Podem
entender o que estamos dizendo?” Essa nova direção do olhar abriu
excitantes possibilidades. A simetria – ou seria melhor chamá-la
uma “assimetria espelhada”? – aparece no que historicamente foi
uma relação assimétrica. O “outro” agora nos aparece como o seu
próprio “outro”.
Em públicos mais reduzidos pode florescer uma troca de olhares
mútuos e o “outro”, sem acesso a nenhum recurso midiático,9 pode
melhor espelhar para “nós” o que nós mostramos para eles. Na reunião
de 2013, da American Anthropological Association, houve uma sessão
plenária intitulada “Re-imaginar a Educação: Incorporar a Cultura no
Curriculo”. Com a exceção de um quadro branco (referência direta à
maior parte dos instrumentos educacionais nos EUA), não era utilizado nenhum recurso midiático. Quatro simples cadeiras eram colocadas
Disponível em: <http://wwwinternetworldstats.com/stats.htm>.
Sherry Turkle, entrevistada por Bill Moyers. Disponível em: <http://billmoyers.
com/segment/sherry-turkle-on-being-alone-together/>.
8
9
108
Allison Jablonko
sobre uma plataforma, acima de um público de algumas centenas de
pessoas. As cadeiras substituíam o tradicional pódio do qual os usuais trabalhos de quinze minutos são normalmente apresentados. Um
moderador e três palestrantes sentavam-se confortavelmente nestas
cadeiras. As três mulheres e o homem provinham de um conjunto
minoritário no qual a identidade cultural e a necessidade de desenvolver o orgulho pessoal são por demais vezes ignoradas pelas pessoas.
A sessão começou com a performance de um poema de Malcom
London, com vinte anos e guia do grupo Young Chicago Authors.
Com o microfone na mão, de forma familiar, falou para o público de
acadêmicos, com surpresa: “por que vocês falam assim?” O seu acento
afro-americano e o movimento dialético colocavam agudamente em
discussão as questões levantadas pelo poema, ou seja, uma acusação
ao estilo acadêmico de falar e escrever. Ao longo da seguinte discussão
entre os palestrantes foi evidenciada a disjunção entre o pertencimento étnico e o sistema escolar público, nos USA. Utilizando pincéis
coloridos, cada um desenhava no quadro branco um diagrama que
ilustrava os elementos que faltavam e que poderiam ter conectado as
crianças a um amor pela aprendizagem e a uma sociedade mais ampla,
sem separá-las das ligações do seu ambiente familiar. Depois dessa
conversação pública, um grupo de seis estudantes afro-americanos
do segundo grau fechou a discussão com outro poema. Eles foram
agraciados com uma standing ovation por parte de um público, em
sua esmagadora maioria, branco. Pessoas com uma bagagem étnica e
educacional diferentes estavam, pelo menos por um momento, dando
um “olhar inverso” em direção a si mesmos.
Voltando às considerações sobre os olhares diretos, as performances e os olhares mediados pela câmara, encontramos todo tipo de
curiosidade. Edward T. Hall foi um dos primeiros pesquisadores que
realizou uma detalhada pesquisa da visão e do espaço. Ele mostrou que
o desconforto causado por uma violação inadvertida da privacidade
visual das pessoas pode ser observada, mas que a fonte do problema,
de imediato, não é consciente. O que pode ser adulatório em uma
sociedade pode ser ofensivo em outra. O que é permitido em uma
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
109
sociedade pode ser objeto de censura em outra. Uma olhar direto que
é considerato normal nos USA é considerato uma intrusão na Alemanha, onde se pressupõe não olhar diretamente os outros, quando em
público (Hall, 1966, p. 134). Tais disjunções são descobertas quando
as pessoas interagem na interface de sistemas contrastantes.
Uma interface institucional, em andamento, que foi desenvolvida
desde 1948, é o encontro de antropólogos, estudantes, diretores de
cinema e outros sujeitos que se juntam, anualmente, sob o apoio da
Society for Visual Anthropology nos EUA. Nesse período de cinco
dias, com um dia e meio de discussão dos trabalhos em andamento,
seguidos por três dias de visualização de trabalhos acabados, contínuas
discussões e práticas são examinadas pelos vários protagonistas.10 Ao
longo dos anos, este encontro cara a cara, durante o qual as mídias
em discussão estão diretamente nas mãos (nos olhos), tem gerado
uma mais clara compreensão das teorias e práticas que estão na base
de um sensível uso antropológico das mídias para a documentação e,
possivelmente, para ligar disjunções.11
Um recente exemplo de filme, que brincou com as disjunções entre
duas formas de “olhar”, emerge do trabalho de Abbie Reese. Nos
últimos oito anos, Reese tem colaborado com uma jovem mulher que
entrou em uma ordem religiosa de clausura para se tornar freira.12
Colocando em ação a minha filosofia de co-produção e autoridade compartilhada (e porque ela é mais sofisticada visualmente do que articulada
verbalmente), emprestei a Irma Agnese uam câmara assim que ela pudesse
documentar a cultura material do monastério, realizar vídeos cotidianos
e gravar impressionisticas imagens em movimento.13
Disponível em: <http://societyforvisualanthropology.org/>.
O recente livro de Mrione Crowder é uma excelente introdução e um sobrevoo
dos muitos temas em discussão.
12
Disponível em: <http://ukcatalogue.oup.com/product/9780199947935.do>.
13
Disponível em: <http://societyforvisualanthropology.org/?page_id=1927>.
10
11
110
Allison Jablonko
Ao longo do filme, Irmã Agnese reflete sobre as transformações no
seu uso da visão, no interior da comunidade de membros que praticam
conscientemente “A Disciplina dos Olhos”.14
Em contraponto à pesquisa de Reese, com um grupo que é distante
das correntes formas midiáticas, minha pesquisa de campo, em 1963,
levou-me a uma área da Papua Nova Guiné, onde as fotografias que
realizamos eram as primeiras mídias que a população local tinha
visto. Os quatro estudantes e o professor da Columbia University
trabalhavam em uma documentação geral da vida cotidiana, com uma
ênfase nas crianças.15 No mundo Maring das encostas das Bismarck
Mountains, as crianças eram onipresentes, constituindo uma mais o
menos rumorosa parte de qualquer cena cotidiana. Na área, não havia a escola para desviá-los do aprender as competências que seriam
necessárias para levar em frente a vida de horticultores e caçadores de
seus parentes. Aprendiam observando e, quando fossem um pouco
mais velhos, fazendo. Aprender observando? Este era o pano de fundo
perfeito para um antropólogo afinar as suas competências de aprender
observando e para documentar o que viamos através da câmera.
Isso não que dizer que toda e qualquer coisa na vida Maring fosse
aberta ao olhar público. Nenhuma pessoa do sexo feminino (moça ou
mulher) era autorizada no interior das casas dos homens, e no mato
havia alguns lugares nos quais os casais, ao longo do namoro, podiam
se retirar, para longe dos olhares indiscretos dos anciões. Mas, para as
pessoas presentes a um evento, o olhar não tinha restrições.
Os antropólogos eram parte do grupo – simultaneamente observando e sendo subjetivados pela troca de olhares com os outros.
Em outra subcultura, utiliza-se uma expressão parecida: “disciplina do olhar” é
um lema do futebol americano. Disponível em: <http://www.urbandictionary.com/
define.php?term=Eye%20Discipline>.
15
Mead foi uma das consultoras da expedição da Columbia University para o
estudo da Ecologia Humana na Floresta Pluvial da Papua Nova Guiné. D. Carleton
Gajdusek, como parte de uma pesquisa sobre o crescimento da infância e o desenvolvimento, abaixo assinou a compra de uma parte dos 16mm que foram utilizados
e o desenvolvimento do acervo como um todo. Essa coleção está hoje no Curtin
Institute de Perth, Austrália.
14
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
111
Com a ajuda das nossas câmaras, passávamos além de algumas convenções do olhar que nos eram instiladas pelas nossas sociedades
natais. Aceitávamos olhares prolongados de muitas pessoas que não
conhecíamos e permitíamos aos nossos olhos demorar mais do que
teríamos feito em um ato de interação que, se tivesse acontecido na
nossa própria sociedade, teríamos, tranquilamente, simplesmente ou
inconscientemente, ignorado.
Talvez os Maring de hoje, parte dos quais ainda vive em assentamentos urbanos ou semiurbanos, tem desenvolvido novas formas
de entrecruzar olhar e espaço, protegendo-se a si mesmos de novas
formas intrusivas de observar e, mais importante, desenvolvido olhares
recíprocos que podem penetrar as muitas vezes insensíveis presenças
dos visitantes. Um exemplo de uma primeira fase dessa transformação
do olhar pode ser encontrada no filme de 1988 Cannibal Tours, de
Dennis O’Rourke. A história que o diretor nos conta levaria o observador a crer que a maior parte dos locais (habitantes da área Sepik
da Papua Nova Guiné) sentiriam de não ter sido propriamente vistos
ou compreendidos pelos italianos, alemães e americanos, visitantes
de uma proposta turístico internacional. O filme mostra o quanto é
difícil entrar nas perspectivas fixas das mentes dos estrangeiros que,
fascinados pelo fato de que o homem com quem estão conversando
poderia ter comido carne humana no passado, dificilmente reparam
que ele tem dificuldades para ganhar o dinheiro para pagar as taxas
escolares dos filhos.
Em 2005, Daniela Vavrova começou um filme interativo de
pesquisa dos Ambonwari da área Sepik. Seguida em 2007 e 2008, a
pesquisa culminou em 2011, com a exibição pública, nas aldeias, dos
vídeos realizados por Vavrova e daqueles realizados pelos moradores
das aldeias, e de uma variada coleção de filmes comerciais ocidentais.
Um amplo espetro de respostas a estas imagens abriu-se, ao longo dos
meses de discussões, revelando em um nível mais profundo a interface
cultural entre o antropólogo europeu e o morador da Nova Guiné:
Através das perguntas e das respostas, assim como através do silêncio,
percebi que as projeções e os filmes visionados começaram uma troca
112
Allison Jablonko
entre diferentes cosmologias e a criaram novas intersubjetividades. (Vavrova, 2014, p. 26)
Tais estudos, levados a frente durante anos, são difíceis de compartilhar em toda a profundidade com os outros, além de conectar
indivíduos. O público ocidental pode ser impactado por filmes brilhantes e que batem duramente como aquele de O’Rourke, mas, para
que sua consciência amadureça em uma compreensão mais profunda
de histórias fundadas, como fez Vavrova, em “diferentes cosmologias”,
essa dramática afirmação poderia ser completada pela iluminação
exemplificada pela gentil aproximação de Meghna Gupta, no seu
filme de 2012, Unravel. Mesmo que nunca tenhamos encontrado a
diretora, sentimos a sua presença na abertura com a qual a protagonista, Reshma, que Gupta felizmente escolheu, por o seu encanto e
bom humor, conversa com a câmara. A visão do “nós” de Reshma,
destinada a um público internacional, é oblíqua, não fala do encontro
direto, mas através da interação com as nossas roupas descartadas.
Através do filme, aprendemos sobre a dura indústria indiana, que
transforma os descartes europeus e americanos em novas fibras.
Ao mesmo tempo, somos levados a entender como poderíamos ser
percebidos por “outros” distantes. O filme captura esse encontro de
olhares, narrando-o, de uma maneira irônica e não agressiva, que faz
nos baixar a guarda e dispara um interrogar-se de uma consciência.
Como as mídias abriram-se nos últimos 150 anos, os tipos de
histórias que nos narramos a nós mesmos e aos outros, sobre “nós”
e “eles”, foram se diversificando. O papel do narrador não é mais
controlado por poucos. Os ouvintes tornam-se os narradores; os observadores viram ser os produtores de imagens. Em múltiplas telas,
grandes e pequenas, em companhia ou em solidão, cada pessoa pode
ser um autor e um espectador da própria história e espectador/interlocutor das histórias das outras pessoas. Aquele de nós que provém
de sociedades onde “não é educado olhar” pode demorar no observar. Mais ainda, seja por que as mídias têm dado aos observadores
maiores possibilidades, as disciplinas do olhar estão sendo modeladas
de novas formas. Nas movimentadas estradas urbanas aprendemos a
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
113
não olhar as pessoas nos olhos, se não estamos prestes a começar uma
interação com elas. Essa mesma lição poderia ser aplicada à estrada
em expansão do mundo das mídias. Os festivais cinematográficos são
um dos lugares onde esses assuntos podem ser pensados seriamente e
novas práticas debatidas e elaboradas. O Festival “Contro-Sguardi”
é chamado especialmente para cumprir essa tarefa.
114
Allison Jablonko
> Os membros do grupo da Columbia University trabalhando. Cherry Lowman
Vayda, marek Jablonko e Mbana ao longo da preparação de uma festa Maring/
I membri del gruppo della Columbia University al lavoro. Cherry Lowman Vayda,
Marek Jablonko e Mbana durante la preparazione di una festa Maring
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
> Um homem apresenta-se com orgulho ao olhar dos seus coetâneos/
Un uomo si presenta con orgoglio allo sguardo dei suoi coetanei
115
116
Allison Jablonko
> Um grupo de indivíduos em uma dança de clan apresentam-se aos outros grupos,
enquanto as mulheres e as crianças observam/Un gruppo di individui in una danza
di clan presentano se stessi agli altri gruppi, mentre le donne e i bambini osservano
Olhares compartilhados e troca de visões: histórias de “nos” e “eles”
> Algumas mulheres, vestidas elegantemente, observam os dançarinhos e conversam
entre elas com alegria. Elas observam a disposição dos dançarinhos enquanto
apresentam-se aos outros/Alcune donne, vestite elegantemente per l’occasione,
osservano i danzatori che passano e chiacchierano allegramente tra loro. Esse osservano
la disposizione dei ballerini mentre presentano se stessi allo sguardo altrui
> Olhares trocados, interessados e cruzados em todo momento/
Sguardi scambiati, interessati e intersecati in ogni situazione
117
118
Allison Jablonko
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
119
Incentivato dal senso dell’avventura e dalla curiosità su “l’altro”, il
viaggio è stato parte della vita umana fin dal nostro inizio – il viaggio
ed il desiderio di portare a casa “alla nostra gente” le storie di ciò
che si è visto e sentito. Come le rappresentazioni visuali sono state
aggiunte ai tradizionali racconti orali faccia a faccia, le immagini
(disegni, pitture) e le parole scritte fissano le storie nel tempo. Con
l’avvento della fotografia durante il XIX Secolo, queste relativamente
permanenti rappresentazioni sono aumentate di numero. La fotografia si è espansa ad includere non solo scatti dei parenti in viaggio o
di esotici “nativi” incontrati in luoghi lontani, ma anche ritratti dei
membri della famiglia che risiedono e lavorano in mondi lontani da
casa. Poi la fotografia si è espansa alle immagini in movimento, prima
nel film e quindi nel video. A ogni cambiamento della tecnologia, la
composizione del gruppo degli osservatori è aumentata dalle piccole
e intime riunioni familiari alla grande platea dei cinema pubblici1, la
maggior parte (se non tutti) i membri della quale non hanno alcuna
personale connessione con gli autori delle immagini o con le persone
rappresentate.
L’inquadratura predominante delle storie raccontate è stata nei
termini di “noi e loro”, se non perfino “noi versus loro”. Il “noi” sono
coloro che raccontano, che vedono, i testimoni, mentre “loro” sono
“gli altri” che osserviamo – con interesse, forse apprezzandoli, ma,
troppo spesso, con un pizzico di disprezzo o sdegno e una scarsa at-
Il più grande cinema con un solo schermo al mondo era allora il Gaumont Palace a Parigi, in Francia, con una capacità di 6.420. Il Palace è stato chiuso nel 1970.
1
120
Allison Jablonko
tenzione nel capire le strutture delle differenze che troviamo intriganti
e inquietanti. Nel corso del secolo passato, gli antropologi, lavorando
con immagini fisse ed in movimento, hanno cercato di sbaragliare
questa deprecabile inclinazione2. Le etnografie venivano scritte e i
film documentari prodotti nel tentativo di comunicare a “noi”, come
osservatori, una più profonda comprensione di eventi e persone non
familiari. I luoghi di presentazione – scuole, Festival cinematografici3
e cinema – così come gli autori di queste storie degli “altri” erano
ancora largamente inseriti nel “nostro” mondo. Le storie su di “loro”
venivano fatte da “noi” e dirette a “noi”.
Dalla metà del XX Secolo la situazione è progressivamente cambiata. Una serie di antropologi hanno lavorato a stretto contatto con gli
informatori e i film-makers – in alcuni casi un singolo direttore maneggiando sia la telecamera che il microfono, in altri casi una squadra per
un film con direttore, regista e microfonista separati. Un antesignano
esempio di queste squadre filmiche di una persona è il progetto di
Timothy Asch con l’antropologo Napoleon Chagnon tra gli indigeni
Yanomami delle foreste del Sudamerica, che è confluito in un film
di 39 minuti, lanciato e editato tra il 1968 e il 1975. Da allora in poi,
Asch ha lavorato con la moglie Pasty, collaborando con vari antropologi in Indonesia. La collaborazione degli Asch con Linda Connor è
cominciata grazie ad un film con un’unica ripresa che documentava
nel 1970 il processo in cui Connor e la sua informatrice Jero Tapakan
analizzavano con cura il precedente film A Balinese Transe Séance. Nel
film del 1970, Jero Tapakan, una curatrice tradizionale, rispondeva alle
domande di Connor e spiegava i suoi procedimenti e le sue esperienze
Si vedano Lutz e Collins (1993) per una dettagliata analisi del pubblico e delle
fotografie nel giornale americano National Geographic. I capitoli 7 e 8 sono specialmente interessanti.
3
I maggiori Festival cinematografici etnografici del XX Secolo che ancora continuano sono: Festival dei Popoli (Firenze, 1959), Margaret Mead Film Festival (New
York, 1976), Cinéma du Réel (Parigi, 1978), Bilan du Film Ethnographique (Parigi, 1982), Royal Anthropological Institute (U.K., 1985), Goettingen International
Ethnographic Film Festival (1993).
2
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
121
nel curare come documentate nel suo primo film. Questo secondo film,
Jero on Jero: “A Balinese Trance Séance” Observed, è esplicitamente
una doppia storia: quella dell’interazione tra l’antropologa e la sua
informatrice, e la storia di uno specifico episodio di cura.
Un esempio di progetti portati avanti con una squadra maggiore è
la documentazione delle pratiche di iniziazione maschile del popolo
Baruya delle Eastern Higlands della Papua Nuova Guinea. Toward
Baruya Manhood (1973) e Baruya Muka Archival (1992) sono stati
creati da una squadra composta dall’antropologo francese Maurice
Godelier, una equipe di tre persone del Australia Film dirette da Ian
Dunlop e i Baruya della Wonenara Valley. Il progetto è cominciato
nel 1969, sei mesi dopo che io e mio marito avevamo lavorato con
Godelier per creare una registrazione visuale delle interazioni tra lui
e i suoi informatori Baruya (Jablonko 1982, 1998). Il gruppo di Australia Film è giunto in tempo per filmare le cerimonie della seconda,
terza e quarta parte dell’iniziazione maschile. Il montaggio è stato
realizzato in Australia e l’editing è stato fatto usando un senso Baruya
della durata. Dunlop si rifiutò di ritagliare il materiale in un formato
convenzionale per la visione internazionale, permettendo invece al
prodotto finito di girare in nove corti che sommavano un totale di
sette ore e mezza – troppo lungo per ogni normale film etnografico.
Questa serie è stata conclusa nel 1972. Nel 1979 la prima parte dell’iniziazione è stata celebrata, e nuovamente Dunlop con la squadra
di cameraman e soundman incontrò Godelier. Le diciassette ore di
riprese, realizzate in un periodo rituale di oltre quattro settimane,
furono portate a Port Moresby dove Godelier e Dunlop lavorarono
per altre quattro settimane con il linguista che aveva trascritto la
lingua Baruya4. Loro furono accompagnati da sette uomini Baruya
che attraversavano ogni scena, fornendo dettagliate spiegazioni. Il
progetto fu finalmente completato e editato nel 1991 in un video
di 27 parti per un totale di trenta ore e mezza. A causa della natura
rituale di molte delle immagini, i Baruya stipularono un accordo che
4
Dick Lloyd del Summer Institute of Linguistics.
122
Allison Jablonko
nessuno di questi film sarebbe stato portato in Papua Nuova Guinea,
dove donne e uomini non iniziati avrebbero potuto assistervi. Così, la
registrazione storica della società Baruya degli anni Settanta esiste per
il limitato pubblico dei Baruya iniziati e per gli studenti della società
esterna ai Baruya – un molto specifico “noi” e “loro”.
Nel 1985, Terence Turner, che lavorava con i Kayapó nelle regioni
del Pará e del Mato Grosso in Brasile , è stato uno dei primi antropologi a mettere direttamente la telecamera nelle mani delle persone5
(Turner, 2003). Il film che ne è risultato è stata una dichiarazione
diretta dai Kayapó al resto del mondo, ed era parte di una effettiva
campagna per fermare la costruzione di una centrale idroelettrica
che avrebbe inondato una buona parte del loro territorio. Lo strumento visuale nelle mani di gruppi minoritari ha dimostrato di essere
potente nel comunicare i messaggi indigeni ai governi nazionali. Le
carte erano cambiate. Gli “altri” adesso stavano raccontando le loro
storie a “noi”. Il “noi” non era più l’unico canale per la produzione
e distribuzione di storie degli altri6. Alle rappresentazioni di “loro
secondo noi” erano da aggiungersi le rappresentazioni “loro secondo
loro”, lanciando questo messaggio: “Così è come siamo veramente!
Così è come vogliamo che voi ci vediate!”7.
Questa nuova direzione dello sguardo è giunta in un momento
della storia in cui i media hanno esteso la comunicazione molto oltre
i più rosei sogni di coloro di noi che, nella metà del XX Secolo, hanno
lavorato per documentare le diverse maniere di vivere che speravamo
Terence Turner è professore di antropologia alla Cornell Unversity. Egli è stato
molto coinvolto con i diritti umani e con le attività di supporto agli indigeni in
Sudamerica, lavorando al Ethics Comitee della American Anthropological Association dal 1969 al 1972, guidando la Special Commission della AAA per studiare
la situazione degli Yanomami nel 1991. Si vedano: http://www.publicanthropology.
org/Yanomami/Turner.htm e http://www.comminit.com/?q=media-development/
node/1638
6
Un altro esempio sono i documentari filmati da Alan Ereira tra i Kogi della
Colombia nel 1990.
7
http://www.wild.org/main/how-wild-works/wild-in-action-worldwide/kayapo/
kayapo-culture-and-history/
5
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
123
persistessero, pur sapendo che il cambiamento era tuttavia in corso. I
film che abbiamo fatto allora venivano guardati da un ristretto pubblico principalmente in spazi accademici o nei teatri del cinema artistico.
La più ampia distribuzione era attraverso la televisione educativa.
L’odierno complesso degli utenti dei media visuali, che comprende più
di due miliardi di persone di tutte le età e nazionalità nel mondo e che
ha raggiunto per una singola comunicazione visuale (ammettiamolo,
non di un film etnografico!) il miliardo, continua ad espandere il tipo
di immagini prodotte e il raggio della loro distribuzione8. L’aumento
nel numero delle produzioni e delle possibilità di visione si irradia
ben oltre la piccola area del mondo dove è cominciata e ha ora raggiunto gli angoli più lontani, così che questa “espansione” ulteriore
rimbalza indietro, causando indefinite nuove modalità di riflessione
e intersezione di sguardi nella periferia e nel centro.
Una nuova svolta, così, è apparsa in alcuni film recenti, specificatamente la rappresentazione del “noi” per “noi” da parte di “un altro”.
Il messaggio è: “Così è come noi vi vediamo. Puoi capire cosa ti stiamo
dicendo?”. Questa nuova direzione dello sguardo ha aperto eccitanti
possibilità. La simmetria –o sarebbe meglio chiamarla una “asimmetria
rispecchiata”? – appare in ciò che storicamente è stata una relazione
asimmetrica. L’“altro” ora ci appare come il suo proprio “altro”.
In pubblici più ridotti, può fiorire un reciproco scambio di mutui
sguardi e l’“altro”, senza accesso ad alcuna risorsa mediatica9, può
meglio rispecchiare a “noi” ciò che noi appariamo a loro. Alla riunione
del 2013 della American Anthropological Association, c’è stata una
sessione plenaria intitolata “Re-immaginare l’Educazione: Incorporare
la Cultura nel Curriculum”. Con l’eccezione di una lavagna bianca (un
riferimento diretto alla maggior parte degli strumenti educazionali negli USA), non veniva utilizzato nessun media. Invece, quattro semplici
sedie erano sistemate su una piattaforma al di sopra di un pubblico
http://wwwinternetworldstats.com/stats.ht
Sherry Turkle intervistata da Bill Moyers: http://billmoyers.com/segment/sherry-turkle-on-being-alone-together/
8
9
124
Allison Jablonko
di qualche centinaio di persone. Le sedie sostituivano il tradizionale
podio da cui gli usuali lavori da quindici minuti vengono normalmente
letti. Un moderatore e tre conferenzieri sedevano confortevolmente
sulle sedie. Le tre donne e un uomo provenivano da un background
minoritario in cui l’identità culturale e la necessità di sviluppare
l’orgoglio personale sono troppo spesso ignorati dai più. La sessione
cominciò con la performance di un poema di Malcom London, ventenne guida del gruppo Young Chicago Authors. Reggendo in maniera
familiare un microfono in mano, ha parlato al pubblico di accademici
con sorpresa: “Perché parlate così?”. La sua parlata afro-americana
e il movimento dialettico hanno messo acutamente in discussione le
questioni sollevate dal poema, ossia l’accusa allo stile accademico
nel parlare e nello scrivere. Nel corso della seguente discussione tra
i conferenzieri, è stata sottolineata la disgiunzione tra l’appartenenza
etnica e il sistema scolastico pubblico negli USA. Usando dei pennarelli
colorati, ognuno disegnava sulla lavagna bianca un diagramma che
illustrava gli elementi mancanti che avrebbero potuto connettere i
bambini ad un amore per l’apprendimento e ad una società più ampia
senza separarli dai legami del loro ambiente familiare. Dopo questa
conversazione pubblica, un gruppo di sei studenti delle superiori
afro-americani hanno portato a termine la discussione con un altro
poema. Sono stati ringraziati con una standing ovation da parte di un
pubblico a schiacciante maggioranza bianco. Persone con un bagaglio
etnico ed educativo diverso stavano, almeno per un momento, dando
un diretto “sguardo inverso” a se stessi.
Tornando alle considerazioni degli sguardi diretti alla performance
e gli sguardi mediati dalla telecamera alla performance, incontriamo
ogni sorta di curiosità. Edward T. Hall è stato uno dei primi ricercatori
a realizzare un dettagliato studio sulla visione e lo spazio. Egli trovò
che lo sconforto causato da una inavvertita violazione della privacy
visuale delle persone può essere notata, ma la fonte del problema non
è consapevole nell’immediato. Ciò che può essere adulatorio in una
società può essere offensivo in un’altra. Ciò che viene concesso in una
società può essere oggetto di censura in un’altra. Un’osservazione
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
125
pubblica che viene considerata normale negli USA è considerata intrusiva in Germania dove si presuppone di non guardare direttamente
gli altri pubblicamente (Hall, 1966: 134). Tali disgiunzioni vengono
scoperte quando le persone interagiscono nell’interfaccia tra sistemi
contrastanti.
Un’interfaccia istituzionale in corso che è stata sviluppata dal
1948 è l’incontro di antropologi, studenti, registi e altri soggetti che
arrivano assieme annualmente al di sotto del cappello del Society for
Visual Anthropology negli USA. In un periodo di cinque giorni con
un intenso giorno e mezzo di discussione di lavori in corso, seguiti
da tre giorni di visualizzazione di lavori finiti, continue questioni etiche e pratiche vengono esaminate dai vari protagonisti10. Nel corso
degli anni questo incontro faccia a faccia durante il quale i media in
discussione sono direttamente alla mano (negli occhi) ha generato una
più chiara comprensione delle teorie e pratiche che stanno alla base
di un sensibile uso antropologico dei media per la documentazione
e, possibilmente, per collegare disgiunzioni11.
Un esempio recente di film che ha giocato sulle disgiunzioni tra
due maniere di “guardare” emerge dal lavoro di Abbie Reese. Negli
ultimi otto anni Reese ha collaborato con una giovane donna che è
entrata in un ordine religioso di clausura per divenire una suora12.
Mettendo in atto la mia filosofia di coproduzione e autorità condivisa (e
perché lei è più sofisticata visualmente che articolata verbalmente), ho
prestato a Sorella Agnese una videocamera così che lei potesse documentare la cultura materiale del monastero, realizzare video quotidiani
e registrare impressionistiche immagini in movimento13.
http://societyforvisualanthropology.org/
Il recente libro di Marion e Crowder è un’eccellente introduzione e un sorvolo
di molti temi in discussione.
12
http://ukcatalogue.oup.com/product/9780199947935.do
13
http://societyforvisualanthropology.org/?page_id=1927
10
11
126
Allison Jablonko
Nel corso del film, Sorella Agnese discute i cambiamenti nel suo
uso della visione all’interno della comunità i cui membri praticano
coscientemente “The Discipline of the Eyes”14.
In contrappunto con la ricerca di Reese con un gruppo che è
lontano dall’uso delle correnti forme mediatiche, la mia ricerca sul
campo nel 1963 mi ha portato in un’area della Papua Nuova Guinea
dove le fotografie che abbiamo realizzato erano i primi media che la
popolazione locale avesse mai visto. In quanto una dei quattro studenti più il professore della Columbia University, stavo lavorando ad
una documentazione generale della vita quotidiane con un’enfasi sui
bambini15. Nel mondo Maring dei versanti delle Bismarck Mountains,
i bambini erano onnipresenti, una più o meno rumorosa parte di
ogni scena quotidiana. Non c’era la scuola nell’area per distoglierli
dall’apprendere le competenze che sarebbero state loro necessarie per
portare avanti la vita orticola e di caccia dei loro genitori. Imparavano
osservando e, quando sarebbero stati un po’ più vecchi, facendo.
Imparare osservando? Questo era lo scenario perfetto per un antropologo per affinare le sue competenze ad imparare osservando e per
documentare ciò che vediamo con la telecamera.
Questo non vuol dire che ogni cosa nella vita Maring fosse aperta
allo sguardo pubblico. A nessuna persona di sesso femminile (ragazza
o donna) era permesso l’ingresso nelle case degli uomini, e c’erano
posti nella foresta in cui le coppie, durante il corteggiamento, potevano ritirarsi dagli sguardi indiscreti degli anziani. Ma per le persone
presenti ad un evento, guardare non aveva restrizioni.
Un’altra sub-cultura utilizza un’espressione simile: “disciplina dell’occhio”
è un concetto nel Football americano: http://www.urbandictionary.com/define.
php?term=Eye%20Discipline
15
Mead è stata una delle consulenti della spedizione della Columbia Unversity
per lo studi dell’Ecologia Umana della Foresta Pluviale della Nuova Guinea. D.
Carleton Gajdusek, come parte di uno studio sulla crescita dell’infanzia e lo sviluppo, sottoscrisse l’acquisto di una parte dei 16mm. che sono stati usati e lo sviluppo
dell’archivio come un tutto. Questa collezione è ora al Curtin Institute di Perth,
Australia.
14
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
127
Gli antropologi erano parte del gruppo – simultaneamente osservando e venendo soggettivati dallo scambio di sguardi e occhiate con
gli altri. Con l’aiuto delle nostre telecamere, passavamo oltre alcune
delle convenzioni dello sguardo che ci erano instillate dalle nostre
società natali. Accettavamo sguardi prolungati di molte altre persone
che non conoscevamo e permettevamo ai nostri occhi di soffermarsi
più a lungo di quanto non avremmo fatto in un atto di interazione
che, se fossero avvenuti nella nostra propria società, avremmo potuto
tranquillamente, o più semplicemente inconsciamente, ignorare.
Forse i Maring di oggi, una parte dei quali vive in insediamenti
urbani o semi-urbani, hanno sviluppato nuovi modi di intrecciare
sguardo e spazio, proteggendo se stessi da nuove intrusive forme
di osservare e, più in particolare, sviluppato reciproci sguardi che
possono penetrare le spesso insensibili presenze dei visitatori. Un
esempio di una prima fase di questa trasformazione dello sguardo si
può ritrovare nel film del 1988 Cannibal Tours di Dennis O’Rourke.
La storia che il regista ci racconta porterebbe l’osservatore a credere
che la maggior parte dei locali (abitanti dell’area Sepik della Papua
Nuova Guinea) sentirebbero di non essere stati propriamente visti
o compresi da italiani, tedeschi e americani, visitatori di un villaggio
turistico internazionale. Il film mostra quanto sia difficile penetrare
le prospettive fisse nelle menti degli stranieri che, affascinati dal fatto
che l’uomo con cui stanno parlando potrebbe aver mangiato carne
umana in passato, scarsamente notano che lui ha difficoltà a trovare
i soldi per pagare le tasse scolastiche dei figli.
Nel 2005, Daniela Vavrova ha cominciato un film interattivo di
studio degli Ambonwari dell’area Sepik. Continuato nel 2007 e il 2008,
lo studio è culminato nel 2011 con l’esibizione pubblica nei villaggi
dei video realizzati da Vavrova, di quelli realizzati dagli abitanti dei
villaggi, e di una variegata collezione di film commerciali occidentali.
Un ampio spettro di risposte a queste immagini si dischiusero nei
mesi di discussioni, rivelando ad un livello più profondo l’interfaccia
culturale tra l’antropologo europeo e l’abitante della Nuova Guinea:
128
Allison Jablonko
Attraverso le domande e le risposte, così come attraverso il silenzio, ho
realizzato che le proiezioni e i film visionati hanno cominciato a iniziare
uno scambio tra differenti cosmologie e a creare nuove intersoggettività
(Vavrova, 2014: 26).
Tali studi, portati avanti per anni, sono difficili da condividere
con gli altri in tutta la loro profondità del connettere gli individui. Il
pubblico occidentale può essere scosso nella consapevolezza da film
brillanti che colpiscono duro come quello di O’Rourke, ma, perché
questa consapevolezza maturi in una comprensione più profonda di
storie fondate, come ha fatto Vavrova, su “differenti cosmologie”, la
drammatica affermazione potrebbe essere completata dall’illuminazione esemplificata dal gentile approccio di Meghna Gupta nel suo
film del 2012, Unravel. Nonostante non abbiamo mai incontrato la
regista, sentiamo la sua presenza nell’apertura con cui la protagonista,
Reshma, che Gupta ha felicemente scelto per il suo incanto e buon
umore, chiacchera con la telecamera. La visione di “noi” di Reshma,
desinata a un pubblico internazionale, è obliqua, non parla dell’incontro diretto, ma attraverso l’interazione con i nostri vestiti scartati.
Attraverso il film impariamo a conoscere la dura industria indiana
che trasforma gli scarti europei e americani in nuove fibre. Allo stesso
tempo, siamo attratti dal modo in cui potremmo essere percepiti da
“altri” distanti. Il film cattura questo incontro di sguardi, raccontandolo in una maniera ironica e non aggressiva che ci fa abbassare la
guardia e innesca interrogativi e consapevolezza.
Come i media si sono aperti negli ultimi 150 anni, i tipi di storie
che noi raccontiamo a noi stessi e agli altri, su “noi” e “loro”, sono
variegate. Il ruolo del narratore non è più controllato da pochi. Gli
ascoltatori divengono i narratori; gli osservatori divengono produttori
di immagini. In multipli schermi, grandi e piccoli, in compagnia o in
solitudine, ogni persona può essere un autore e uno spettatore della
propria storia e spettatore/interlocutore delle storie delle altre persone. Quelli di noi che provengono da società dove “non è educato
guardare” possono indulgere nell’osservare. Ancora, proprio perché
i media hanno dato agli osservatori maggiori possibilità, le discipline
Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
129
del guardare vengono modellate in nuove maniere. Nelle movimentate
strade urbane apprendiamo a non guardare le persone negli occhi se
non siamo in procinto di cominciare un’interazione con loro. Questa
stessa lezione potrebbe essere applicata alla “strada” in espansione
del mondo dei media. I festival cinematografici sono uno dei luoghi
dove questi argomenti possono essere pensati seriamente e nuove
pratiche discusse e elaborate. Il Festival “Contro-Sguardi” è chiamato
soprattutto ad assolvere a questo compito.
130
Allison Jablonko
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Sguardi condivisi e scambi di visioni: storie di “noi” e “loro”
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132
Paride Bollettin
Tullio Seppilli
Sul e magia: pesquisa etnográfica
e cinema documentário sobre
o Mezzogiorno da Itália, no
segundo pós-guerra
Sud e Magia
Ricerca Etnografica e Cinema
Documentario sul Mezzogiorno
d’Italia nel Secondo Dopoguerra
Sul e magia: pesquisa etnográfica e cinema documentário
133
Nos anos do segundo pós-guerra, manifestou-se na Itália uma
verdadeira “renascença” das ciências humanas1.Como se sabe, a velha
pesquisa antropológica e sociológica, no período pós-positivista, que
tinha alcançado posições de grande relevo nos últimos 30 anos do
século XIX, já tinha entrado numa crise profunda na época da primeira
guerra mundial. E a sua superação tinha acontecido na chave de um historicismo marcadamente idealístico e baseado em uma concepção da
história como somente história ético-política das classes hegemônicas.
Texto originalmente publicado em: Sud e magia. Ricerca etnografica e cinema
documentario sul Mezzogiorno d’Italia nel Secondo dopoguerra, «La Ricerca Folklorica. Contributi allo studio della cultura delle classi popolari» (Brescia), n. 8, ottobre
1983 (número dedicado à La medicina popolare in Italia, a cura de Tullio Seppilli),
p. 109-110. O texto aqui publicado em sua versão original fazia parte da introdução – Sud et magie. Recherche ethnographique et cinéma documentaire sur le Midi
de l’Italie après la Seconde guerre mondiale. Introduction à la Séance “Sud et magie.
Films documentaires italiens inspirés de la recherche d’Ernesto de Martino (19591971)”, Firenze, Istituto Italiano per il Film di Documentazione Sociale, aprile 1980,
7 p. – ao homônimo programa de projeções e discussões de documentários, sobre as
formas de proteção mágico-religiosa na Itália meridional, organizado pelo Festival
de Popoli, no dia de Abertura da segunda edição da resenha “Cinéma du réel. Festival international du film ethnographique et sociologique”, realizado em Paris, no
Centre George Pompidou, entre os dias 12 e 20 de abril de 1980. No âmbito de
tal programação, oficialmente apresentada pelos organizadores da resenha como
uma noite de Hommage au Festival des Peuples, no aniversário de vinte anos de seu
surgimento, foram apresentados os seguintes documentários: Nascita e morte nel
Meridione de Luigi Di Gianni (1959), La passione del grano de Antonio Michetti
(1960), La taranta de Gianfranco Mingozzi (1961), Il male di San Donato de Luigi
Di Gianni (1965), I Fujenti de Gabriele Palmieri (1967), L’attacèatura de Luigi Di
Gianni (1971) e La possessione de Luigi Di Gianni (1971).
1
134
Tullio Seppilli
Assim, isso se traduziu, de fato, na obliteração do interesse pelas análises das classes subalternas e, ao mesmo tempo, em uma substancial
recusa das pesquisas empíricas “sobre o presente”. Posteriormente,
a queda de setores inteiros de pesquisa e o envolvimento ideológico
de alguns outros foram cientemente buscados por um regime, como
aquele fascista, que tinha fundado, nos mitos da descendência e da
raça e da mistificação da história e da realidade do país, a própria
política de controle e organização do consenso.
Assim, para muitos jovens intelectuais italianos, a Liberação abriu
dramaticamente o problema da descoberta da verdadeira realidade
do país, e ao mesmo tempo a questão da descoberta de quanto havia
sido produzido, nesse tempo, em outros países – em termos cognitivos
e metodológicos – pelas múltiplas disciplinas que põem no bojo da
própria análise a condição do homem e da sociedade.
Foi este o começo de um longo e difícil percurso. A aquisição dos
novos temas e das novas ferramentas de pesquisa, sua revisão teóricometodológica, sua validação crítica em uma sociedade, como aquela
italiana, dilacerada por contradições profundas e por extensos e diferentes fenômenos de rápida transformação, foram todas operações
que se chocavam inevitavelmente com grandes dificuldades, objetivas
e subjetivas, e com grandes resistências, de várias faces. Isso apesar
que todo o grande desenvolvimento do conhecimento científico dos
processos sociais, e a constituição de estruturas institucionais adequadas a produzi-lo, não possam não incidir de alguma forma sobre os
precedentes equilíbrios intelectuais e políticos e, em geral, sobre as
relações de classe, hegemonia e poder.
Não foi certamente por um acaso que a renascida pesquisa antropológica italiana começou a se preocupar, então, com as condições de
vida e as formas culturais tradicionais das classes rurais subalternas,
na área mais marginalizada pelos grandes processos de modernização
do país: o Mezzogiorno2 (onde, por outro lado, aconteceram também,
nesses mesmos anos, mas em uma lógica totalmente autônoma, pe-
2
Forma de se referir ao sul da Itália [n.d.t.].
Sul e magia: pesquisa etnográfica e cinema documentário
135
squisas de antropólogos estrangeiros, na maioria norte-americanos,
descendentes de alguns dos velhos emigrantes meridionais, mas
também de franceses e de outras nacionalidades).
Aqui, de fato, foi mais fácil a intersecção do novo pensamento
antropológico com as experiências anteriores de pesquisa folclórica e
com a problemática que tinha sido própria das grandes escolas “meridionalistas”, desde o fim do século XIX. E aqui puderam encontrar
uma significativa mediação, no espaço aberto naqueles mesmos anos,
e com grande relevo, por uma produção escrita original, meio a meio
entre a pesquisa e o memorial, que teve, como mais significativos protagonistas, homens como Carlo Levi, Rocco Scotellaro e Danilo Dolci.
No âmbito do renascer de uma reflexão e de uma pesquisa antropológica, na Itália do segundo pós-guerra, encontra-se sem dúvida a
figura de Ernesto de Martino (1908-1965). Levado pelo seu intenso e
conturbado percurso que, saindo de uma matriz idealístico-crociana,
ampliou o horizonte da reflexão historicista ao “mundo primitivo”,
às civilizações “outras”, na perspectiva da construção de um humanismo mais amplo, fundado no marxismo e alimentado pelas mais
diferentes contribuições do pensamento filosófico-científico contemporâneo: fenomenologia, psiquiatria, psicanálise, etnologia, história
das religiões. Constituíram condição mesma do êxito cognoscitivo da
pesquisa: a sua irredutível batalha em defesa da “razão” e da “civilização moderna” contra qualquer regurgitação mística ou tradição
irracionalista; a sua precisa “opção de campo”, que veio a se traduzir
em uma ativa e apaixonada militância no movimento operário e rural,
em uma individuação do próprio papel de “intelectual orgânico”,
como protagonista de uma atividade de pesquisa científica orientada
pelo esclarecimento da prática política da libertação, e na definição
de um método de pesquisa voltado para “quem indaga” e “aquele
para os quais a pesquisa se dirige”, apresentando a tensão comum a
ambos de “estar na mesma história” e “construir um futuro diferente”.
Foi sobretudo entre os agricultores do Mezzogiorno da Itália que
Ernesto de Martino trabalhou, através de reconstruções históricas e
obras de investigação já clássicas, para verificar, junto com as suas
136
Tullio Seppilli
opções de fundo, os modelos de pesquisa que constituíram o fio
condutor do seu compromisso científico. A saber, a reconstrução das
complexas condições que incidem, como fatores de “continuidade”
ou “inovação”, no determinar-se histórico da cultura, na iluminação
dos canais e dos modos concretos através dos quais se realizam os
grandes processos de hegemonia e circulação cultural entre as classes
dominantes e as classes subalternas, na individuação dos elementos de
precariedade nos eixos de existência do mundo popular – a presença
do “negativo” e os riscos que disso derivam – como matrizes objetivas
de formas específicas de vida psíquica e de cultura, e como fatores
objetivos da persistência de uma concepção mágica das relações com
a realidade. No específico, ele buscava a verificação empírica – em
um Mezzogiorno caracterizado pela persistência maciça de numerosos sincretismos católico-pagãos – daquele modelo interpretativo do
“mágico” que tinha precedentemente construído, trabalhando com
materiais oriundos de pesquisas conduzidas, em épocas e lugares
diferentes, no contexto de grupos etnoculturais atribuíveis ao assim
chamado “mundo primitivo extraeuropeu”. Tratava-se da interpretação da ritualidade mágica como “técnica de resgate” ao longo da
qual, através da “deshistorificação ritual” de um “estado negativo” e
a sua referência a um “horizonte mítico”, no qual a salvação aparece
já garantida, sendo evitado o “perigo de não estar” – ou seja, o perigo
de que a angústia produzida pelo “negativo” incida sobre o indivíduo,
determinando uma verdadeira ruptura em sua unidade e autonomia
psíquica (“crise de presença”) – e, assim, recuperando-se a sua capacidade de se colocar como sujeito de comportamentos conscientes.
Mais ou menos na metade da década de 1950, enquanto ressurgia a
pesquisa antropológica e estavam em pleno andamento as memoráveis
indagações de Ernesto de Martino, na Lucania e na Puglia,3 também
começava na Itália um novo tipo de cinema documentário, focado na
redescoberta da realidade efetiva do país.
3
Regiões do extremo sul da Itália [n.d.t.]
Sul e magia: pesquisa etnográfica e cinema documentário
137
Certamente, tal modelo de documentário surgiu na onda do grande
cinema neorrealista, que naqueles anos estava chegando à sua máxima
expansão. Como esse último, o documentário também privilegiou uma
direção de abordagem e compromisso civil, que era a descoberta e a
denúncia das condições de existência, que marcavam a vida e a morte,
nos setores menos tutelados, nas áreas mais pobres e marginalizadas,
nas situações-limite da precariedade.
Justamente sobre tais condições, o instrumento cinematográfico colocou o seu foco, para documentar – nas diferentes regiões do país – os
casos que surgiam cada vez mais como emblemáticos. Eram estes, por
exemplo, o pesadelo das frequentes inundações nos centros habitados
do delta Padano, a arcaica historicidade e o isolamento invernal nos
vilarejos perdidos das montanhas; a esqualidez e a ausência de qualquer serviço civil nas periferias romanas, impactadas pela especulação
imobiliária; a marginalidade dos velhos e a falta de espaços adequados
para as crianças nas grandes cidades; os “vencidos” que disputam
um último refúgio desesperado nos dormitórios públicos; as pesadas
jornadas das prostitutas nas casas e nas estradas dos bairros populares; a vida sem futuro dos últimos protagonistas de velhos trabalhos,
condenados inevitavelmente a desaparecer frente aos processos de
transformação; os dramas da emigração do sul para o norte e a difícil
integração dos imigrantes nas metrópoles do triângulo industrial; a
praga da miséria e do persistente analfabetismo em grande parte das
regiões meridionais; as duras condições de trabalho e de existência dos
pastores da Sardenha, dos pescadores da Sicília, dos agricultores do
Mezzogiorno inteiro. Emerge desses documentários, assim, toda uma
“humanidade dolorida”, que constituía a outra face do “progresso”
e do “milagre econômico”.
Todavia, desse cinema documentário, é preciso delinear pelo menos
duas especificidades.
Primeiro de tudo, o fato de que, mesmo se movendo num terreno
de compromisso com a descoberta e a denúncia das realidades mais
precárias que foram próprias, como dito, do grande cinema neorrealista (e também de boa parte do debate político-cultural daquele
138
Tullio Seppilli
período), ele mostra uma influência direta, temática e metodológica,
da ressurgida antropologia italiana. Tratou-se, efetivamente, naqueles anos, de uma verdadeira intersecção entre antropologia cultural
e cinema documentário (ou, se preferirmos, entre antropólogos e
documentaristas), que teve o seu principal suporte institucional nas
múltiplas atividades conduzidas a partir de 1953 pelo Centro Italiano
per il Film Etnografico e Sociologico.4
Em segundo lugar, é necessário evidenciar como, a partir de tal
quadro, já no final da década de 1950, surge uma vertente específica
do cinema documentário que parece se referir muito de perto à temática e aos mesmos lugares das pesquisas conduzidas sobre o “mundo
mágico” do Mezzogiorno da Itália, por Ernesto de Martino. Esse tema,
mais propriamente “etnográfico”, aparece mais ou mesmo ausente no
cinema de ficção. São documentários – aos quais forneceram às vezes
uma consultoria direta o próprio Ernesto de Martino ou alguns de
seus colaboradores – que indagaram, nas várias regiões meridionais,
as ritualidades de defesa mágica e as figuras dos “maciari”, os resíduos
do lamento fúnebre e arcaico, a fenomenologia do “tarantismo”, os
persistentes sincretismos católico-pagãos, nas peregrinações e nas
grandes festividades religiosas. É a temática que, retomando o título
de um dos mais famosos trabalhos demartinianos, poderíamos emblematicamente encaixar nos termos Sud e magia.
O Centro italiano para o filme etnográfico foi constituído em Roma, em 1953.
Na oportunidade do I Convegno italiano di studi sul film etnografico (Roma, 24-25
dezembro 1956), ele mudou a própria denominação para Centro italiano per il film
etnografico e sociológico. Foi o Centro que organizou, juntamente com outros parceiros, o VII Colloquio Internazionale sul film etnografico e sociológico (Perugia,
14-21 maio 1959) e, no mesmo ano, em Firenze, a primeira edição (14-20 dezembro
1959) do Festival dei Popoli (Rassegna Internazionale del film etnografico e sociológico que deveio em seguida Rassegna Internazionale del film di documentazione
sociale). O Centro desenvolveu, especialmente naqueles anos, uma atividade muito
intensa (congressos, seminários, projeções e debates); nessa sede é oportuno evidenciar, em específico, as frequentes colaborações científicas e o patrocínio oficial dado
a alguns dos mais significativos documentários então produzidos na Itália.
4
Sud e Magia. Ricerca Etnografica e Cinema Documentario
139
Negli anni del secondo dopoguerra si manifestò in Italia una vera
e propria “rinascita” delle scienze umane1.
Come è noto, la vecchia ricerca antropologica e sociologica del
periodo positivistico, che aveva raggiunto posizioni di grosso rilievo
nell’ultimo trentennio del XIX secolo, era già entrata in una crisi
profonda intorno alla prima guerra mondiale. E d’altronde il suo superamento era avvenuto nella chiave di uno storicismo marcatamente
In: Sud e magia. Ricerca etnografica e cinema documentario sul Mezzogiorno d’Italia nel Secondo dopoguerra, «La Ricerca Folklorica. Contributi allo studio della
cultura delle classi popolari» (Bre- scia), n. 8, ottobre 1983 (numero dedicato a La
medicina popolare in Italia, a cura di Tullio Seppilli), pp. 109-110. Il testo qui pubblicato nella versione originale italiana aveva costituito la relazione introduttiva(Sud
et magie. Recherche ethnographique et cinéma documentaire sur le Midi de l’Italie
après la Seconde guerre mondiale. Introduction à la Séance “Sud et magie. Films documentaires italiens inspirés de la recherche d’Ernesto de Martino (1959-1971)’’, Firenze, Istituto Italiano per il Film di Documentazione Sociale, aprile 1980, 7 pp.)
all’omonimo programma di proiezione e discussione di documentari concernenti
le forme di protezione magico-religiosa nell’Italia meridionale predisposto dal Festival dei Popoli per la Giornata inaugurale della Seconda edizione della rassegna
“Cinéma du réel. Festival international du film ethnographique et sociologique”
svoltasi a Parigi presso il Centre George Pompidou nei giorni 12-20 aprile 1980. Nel
corso di tale programma, ufficialmente presentato dagli organizzatori della rassegna
come serata di Hommage au Festival des peuples in occasione dei vent’anni dalla sua
nascita, vennero proiettati i seguenti documentari: Nascita e morte nel Meridione di
Luigi Di Gianni (1959), La passione del grano di Antonio Michetti (1960), La taranta
di Gian- franco Mingozzi (1961), Il male di San Donato di Luigi Di Gianni (1965),
I Fujenti di Gabriele Palmieri (1967), L’attacèatura di Luigi Di Gianni (1971) e La
possessione di Luigi Di Gianni (1971).Altre edizioni italiane di questo testo furono
pubblicate nel 1982 e nel 1996.
1
140
Tullio Seppilli
idealistico e fondato su una concezione della storia come sola storia
etico-politica delle classi egemoni: talché esso si era tradotto, di fatto,
nella obliterazione dell’interesse per la analisi delle classi subalterne
e, insieme, in un sostanziale rifiuto delle indagini empiriche “sul presente”. La caduta, poi, di interi settori di ricerca e la compromissione
ideologica di taluni altri era stata consapevolmente perseguita da un
regime, come quello fascista, che aveva fondato sui miti della stirpe e
della razza e sulla mistificazione della storia e della realtà del Paese la
sua politica di controllo e organizzazione del consenso.
Così, per molti giovani intellettuali italiani, la Liberazione aprì
drammaticamente il problema della scoperta della vera realtà del Paese
e, a un tempo, il problema della scoperta di quanto avevano prodotto
nel frattempo in altri Paesi – in termini conoscitivi e metodologici –
le molteplici discipline che pongono al centro della propria analisi la
condizione dell’uomo e della società.
Fu questo l’inizio di un lungo e difficile percorso. L’acquisizione
delle nuove tematiche e dei nuovi strumenti di indagine, il loro ripensamento teorico-metodologico, la loro validazione critica in una società,
come quella italiana, lacerata da contraddizioni profonde e da estesi
e differenziati fenomeni di rapido cambiamento, furono operazioni,
tutte, che si scontrarono inevitabilmente con grosse difficoltà, oggettive e soggettive, e con notevoli resistenze di vario segno (giacché ogni
sviluppo nella conoscenza scientifica dei processi sociali, e il costituirsi
stesso delle strutture istituzionali adeguate a produrlo non possono
non incidere in qualche modo, sui precedenti equilibri intellettuali e
politici e, in generale, sui rapporti di classe, di egemonia e di potere).
E non fu certo un caso se la rinata ricerca antropologica italiana
principiò a cimentarsi, allora, sulle condizioni di vita e le forme culturali tradizionali delle classi rurali subalterne nell’area più emarginata dai
grandi processi di modernizzazione del Paese: il Mezzogiorno (dove
peraltro ebbero parallelamente luogo in quegli anni, ma in una logica
sostanzialmente autonoma, anche inchieste condotte da antropologi
stranieri, nordamericani in gran parte, discendenti alcuni di vecchi
emigrati meridionali, ma anche francesi e di altre nazioni).
Sud e Magia. Ricerca Etnografica e Cinema Documentario
141
Qui, infatti, fu più facile l’intersezione del nuovo pensiero antropologico con le precedenti esperienze della ricerca folclorica e con la
problematica che era stata propria delle grandi scuole “meridionalistiche” sin dalla fine del secolo XIX. E qui, esso poté trovare una
significativa mediazione nello spazio aperto in quegli stessi anni, e con
notevole rilievo, da una originale produzione saggistica, a metà fra la
inchiesta e il memoriale, che ebbe quali più significativi protagonisti
uomini come Carlo Levi, Rocco Scotellaro, Danilo Dolci.
Al centro della rinascita di una riflessione e di una ricerca antropologica, nell’Italia del Secondo dopoguerra, sta indubbiamente la figura
di Ernesto de Martino (1908-1965). Emblematici furono, in quegli
anni, il suo intenso e travagliato cammino che partendo da una matrice
idealistico-crociana lo portò ad allargare l’orizzonte della riflessione
storicistica al “mondo primitivo”, alle civiltà “altre”, nella prospettiva
della costruzione di un più largo umanesimo fondato sul marxismo e
alimentato dai più diversi contributi del pensiero filosofico-scientifico
contemporaneo – fenomenologia, psichiatria, psicoanalisi, etnologia,
storia delle religioni –; la sua irriducibile battaglia in difesa della “ragione” e della “civiltà moderna” contro ogni rigurgito misticheggiante
e ogni tradizione irrazionalistica; la sua precisa “opzione di campo”,
che ebbe a tradursi in una attiva e appassionata militanza nel movimento operaio e contadino, in una individuazione del proprio ruolo
di “intellettuale organico” come protagonista di una attività scientifica
di ricerca finalizzata a chiarificare la pratica politica di liberazione, e
nella definizione di una metodica di inchiesta in cui fra “chi indaga”
e “coloro cui l’indagine si rivolge”, la comune tensione ad “essere
nella medesima storia” e a “costruire un futuro diverso”, costituisce
la condizione stessa dell’esito conoscitivo della ricerca.
Fu soprattutto fra i contadini del Mezzogiorno d’Italia, appunto,
che Ernesto de Martino lavorò, attraverso ricostruzioni storiche e
campagne d’inchiesta divenute ormai classiche, per verificare, insieme alle opzioni di fondo, i modelli di indagine che costituirono
il filo conduttore del suo impegno scientifico: la ricostruzione delle
complesse condizioni che incidono come fattori di “continuità” o
142
Tullio Seppilli
‘”innovazione”, nel determinarsi storico della cultura, la messa in
luce dei canali e dei modi concreti attraverso cui si realizzano i grandi
processi di egemonia e di circolazione culturale fra classi dominanti e
classi subalterne, la individuazione degli elementi di precarietà negli
assetti di esistenza del mondo popolare – la presenza del “negativo” e
i rischi che ne derivano – come matrici oggettive di specifiche forme
di vita psichica e di cultura e come oggettivi fattori di persistenza di
una concezione magica dei rapporti con la realtà. E in particolare
la verifica empirica – in un Mezzogiorno caratterizzato dalla persistenza massiccia di numerosi sincretismi pagano-cattolici – di quel
modello interpretativo del “magico” che Ernesto de Martino aveva
in precedenza costruito lavorando su materiali espunti da indagini
condotte, in epoche e luoghi diversi, nel contesto di gruppi etnicoculturali ascrivibili al cosiddetto “mondo primitivo extraeuropeo”: la
interpretazione, cioè, della ritualità magica come “tecnica di riscatto”
nel corso della quale, attraverso la “destorificazione rituale” di uno
“stato negativo” e il suo riferimento a un “orizzonte mitico” in cui
la salvezza appare già garantita, viene scongiurato il “rischio di non
esserci” – il rischio cioè che l’angoscia prodotta dal “negativo” incida
sull’individuo determinando una vera e propria rottura della sua unità
e autonomia psichica (“crisi della presenza”) – e viene recuperata così
la sua capacità di porsi come soggetto di comportamenti consapevoli.
Intorno alla metà degli anni Cinquanta, mentre risorgeva la ricerca antropologica ed erano in pieno corso le memorabili inchieste di
Ernesto de Martino nella Lucania e nelle Puglie, prendeva avvio in
Italia anche un nuovo tipo di cinema documentario indirizzato alla
riscoperta della effettiva realtà del Paese.
Certo, un tal tipo di documentario nacque sulla scia del grande
cinema neorealista, che appunto in quegli anni stava raggiungendo la
sua massima espansione. E come quest’ultimo, anche il documentario
privilegiò una direzione di approccio e di impegno civile che era insieme scoperta e denuncia delle condizioni di esistenza che segnavano
la vita e la morte nei ceti meno garantiti, nelle aree più povere ed
emarginate, nelle situazioni ai limiti della precarietà.
Sud e Magia. Ricerca Etnografica e Cinema Documentario
143
Appunto su tali condizioni venne focalizzato allora lo strumento
cinematografico per documentare – nelle più diverse aree del Paese – i
casi che apparivano volta a volta più emblematici: l’incubo delle ricorrenti alluvioni nei centri abitati del Delta Padano, la arcaica staticità e
l’isolamento invernale degli sperduti villaggi di montagna, lo squallore
e l’assenza di ogni servizio civile nelle borgate della periferia romana
investita dalla speculazione edilizia, l’emarginazione dei vecchi e la
mancanza di spazi adeguati per i bambini nelle grandi città, i “vinti”
che si contendono un ultimo disperato rifugio nei dormitori pubblici,
la pesante giornata delle prostitute nelle case e nelle strade dei quartieri
popolari, la vita senza futuro degli ultimi protagonisti dei vecchi mestieri
condannati inesorabilmente a scomparire sotto l’urto dei processi di
cambiamento, i drammi dell’emigrazione dal Sud al Nord e la difficile
integrazione degli immigrati nelle metropoli del Triangolo Industriale,
la piaga della miseria e del persistente analfabetismo in larga parte delle
regioni meridionali, le dure condizioni di lavoro e di esistenza dei pastori
sardi, dei pescatori siciliani, dei contadini dell’intero Mezzogiorno.
Emerge da questi documentari, così, tutta una “umanità dolorante” che
costituiva l’altra faccia del “progresso” e del “miracolo economico”.
E tuttavia, di questo cinema documentario sono da sottolineare
almeno due specificità.
Innanzitutto, che pur muovendosi sul terreno dell’impegno di
scoperta e denuncia delle realtà più precarie che fu proprio, come si
è detto, del grande cinema neorealista (e peraltro di molta parte del
dibattito politico-culturale di quel periodo), esso risente di una influenza diretta, tematica e metodologica, della rinata antropologia italiana.
Si trattò in effetti, in quegli anni, di una vera e propria intersezione
fra antropologia culturale e cinema documentario (o, se vogliamo, fra
antropologi e documentaristi): la quale ebbe il suo principale supporto
istituzionale nelle molteplici attività condotte a partire dal 1953 dal
Centro Italiano per il Film Etnografico2.
Il Centro italiano per il film etnografico fu costituito a Roma nel 1953. In occasione del I Convegno italiano di studi sul film etnografico (Roma, 24-25 dicembre
2
144
Tullio Seppilli
In secondo luogo va sottolineato come in tale quadro, sin dalla
fine degli anni Cinquanta, emerge un particolare filone di cinema
documentario che appare riferirsi assai strettamente alla tematica,
e ai luoghi stessi, delle inchieste condotte sul “mondo magico” del
Mezzogiorno d’Italia da Ernesto de Martino. È una tematica, questa,
più propriamente “etnografica”, che risulta invece pressoché assente
nel cinema a soggetto. Si tratta di documentari – cui diedero talora una
diretta consulenza scientifica lo stesso de Martino o taluni suoi collaboratori – i quali esplorano nelle varie regioni meridionali le ritualità
di difesa magica e le figure dei “maciari”, i residui del lamento funebre
arcaico, la fenomenologia del “tarantismi”, i persistenti sincretismi
pagano-cattolici nei pellegrinaggi e nelle grandi festività religiose. Ed
è la tematica, appunto, che riprendendo il titolo di uno dei più noti
lavori demartiniani, possiamo emblematicamente racchiudere nei
termini di Sud e magia.
1956) esso mutò la sua denominazione in Centro italiano per il film etnografico e
sociologico. Fu il “Centro” ad organizzare, insieme ad altri enti, il VII Colloquio
Internazionale sul film etnografico e sociologico (Perugia, 14- 21 maggio 1959) e
nello stesso anno, a Firenze, la prima edizione (14-20 dicembre 1959) del Festival
dei popoli (Rassegna internazionale del film etnografico e sociologico divenuta poi
Rassegna internazionale del film di documentazione sociale). Il “Centro” sviluppò,
specie in quegli anni una attività assai intensa (convegni, seminari, proiezioni e dibattiti): in questa sede sembra opportuno sottolineare, in particolare, la frequente
collaborazione scientifica e il patrocinio ufficiale dati ad alcuni fra i più significativi
documentari allora prodotti in Italia.
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
145
146
Paride Bollettin
Andrea F. Ravenda
Imagens disputadas: As produções
visuais nas disputas entre companhias
energéticas e movimentos contra a
poluição industrial, no sudeste da Itália
Immagini contese. Le produzioni visuali
nelle contese tra compagnie energetiche
e movimenti contro l’inquinamento
industriale nel sud-est d’Italia
Imagens disputadas
147
Se, portanto, a realidade nada mais é que cinema em natura,
Deriva disso que a primeira e principal das linguagens humanas,
possa ser considerada a mesma ação: enquanto relação de representação
recíproca com os outros e com a realidade física.
Pier Paolo Pasolini, Empirismo Herético, 1972, p. 199
Uma importante audição
No dia 28 de outubro de 2013, mais ou menos às 9 e 30 da manhã,
na sala Metrangolo do Tribunal de Brindisi – pequena cidade do litoral
adriático do sudeste da Itália – há uma grande espera para o começo
de uma importante audição pública. É a nova etapa do julgamento
de doze dirigentes da empresa energética que, no território local, é
proprietária de uma incômoda central termoelétrica a carvão. A central Federico II, localizada em Contrada Cerano, é um dos maiores e
mais poluentes sítios industriais da Europa,1 assim como a companhia
ENEL é o maior gestor de energia do país e uma grande fonte de
trabalho para muitos cidadãos de Brindisi. O julgamento começou
em dezembro de 2012,2 com imputações que versam principalmente
sobre a sujeira que contamina as plantações, e tem conexão com a
poeira produzida pelo depósito de carvão a céu aberto e pela correia
É possível consultar a relação da Agência Europeia pelo meio Ambiente no site:
http://www.eeaeuropa.eu.
2
O processo começou no dia 12/12/2012.
1
148
Andrea F. Ravenda
transportadora, que leva o carvão do porto da cidade até a central.
São mais de 10 quilômetros ao lado de campos agrícolas. As frutas,
legumes e hortaliças produzidas teriam sido contaminadas pela poeira
de carvão. Em um ano de duração, o julgamento conseguiu uma importante visibilidade na mídia, nas arenas e nos debates difundidos
pelos meios sociais, colocando-se no bojo das tensões locais sobre o
impacto da poluição industrial sobre a saúde pública, e, já há algum
tempo, circula na internet uma foto de algumas alcachofras – hortaliças típicas da região – pretas, devido à poeira de carvão. Nesse
quadro geral, a audição se espera terá uma importância crucial, pelas
declarações e os documentos que o inspetor de polícia, Alessandro
Cucurachi, irá apresentar. Foi ele que conduziu as investigações sobre
as atividades da central, depois da denúncia apresentada por alguns
agricultores. Trata-se, em grande parte, de documentos visuais, fotografias e filmagens que devem mostrar como a poeira que provém da
central, levada pelo vento, vai se depositar sobre as roças adjacentes.
Enquanto os assistentes montam o projetor e a tela, o juiz, há poucos
minutos na sala, resolve, rapidamente, as audições preliminares que
antecipam o processo mais importante do dia: “talvez não tenha entendido – disse dirigindo-se a um advogado que demorava nas suas
explicações – que hoje temos um processo grande, que nos ocupará o
dia todo, seja rápido!” A sala se enche: mais de cem pessoas, muitos
são advogados, alguns jornalistas. Os agricultores cumprimentam
calorosamente o inspetor que chega e se senta; ele parece tranquilo.
Chegam também dois ativistas do “No al carbone” (“Não ao carvão”),
um movimento que há alguns anos se opõe às emissões poluentes
emitidas pela central. Às 10:45 a audição começa.
A antropologia legal deteve-se longamente sobre o caráter performativo das audições públicas – em todas as próprias declinações
– durante as quais a práxis e os instrumentos legais, implicitamente
e explicitamente, configuram rituais importantes (Barrera, 2013;
Coutin, 1995) que, como meios e fins, produzem conhecimento,
negociam, reformulam e criam relações, significados e provas de
confiabilidade sobre o que é legal ou ilegal (Heyman, 2013). Trata-se
Imagens disputadas
149
de rituais legais, performados em uma contínua tensão entre o interno
e o externo das salas do tribunal, enquanto se debatem, negociam e
produzem verdades legais (Coutin, 1995). Da mesma forma, a antropologia visual refletiu sobre a relação entre provas audiovisuais e saber
antropológico, a partir da consciência de que os meios e as produções
visuais intervêm nos contextos etnográficos, de forma performativa e
transformadora (Harper, 2012; Pink, 2007). Uma relação profunda e
imprescindível entre visão e conhecimento, como a declinação de um
olhar que produz provas e ao mesmo tempo convence, media e manipula (Faeta, 1995). Em um escrito de 2009, Carlo Cubero mostrou
claramente como os filmes e a produção fílmica fornecem diferentes
tipos de provas interconectadas. Por um lado, provas materiais que
representam as relações sociais e culturais observadas no campo,
por outro, a experiência concreta da ação visual se configura como
uma forma de conhecimento antropológico que redefine os valores
e os significados daquelas mesmas provas (Cubero, 2009). Imagens e
visões que, como diz o antropólogo italiano Faeta, não deveriam ser
consideradas exclusivamente com uma vontade documental imediata,
mas segundo “as lógicas do conhecimento e da relação que ao redor
delas se entrecruzam” (1995, p. 56). A partir desses pressupostos
teórico-metodológicos, integrados entre antropologia legal e visual,
tentarei refletir etnograficamente sobre algumas perspectivas da
análise de imagens (filmes e fotos) em um contexto como aquele de
Brindisi, fortemente caracterizado pelas disputas – políticas, científicas
e jurídicas – entre companhias energéticas e movimentos de protesto
contra a poluição industrial, disputas que versam sobre temas de saúde
pública, ambiental e segurança alimentar. Depois de ter indagado
sobre alguns aspectos do campo etnográfico e das disputas visuais
que o definem, vou me deter sobre como e quanto as imagens persuasivas são usadas como ação de protesto contra a poluição (Mclagan,
2006). Paralelamente, me deterei em como as provas visuais, objetos
de brigas legais – dentro e fora das salas do tribunal –, contribuem
para a negociação performativa de conhecimento como um produto
de relações de força específicas e articuladas.
150
Andrea F. Ravenda
O contexto etnográfico: ações visuais
Brindisi é uma cidade de aproximadamente 90.000 habitantes,
que desde os anos sessenta do século passado teve o setor industrial
como a principal fonte de trabalho, nas estratégias do governo, pelo
desenvolvimento econômico daquela região. A grande zona industrial
começa no porto da cidade e expande-se a sudeste, por vários quilômetros de litoral, contando, entre as instalações mais impactantes,
com uma indústria petroquímica e duas centrais termoelétricas a
carvão. Se por um lado tal presença limitou ou interrompeu as possibilidades de desenvolvimento econômico de outros setores, como o
agrícola, da pesca ou do turismo, por outro lado, o aço das estruturas
industriais, as cores e os cheiros das emissões industriais têm radicalmente transformado a paisagem e o equilíbrio ambiental, incidindo
de forma determinante nos níveis de qualidade de vida das pessoas.
A partir dessas considerações de caráter geral, que têm um espelho
nas experiências cotidianas de quem trabalha e vive na cidade, várias
pesquisas científicas no campo biomédico evidenciaram o aumento de
patologias, como neoplasias, asma bronquial, disfunções tireóideas e
má-formações cardíacas neonatais3 – todas plausivelmente relacionadas com as emissões industriais. Uma causalidade possível, um nexo
etiológico existente entre poluição e patologias, todavia, no debate
público e na ação política, não é posto como dado objetivo, mas é
tema de contínuas controvérsias entre as diferentes partes envolvidas
– movimentos de protesto contra a poluição, companhias energéticas,
médicos, pesquisadores e advogados – em um campo extremamente
conflituoso, que perpassa várias esferas e níveis da política, da ciência,
do direito e da vida cotidiana das pessoas (Ravenda, 2014). Também
Em relação à população de Brindisi, uma pesquisa de 2011 – realizada pelo
Instituto de fisiologia clínica do Centro Nacional de Pesquisa de Lecce e de Pisa,
juntamente com a Unidade Operativa de neonatologia do hospital Perrino de Brindisi – sinalizou um excesso de patologias neonatais encontradas na cidade da Puglia,
18% maior da media europeia, com uma distância de 60% em referência a patologias congênitas cardiovasculares.
3
Imagens disputadas
151
no âmbito do citado processo judicial, o pedido encaminhado, pelos
advogados de algumas partes civis, de ampliar a responsabilidade
da companhia energética também no nível da saúde pública, em referência às mortes por neoplasias de alguns agricultores que tinham
trabalhado perto da correia transportadora, foi logo colocado de
lado, justo no dia em que foram apresentadas as provas visuais. O
quadro etiológico descontaria na sede processual a pluralidade de
causas das patologias, que se dispersam entre as consequências de
determinados estilos de vida, o uso de agrotóxicos na agricultura,
até a poluição produzida por outros sítios industriais presentes na
região. Uma tensão entre as partes, portanto (como a determinação
de causas e responsabilidades), produz uma contínua fabricação de
provas, dados, opiniões contrastantes, debatidas nas salas de tribunal
e muitas vezes difundidas através dos meios de comunicação de vários
tipos, desde as redes sociais aos cartazes e pôsteres colocados em
lugares relevantes da cidade, e para os quais o complexo cruzamento
entre imagem, visão, conhecimento e verdade vem a ser determinante
(Cubero, 2009; Faeta, 1995; Harper, 2012). Uma centralidade do
meio visual apareceu já na primeira fase da pesquisa, quando, no fim
do verão de 2009, fui para Brindisi, a fim de entrar em contato com
o movimento “No al carbone”, que tinha começado sua atividade,
há alguns meses. Depois de alguns contatos preliminares, fui informado de que durante as comemorações pela festa de San Teodoro,
protetor da cidade, os “No al carbone” teriam realizado uma ação de
protesto. As comemorações culminaram com a procissão da estátua
pelo mar, no porto da cidade, com os fogos, o discurso conjunto do
prefeito e do bispo, que acontece frente a uma escadaria lotada, nas
colunas romanas, término monumental da antiga Via Appia Romana4
e símbolo da cidade. Os ativistas tinham previsto levantar uma grande
faixa com a frase “No al carbone”, no lugar mais alto da escadaria,
acima das cabeças da multidão presente pela festa e diante do olhar
Estrada de época romana que ligava a cidade de Roma ao porto de Brindisi, no
outro lado da península italiana [n.d.t.].
4
152
Andrea F. Ravenda
dos representantes institucionais e religiosos. Conhecendo o plano
de ação, coloquei-me numa perspectiva privilegiada e no momento
da ação tirei algumas fotos, as únicas realizadas da ação. A imagem
que consegui foi de grande interesse semiótico, pois a construção do
setting em razão da ação tinha sido interessante.
Embaixo do monumento mais importante da cidade e acima das
cabeças de muitas pessoas destaca-se a frase “No al carbone”, identificando a mensagem proposta à cidade e seus habitantes. Qualidade
semiótica e capacidade de veicular uma mensagem precisa que foi
imediatamente percebida pelo movimento. Poucos minutos depois
da ação, fui contatado pelos ativistas que pediam a minha disponibilidade em compartilhar com eles as imagens. Aceitei e isso teve um
êxito imediato, através de um jornal on-line, que tinha sua sede perto
da escadaria das colunas. Lá, uma imagem do protesto foi publicada
com um pequeno texto de explicação. Algumas semanas depois, os
ativistas me contataram novamente para pedir os arquivos originais,
para utilizá-los em outra ação: a realização de um grande pôster a ser
espalhado pela cidade. O pôster construído com uma de minhas fotos
apresentava também o logo do movimento (uma camiseta preta com
a escrita branca “No al carbone”) e um texto análogo ao modelo das
famosas propagandas contra o fumo: “O carvão prejudica gravemente
a saúde”.
Desde logo ficou claro, como demonstra o episódio rapidamente
descrito, que o campo de pesquisa se apresentava como um espaço
regulado por relações de força muito articuladas, que objetivavam
envolver o pesquisador diretamente na disputa local.
“Guerreiros”
Do episódio da festa do santo protetor, ao longo dos anos, o movimento “No al carbone” foi gradualmente crescendo e ampliando o
próprio consenso na região, assim como a quantidade e a qualidade
dos protestos, acompanhando as ações públicas, com uma intensa
Imagens disputadas
153
atividade comunicativa em rede, sobretudo através dos meios visuais,
que permitiram contatos em rede com outros movimentos de justiça
ambiental, nacionais e internacionais. O espaço concreto é integrado
e amplificado pelo virtual. Graças à colaboração com fotógrafos e
videomakers integrantes do movimento, a comunicação visual veio
a ser uma das principais formas da luta contra a poluição produzida
pelo carvão, por um lado, e, por outro, contra a hegemonia das companhias energéticas na região. A produção contínua de fotos, vídeos
e propagandas é veiculada essencialmente em três níveis distintos e
interconectados:
1) De informação/documentação. Com o aporte de instrumentos de
videogravação smart, como celulares e tablets, os ativistas conseguem
monitorar continuamente os efeitos visíveis da atividade das centrais,
como, por exemplo, as emissões de fumaças mais intensas ou as chamas
das chaminés. As imagens gravadas são imediatamente publicadas na
rede e difundidas através das mídias sociais, apresentando a ameaça
industrial cotidiana que pesa sobre a cidade.
2) De refração/multiplicação. Os ativistas gravam todas as próprias
manifestações nas praças e as ações de protesto nos eventos públicos,
as documentam, as montam muitas vezes acompanhando-as com musicas famosas para em seguida publica-las na internet, aumentando o
impacto mediático da própria ação.
3) Di medium/comunicazione. Foram organizadas campanhas de
comunicação baseadas em fotos realizadas em estúdio, com o objetivo
de veicular mensagens específicas. A mais relevante dessas foi talvez
aquela do grupo “Passeggino Rosso” [Carrinho de Bebê Vermelho],
composto pela maior parte das mães ativistas do movimento. Na
campanha “Eu coloco a minha cara”, os vultos de alguns ativistas –
adultos e crianças, pais e filhos –, de cidadãos ou, em outros termos,
de “pessoas comuns”, apareciam num fundo preto ao lado de algumas
considerações gerais sobre a poluição da cidade. Essa campanha foi
retomada também por uma conhecida revista semanal, nacional, onde
entre as imagens utilizadas, além de duas fotos da correia transportadora que leva o carvão e de duas “mães do carrinho de bebê vermelho”,
154
Andrea F. Ravenda
aparecia também uma foto com a central energética ao fundo, frente
a qual estavam alguns militantes, com o olhar fixo na câmera em uma
pose plástica, que evocava a posição de desafio ao colosso energético,
própria da determinação na luta.
Começando dessas classificações, certamente parciais, na direção
de uma perspectiva de maior complexidade, as estratégias e os níveis
propostos tendem a se sobrepor e a se entrecruzar nas ações do movimento, mostrando uma grande consciência no uso do meio visual
e na difusão de imagens persuasivas. Como propôs a antropóloga
Elizabeth Edwards, em um escrito sobre a reconstrução da utilidade
das fotografias pelo discurso antropológico, as qualidades peculiares
do medium mostram como a polarização da produção visual não deve
ser lida necessariamente como opositiva (realista contra expressiva ou
de documentação contra arte), mas como um fenômeno “objetivamente conectado e dialeticamente interdependente” (Edwards, 1999, p.
59). A fotografia pode ser construída de forma a criar incisões visuais
profundas e cruciais, como uma metáfora que liga o espaço visível e
invisível, que não comunica necessariamente através do paradigma
realista, mas através de uma poética. O uso do medium é conectado
a um estilo estético. Para parafrasear as palavras do poeta e cineasta
italiano Pier Paolo Pasolini, trata-se de pequenas metáforas, ao mesmo
tempo do limite e da possibilidade do dizer, da linguagem e da ação
(Pasolini, 1972). Uma consciência do meio visual que aparece sobretudo nos muitos documentários produzidos pelos ativistas. Trabalhos
que vão de vídeos breves e amadores sobre as ações de protesto ou
sobre a vida dos agricultores que cultivam as roças adjacentes à correia transportadora do carvão, até chegar a produtos realizados por
profissionais, jornalistas e videomakers, como por exemplo, “Il giorno
che verrà”, de Simone Salvemini, diretor da cidade de Brindisi, muito
ligado ao movimento, que em seu filme cruza as histórias de quatro
pessoas da cidade, com o objetivo de contar o impacto da poluição
industrial sobre a experiência cotidiana das pessoas que vivem na região. Esse filme teve distribuição na Itália e no exterior. Vídeos, fotos,
documentários, portanto, entram prepotentemente no debate público
Imagens disputadas
155
local sobre a poluição ambiental, com funções simultaneamente de
informação, refração e comunicação que, no seu complexo, representam e reproduzem, com certa eficácia, a tensão entre um caráter
invasivo e pacifista. Tensão que determina a luta de um movimento
composto por pessoas comuns (mães, pais, filhos), o qual se utiliza
daquela que, como Benjamin, poderíamos definir faculdade mimética,
sempre igual e diferente, performativa para quem a produz, assim
como para quem a observa (Benjamin, 1962). Todavia, tal campo de
disputa visual não é exclusivo dos movimentos de protesto porque,
depois de anos de difusão de logos, como patrocínios para eventos
públicos de vários tipos, também as companhias energéticas souberam
construir seus próprios instrumentos elaborados para veicular mensagens específicas. No começo de 2013, as redes televisivas, os jornais
e manifestos publicitários distribuídos em todas a cidades italianas
começaram a divulgar imagens de homens, mulheres, jovens, idosos,
italianos, migrantes, trabalhadores, estudantes e atletas, com o olhar
profundo fixado na câmera, e no alto um impresso com o hashtag
“#guerreiros”, acompanhado pela escrita “qualquer que seja a sua luta,
você tem toda a energia para vencê-la, e também a nossa”. Embaixo
estava o logo da companhia energética (proprietária da central Federico II). Depois de uma campanha publicitária de efeito, o projeto
comunicativo previu a realização de um site na web, uma rede social
e uma plataforma compartilhada de storytelling, onde os usuários são
convidados a contar as próprias histórias de luta cotidiana, daqueles
“guerreiros comuns” que, com energia, enfrentam as adversidades
cotidianas, também graças à ajuda da companhia energética. As
melhores histórias, além de serem premiadas ironicamente com uma
bicicleta elétrica, foram encenadas em um filme e projetadas em um
programa de televisão, nacional, apresentado por um famoso musicista. Todavia, essa campanha não teve o êxito esperado, sobretudo por
causa do cancelamento do hashtag no twitter.5 Este foi imediatamente
Por isso evidencio o site do coletivo de escritores Wu Ming, que teve um papel
fundamental na transformação de “#guerreiros” em uma campanha de contrainfor5
156
Andrea F. Ravenda
transformado por centenas de usuários, famosos (como o coletivo
de escritores Wu Ming ou Green Peace Itália), e não famosos, em
um instrumento para veicular contrainformação sobre a companhia
energética. Um processo de transformação que teve êxitos relevantes,
também no contexto etnográfico de Brindisi. Afinal, o conflito visual
e comunicativo, nas diferentes posições da companhia elétrica e dos
movimentos de protesto, parece operar em sequências compartilhadas,
em representações da relação entre “pessoas comuns”, cotidianidade
e companhia elétrica. O que muda é simplesmente a direção dessa
relação e o ponto de vista de quem a apresenta. Justamente por esse
terreno comum, os ativistas – e não somente os “No al carbone” – tiveram certa facilidade, na dinamicidade da rede, ao trocar as imagens
que subtendiam e ilustravam o hashtag, contrariando a mensagem
da companhia. Os “#guerreiros”, dessa forma, vieram a ser aqueles
que lutam – na Itália mas não somente – contra a poluição do carvão
e o caráter invasivo das companhias energéticas, assim como, ironicamente, aqueles que encontram, entre as próprias adversidades
cotidianas, também o custo da conta de energia: uma retórica e uma
mensagem que se aplicam bem às estratégias visuais já utilizadas pelo
movimento. As diferentes manipulações ainda em andamento são
capazes de transformar a campanha promocional da companhia em
uma campanha contra a própria companhia, graças a um processo
de transformação semiótica dos meios visuais e, ao mesmo tempo,
de ação concreta comunicativa e política, que se configura como
um exemplo paradigmático das tensões e das relações de força que
definem o contexto etnográfico.
mação energética, disponível em: <http://www.wumingfoundation.org>. Um artigo
muito útil para compreender o processo de transformação do hashtag foi escrito
pelo blogger Francesco Montanari “Carburano”, disponível em: <http://www.officinawazo.com>.
Imagens disputadas
157
Provas visuais
Daquilo dito até aqui, relativamente ao contexto etnográfico das
disputas entre movimentos de protesto e companhias energéticas, e do
uso dos meios visuais, apresenta-se certamente de forma mais clara a
importância da audição realizada em 28 de outubro (a descrição que
abriu esse texto), assim como a espera pelas provas apresentadas pelo
inspetor Cucurachi.
Voltando à sala, antes mesmo de começar, o juiz declara ter recebido um pedido da Ansa,6 através de um jornal local, para fotografar,
ao longo da audição, em particular, a tela onde serão projetadas as
imagens. As partes aceitaram. Depois dos preâmbulos introdutórios
usuais, que antecipam o ritual processual, o inspetor acomoda-se no
banco das testemunhas e, declarando afirmar a verdade, entra logo no
cerne da questão. Questionado pelas perguntas do ministério público,
ele começa a descrever as modalidades organizativas da investigação
realizada: quando aconteceu e quanto durou. Começa-se a projetar
as imagens, as primeiras são fotos de satélite, que mostram a zona
industrial de Brindisi, onde é possível individuar a correia transportadora, o depósito e a central de carvão. O inspetor descreve como o
carvão é descarregado no porto da cidade e levado através da correia
até o depósito da central, que, na foto, se destaca como um grande
quadrado preto.
A sequência de imagens é intercalada pelas perguntas do ministério
público, às quais o inspetor responde, com precisão e abundância de
detalhes. São mostrados os terrenos agrícolas adjacentes, as estruturas
de trânsito e estocagem do carvão, e o inspetor se detém sobre a correia
transportadora, que deveria ser completamente coberta. O mesmo
também vale para o depósito, que deveria ter barreiras de proteção. As
fotos mostram o contrário, já que têm muitos buracos nas proteções.
Um advogado do gigante energético intervém, sustentando que não
tem clareza da numeração das imagens apresentadas e das datas nas
6
Agenzia Nazionale Stampa Associata (Agencia Nacional de Imprensa Associada).
158
Andrea F. Ravenda
quais foram tiradas. O inspetor especifica que todas as imagens são
numeradas em ordem crescente, conforme a ordem de apresentação e
que as datas nas quais foram tiradas são inquestionáveis. O depoimento
continua num ritmo frenético. As imagens da correia transportadora
sem proteções estimulam os comentários dos agricultores e dos ativistas presentes, que acontecem principalmente no momento em que
são mostradas as hortaliças e frutas recolhidas nos campos da região,
sujas de poeira de carvão. Todavia, se trata somente de um prelúdio aos
materiais mais importantes e mais difíceis de avaliar, ou seja, os vídeos
da poeira de carvão que, desde as estruturas da central, acabariam se
depositando sobre os terrenos agrícolas. Ao longo de sua investigação,
o inspetor previu instalar algumas videocâmaras, com sistema motion
detection, fixas nos terrenos adjacentes às estruturas da central, e voltadas para o depósito. As gravações continuaram insistentemente por
vários meses. O que foi apresentado, obviamente, foi uma síntese dos
fotogramas projetada em alta velocidade: uma nuvem de poeira preta
levanta-se do depósito e, depois de alguns instantes de suspensão,
pousa sobre as roças. No entanto, a projeção é logo interrompida
por um advogado da companhia que coloca duas objeções à projeção
das imagens e à assunção dessa documentação como prova indiciária.
A primeira tem a ver com as modalidades de gravação. Nos dias de
monitoramento a câmera teria sido consignada ao proprietário do
terreno, que é um dos denunciantes da companhia. Não está claro, diz
o advogado, se as imagens vistas foram todas gravadas pela polícia e
não tiveram partes gravadas pelo proprietário do terreno, o qual não
seria confiável, segundo a defesa, já que é parte na causa. A segunda
tem a ver com o filme projetado, a alta velocidade e a montagem que,
segundo o advogado, falsificariam a realidade do fenômeno gravado.
Essas considerações irritaram o ministério público, que logo pediu
a Cucurachi para esclarecer as questões levantadas pela defesa. O
inspetor afirma que as gravações foram realizadas por funcionários da
polícia, o proprietário do terreno teria colaborado somente pelo fato
de que as câmeras foram posicionadas durante alguns dias sobre sua
propriedade. Ele devia simplesmente controlar se os equipamentos
Imagens disputadas
159
estavam ligados e com fitas. Enquanto o inspetor pronuncia essas
palavras, um ativista do “No al carbone” presente, que relata o evento
via facebook, escreve: “se alguém me roubasse a carteira e eu encontrasse o ladrão com o meu celular, eu não poderia ser atendido como
parte lesada?” Cucurachi intervém também sobre a segunda questão:
as imagens têm sido gravadas em tempo real e o que foi projetado foi
uma versão em alta velocidade, pois de outra forma não seria possível
focalizar todos os materiais por razões temporais. O advogado aceita
a primeira questão, mas é cético sobre a segunda. Ele insiste que se
trataria de uma montagem, uma manipulação que não diz nada, além
do fato de que a aceleração alteraria a percepção do fenômeno. Pede a
recusa da prova. O ministério público intervém, afirmando que não se
trata de uma montagem com manipulação das imagens, pois os frames
foram colados de forma sequencial – respeitando a numeração das fitas
– e o que vimos só é alterado pela alta velocidade: “se vocês querem,
podemos ficar aqui por vários dias e ver todas as imagens em tempo
real, eu estou disposto a fazê-lo”. Essa provocação fecha o debate.
As provas visuais são aceitas pelo juiz com o bem-estar das partes,
com a condição que sejam depositadas e consideradas na própria
originalidade e em tempo real. A audição aproxima-se do fim, com
alguns momentos grotescos devido à interrupção de energia elétrica,
episódio que acontece duas vezes e que vem imediatamente ligado,
ironicamente, ao descontentamento da companhia energética diante
das provas visuais apresentadas e aceitas. Às 17:30h, a audição termina,
com a satisfação dos ativistas e dos agricultores. No dia seguinte, já
estão disponíveis na rede as imagens visualizadas ao longo da audição,
as fotos e uma síntese do vídeo. O material é publicado por um jornal
on-line e imediatamente são compartilhadas pelos ativistas.7 Alguns
dias depois, em uma rua muito movimentada da cidade, aparece um
cartaz de três metros por seis, que mostra a uva de um agricultor suja
As imagens e uma síntese do vídeo podem ser encontrados em um blog criado
pelo movimento, justamente para o processo judicial. Disponível em: <http://siamotuttiparteoffesa.blogspot.it/2013/10/nuova-udienza-del-processo-enel-in-aula.
html>.
7
160
Andrea F. Ravenda
de carvão. Embaixo da imagem lemos: “o carvão nas nossas mesas”,
junto ao logotipo “No al carbone”.
As imagens disputadas: uma conclusão
No debate contemporâneo da antropologia visual (mas não somente dela), já há algum tempo, reflete-se sobre as modalidades através
das quais os movimentos sociais de vários tipos utilizam os meios
visuais para a produção de imagens persuasivas, como instrumentos
determinantes nas estratégias de advocacy (Allen, 2009; Gregory,
2006; Harper, 2012; Mclagan, 2006; Peterson, 2013; Torchin,
2006), seguindo diferentes perspectivas e orientações. Essas vão desde
a reivindicação de determinados direitos humanos, nos contextos dominados por conflitos (Allen, 2009; Gregory, 2006; Hinegardner,
2009; Torchin, 2006), aos processos de fabricação de provas de
legitimidade, por minorias culturais (De Lorenzo, 2006), ou às reivindicações próprias da justiça ambiental (Harper, 2012). Um debate
que foi refletindo de forma reflexiva sobre o papel da antropologia
aplicada participativa (Pink, 2007; 2012) sobre as possibilidades e as
criticidades na representação da alteridade cultural, também no tema
da autonomia visual (Peterson, 2013). Ao mesmo tempo, o aumento progressivo das possibilidades tecnológicas na democratização
e difusão dos instrumentos, amplificados pelas potencialidades da
internet, fragmentou e ao mesmo tempo multiplicou as produções,
criando novas interconexões e curto-circuitos entre dimensões locais
e transnacionais. Como evidencia Meg McLagan, em um artigo de
2006, na American Anthropologist: “no mundo globalmente mediado de hoje, as imagens visuais têm um papel central em determinar
quais violências são redimidas e quais continuam não reconhecidas”
(2006, p. 191). Um discurso segundo o qual “ver é crer”, e que para
ser perpetuado tem que necessariamente ser apoiado por mecanismos
complexos de produção e comunicação visual, do depoimento e do
compartilhamento da “verdade”. Em referência a tal debate, que no
Imagens disputadas
161
seu complexo parece dialogar com aquele da antropologia legal sobre a
produção e a negociação de verdades legais, nas audições processuais,
as imagens disputadas no contexto de Brindisi oferecem sugestões
interessantes. As fotos das hortaliças sujas de carvão estão no centro de
relações de força muito articuladas que, na tensão entre as companhias
energéticas e os movimentos de protesto, têm continuamente o significado manipulado em uma discussão que envolve diferentes esferas
da política, da comunicação, do direito, da economia, da pesquisa
científica, da ação e da vida cotidiana. O ritual da audição no tribunal
sobre a confiabilidade das provas visuais, acerca das técnicas de gravação e reprodução, estabelece os limites de confiança e verdade das
imagens que, uma vez fora do tribunal, acessam de forma influente o
debate público através dos meios de comunicação e das manipulações
de ativistas, que as utilizam como instrumentos de contrainformação e
de acusação contra a companhia energética. Imagens disputadas que,
voltando novamente às salas do tribunal, assumirão novos e diferentes
significados, sendo mais uma vez objeto de manipulação. Afinal, os
exemplos da festa do santo padroeiro e da campanha de comunicação
“#guerreiros”, tinham evidenciado o valor performativo do meio
visual, operando em limites dificilmente transitáveis: entre poética e
ação, entre política e comunicação. As imagens das hortaliças sujas,
ou do vídeo que mostra a poeira de carvão, estão inevitavelmente
interconectados aos documentários produzidos pelos ativistas, ou
às campanhas comunicativas da companhia energética. Eles podem
ser considerados – de um ponto de vista antropológico – na tensão
e na disputa que os combina, enquanto relações de representação
recíproca, entre as partes e com a realidade política, como peças de
um mosaico visual que define e é definido pelo contexto etnográfico.
162
Andrea F. Ravenda
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Imagens disputadas
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Immagini contese
165
Se dunque la realtà non è che cinema in natura,
ne deriva che il primo e principale dei linguaggi umani,
può essere considerata l’azione stessa: in quanto rapporto
di reciproca rappresentazione con gli altri e con la realtà fisica.
Pier Paolo Pasolini, Empirismo eretico, 1972, p. 199
Una importante udienza
Il 28 ottobre 2013, circa alle 9:30 del mattino, nell’aula Metrangolo
del Tribunale di Brindisi – piccola città che affaccia sulla costa adriatica
del Sud-est d’Italia – c’è grande attesa per l’inizio di un’importante
udienza pubblica. Si tratta della nuova tappa del processo ai danni
di dodici dirigenti del colosso energetico che sul territorio locale è
proprietario di un’ingombrante centrale termoelettrica a carbone;
la centrale Federico II di contrada Cerano, infatti, è uno dei siti industriali più grandi e inquinanti d’Europa1 così come la compagnia
rappresenta il principale gestore di energia nel paese e importante
bacino occupazionale per molti cittadini di Brindisi. Il processo è in
corso dal dicembre 20122 con capi d’accusa che vertono principalmente sull’insudiciamento delle colture e si riferiscono alle polveri
prodotte dal carbonile a cielo aperto e dal nastro trasportatore che
È possibile consultare il rapporto dell’Agenzia Europea per L’ambiente sul sito
www.eea.europa.eu.
2
Il processo ha avuto inizio il 12/12/2012.
1
166
Andrea F. Ravenda
dal porto della città approvvigiona il carbone alla centrale. Oltre 10
chilometri adiacenti a campi agricoli. La frutta e la verdura, gli ortaggi
prodotti, sarebbero intaccati dalle polveri di carbone. In un anno del
suo corso, il processo ha ottenuto una buona ribalta mediatica nelle
arene e nei dibattiti diffusi dai social media, ponendosi al cuore delle
contese locali rispetto all’impatto dell’inquinamento industriale sulla
salute pubblica e, già da qualche tempo, in rete, circola una foto che
ritrae i carciofi – ortaggi tipicamente connotati nell’area – neri di polveri di carbone. In un tale quadro generale, l’udienza che si attende,
potrebbe avere un’importanza cruciale in virtù delle dichiarazioni
e dei documenti che presenterà l’ispettore della polizia Alessandro
Cucurachi, che ha condotto le indagini sull’attività della centrale dopo
la denuncia presentata da alcuni agricoltori. Si tratta in buona parte
di documenti visuali, foto e riprese che dovrebbero mostrare come
le polveri provenienti dalle attrezzature della centrale sollevate dal
vento, si andrebbero a posare sui terreni agricoli adiacenti. Gli assistenti d’aula, infatti, montano il telo e il proiettore mentre il giudice,
entrato da qualche minuto, sbriga con una certa rapidità le udienze
preliminari che anticipano il processo più importante della giornata:
“forse non ha capito – rivolgendosi ad un avvocato che si dilunga
nelle sue spiegazioni – oggi abbiamo un processo grosso che ci terrà
occupati per tutto il giorno, sia rapido!”. L’aula si riempie; oltre cento
persone, molti sono avvocati, qualche giornalista. Ci sono gli agricoltori che salutano con caloroso rispetto l’ispettore che arriva e si siede,
sembra tranquillo. Arrivano anche due attivisti del “No al carbone”,
un movimento che da alcuni anni si oppone alle emissioni inquinanti
prodotte dalla centrale a carbone. Alle 10:45 l’udienza ha inizio.
L’antropologia legale ha a lungo riflettuto sul carattere performativo
delle udienze pubbliche – in tutte le proprie declinazioni – durante le
quali, gli strumenti e le prassi legali, implicitamente ed esplicitamente, configurano rituali influenti (Barrera, 2013; Coutin, 1995) che
come mezzi e fini producono conoscenza, negoziano, riformulano e
creano relazioni, significati, prove di attendibilità su ciò che è legale
o illegale (Heyman, 2013). Si tratta di rituali legali giocati in una con-
Immagini contese
167
tinua tensione tra dentro e fuori le aule di tribunale durante i quali
si dibattono, negoziano e producono verità legali (Coutin, 1995).
Allo stesso modo, l’antropologia visuale ha riflettuto sul rapporto tra
prove audiovisuali e sapere antropologico a partire dalla consapevolezza che i mezzi e le produzioni visuali intervengano nei contesti
etnografici, in maniera performativa e trasformativa (Harper, 2012;
Pink, 2007). Nello specifico in un saggio del 2009 l’antropologo Carlo
A. Cubero, ha mostrato con chiarezza come i film e la produzione di
film forniscano diversi tipi di prove interconnesse. Da un lato prove
materiali che rappresentano le relazioni sociali e culturali osservate
sul campo, dall’altro l’esperienza concreta dell’azione visuale si
configura come forma di conoscenza antropologica che ridefinisce
i valori e i significati di quelle stesse prove (Cubero, 2009). Da tali
presupposti teorico-metodologici integrati tra antropologia legale e
visuale, proverò a riflettere etnograficamente su alcune prospettive
di analisi delle immagini (film e foto) in un contesto come quello di
Brindisi, fortemente caratterizzato dalle contese – politiche, scientifiche, giuridiche – tra compagnie energetiche e movimenti di protesta
all’inquinamento industriale riguardo a tematiche di salute pubblica,
ambiente, sicurezza alimentare. Dopo aver esplorato alcuni aspetti
del campo etnografico, e delle contese visuali che lo definiscono, mi
soffermerò su come e quanto l’uso d’immagini persuasive come azione
di protesta all’inquinamento (McLagan, 2006) interconnesso a quello
di prove visuali oggetto di contese legali – dentro e fuori le aule di
tribunale – contribuisca alla negoziazione performativa di conoscenza
come prodotto di specifici e articolati rapporti di forza.
Il contesto etnografico: azioni visuali
Brindisi è una città di circa 90.000 abitanti con un’alta densità
industriale – due centrali termoelettriche a carbone e un grande polo
petrolchimico – e con una continua crescita percentuale di patologie,
in maniera plausibile, connesse all’inquinamento industriale, come ad
168
Andrea F. Ravenda
esempio neoplasie, asma bronchiale, disfunzioni tiroidee, malformazioni cardiache neonatali3. Una connessione causa-effetto, un nesso
eziologico tra inquinamento e patologie che tuttavia nel dibattito
pubblico e nell’azione politica non è assunto come dato oggettivo,
ma è materia di continue contese e negoziazioni tra le diverse parti
coinvolte: compagnie energetiche e movimenti di protesta in primis,
ma anche politici, ricercatori, sindacalisti, medici, giornalisti, avvocati
etc. (Ravenda, 2014). Le centrali elettriche a carbone, così come il
polo petrolchimico, sono considerate dall’unione dei medici e dai
movimenti locali, come le principali cause delle malattie e dei decessi. Per questo motivo è stata più volte richiesta la chiusura di una
delle due centrali a carbone e la riduzione della produzione e delle
emissioni per la seconda. I problemi principali sono stati individuati
nei mancati investimenti per la messa a norma del carbonile giacente
all’aperto della centrale di Cerano e nel nastro trasportatore del carbone che oggi sono oggetto del processo già menzionato. Le compagnie
energetiche, di concerto con le istituzioni locali, hanno risposto con
alcuni interventi di miglioramento tecnologico, pur mantenendo una
posizione piuttosto netta sulla produttività. Da un lato considerano
che la riduzione del lavoro o la chiusura di una delle centrali genererà
disoccupazione per molti lavoratori così come ingenti perdite per i
profitti delle proprietà. Da un’altra prospettiva, studiosi e politici,
per diverse ragioni legati alle compagnie energetiche, considerano
necessari nuovi approfondimenti scientifici sulla validità del nesso
causa\effetto tra inquinamento industriale e patologie. Non negano
la presenza di agenti inquinanti e cancerogeni emessi dalle centrali,
ma sono scettici sulla possibilità di individuare “scientificamente”
questi agenti come cause specifiche di ciascuna patologia (non solo i
In riferimento alla popolazione di Brindisi, uno studio del 2011 – realizzato
dall’Istituto di fisiologia clinica del Cnr di Lecce e di Pisa con l’Unità operativa di
neonatologia dell’ospedale Perrino di Brindisi ha segnalato un eccesso nelle patologie neonatali riscontrate nel capoluogo pugliese del 18% in più rispetto alla media
europea, con uno scarto che raggiunge quasi il 68% in riferimento alle patologie
congenite cardiovascolari.
3
Immagini contese
169
tumori, ma anche altre patologie) in ogni paziente. Potrebbero essere
i pesticidi usati nell’agricoltura, l’inquinamento industriale, lo stile di
vita; allo stesso modo sono stati anche espressi dubbi sulla possibilità
che siano proprio le polveri di carbone a insudiciare le colture. In
aggiunta le compagnie affermano che l’attività delle centrali sono
costantemente monitorate e rispettano le norme di legge. Una tensione tra le parti, dunque, che genera una continua fabbricazione di
prove, dati e opinioni contrastanti, presentati nelle aule dei tribunali
e spesso diffusi tramite mezzi di comunicazione di vario genere – dai
social networks a poster e manifesti pubblicitari affissi in luoghi pubblici della città, per la quale, come emerge dal processo di Brindisi,
le produzioni visuali risultano determinanti. Centralità del mezzo
visuale che è apparsa già durante la prima fase della ricerca quando
verso la fine dell’estate 2009 mi sono recato a Brindisi per prendere
i primi contatti con il movimento “No al carbone” che da qualche
mese aveva iniziato la sua attività. Dopo alcuni contatti preliminari ero
stato informato che, in occasione dei festeggiamenti per San Teodoro,
patrono della Città, i “No al carbone” avrebbero compiuto un’azione
di protesta. I festeggiamenti per il Santo culminano con la processione
della statua via mare, nel porto della Città, con i fuochi d’artificio,
con il discorso congiunto di sindaco e vescovo che avviene di fronte
all’affollata scalinata delle colonne romane, termine monumentale
dell’antica Via Appia Romana e simbolo della Città. Gli attivisti
avevano previsto di issare un grande striscione con la scritta “No al
carbone” sul punto più alto della scalinata, sopra le teste della folla di
persone giunte per la festa e di fronte allo sguardo dei rappresentanti
istituzionali e religiosi. Conoscendo il piano mi posizionai con una
prospettiva vantaggiosa e al momento dell’azione scattai alcune foto,
le uniche peraltro che furono scattate durante l’azione. L’immagine
che ne ricavai fu di grande interesse semiotico, poiché interessante
era stata la costruzione del setting per l’azione.
Sotto il monumento più rilevante della Città e sopra le teste di molte
persone campeggia la scritta “No al carbone” come a voler identificare il messaggio proposto con la città e la cittadinanza. Subito dopo
170
Andrea F. Ravenda
l’azione di protesta fui contattato da alcuni attivisti che chiedevano
la mia disponibilità a condividere con loro le immagini. Acconsentì e
in pochi minuti mi ritrovai nello studio di un giornale on-line, dove le
foto furono scaricate è immediatamente pubblicate, allo stesso modo,
alcune settimane dopo, gli attivisti del movimento mi chiesero i file
originali da utilizzare per un’altra azione: la realizzazione di un grande
manifesto da affiggere pubblicamente in città. Al manifesto costruito
su una delle immagini che avevo registrato, era stata aggiunta, oltre
al logo del movimento (una maglietta nera con una scritta bianca No
al carbone), un testo analogo al modello delle note campagne contro
il fumo delle sigarette: “il carbone nuoce gravemente alla salute”.
Sin da subito è stato chiaro, come mostra l’episodio brevemente
descritto, che il campo di ricerca si presentava come uno spazio regolato da rapporti di forza molto articolati che tendevano a coinvolgere
il ricercatore direttamente nella contesa locale.
“Guerrieri”
Dall’episodio della festa del Santo Patrono, nel corso degli anni,
il movimento “No al carbone” è andato gradualmente crescendo,
ampliando il proprio consenso sul territorio così come la quantità e
la qualità della protesta, affiancando alle azioni di piazza un’intensa
attività comunicativa sul web, soprattutto attraverso medium visuali
che hanno permesso contatti in rete con altri movimenti di giustizia
ambientale nazionali e internazionali. La piazza concreta è integrata
e amplificata da quella virtuale. Grazie alla collaborazione con fotografi e videomaker esperti, oramai parte integrante del movimento, la
comunicazione visuale è divenuta una delle principali forme di lotta
contro l’inquinamento prodotto dal carbone da un lato e l’egemonia
sul territorio delle compagnie energetiche dall’altro. La produzione
continua di foto, video, spot è veicolata essenzialmente su tre livelli
distinti ed interconnessi:
1) Di informazione/documentazione. Grazie all’apporto di strumenti
di videoregistrazione smart, quali telefoni o tablet, gli attivisti ri-
Immagini contese
171
escono a monitorare continuamente gli effetti visibili dell’attività
delle centrali come ad esempio le emissioni di fumi particolarmente
intense o le fiammate dei camini. Le immagini registrate, sono immediatamente pubblicate in rete e diffuse attraverso i social media
rappresentando la quotidiana minaccia industriale che incombe
sulla città.
2) Di rifrazione/moltiplicazione. Gli attivisti registrano tutte le proprie manifestazioni di piazza e le azioni di protesta durante eventi
pubblici, le documentano, le montano spesso associandole a musiche note per poi pubblicarle in rete, implementando l’impatto
mediatico della propria azione.
3) Di medium/comunicazione. Sono state organizzate delle campagne
di comunicazione basate su foto realizzate in studio con l’obiettivo
di veicolare specifici messaggi. La più rilevante di queste è stata
probabilmente quella dal gruppo “Passeggino rosso” composto
per la maggior parte dalle madri attiviste del movimento. Nella
campagna “io ci metto la faccia”, i volti di alcuni attivisti – adulti
e bambini, genitori e figli – di cittadini o, in altri termini, di “gente
comune” apparivano su sfondo nero accanto ad alcune considerazioni generali sull’inquinamento cittadino. Questa campagna è
stata anche ripresa da un noto settimanale nazionale dove tra le
immagini utilizzate oltre a due foto riguardanti il nastro trasportatore di carbone e due “madri del passeggino rosso”, compariva una
foto con la centrale come sfondo, innanzi al quale alcuni militanti
erano disposti, con sguardo fisso alla camera in una posa plastica
che evocava la postura di sfida al colosso energetico propria di una
determinazione nella lotta.
Partendo da queste classificazioni certamente parziali, verso una
prospettiva di maggiore complessità, le strategie e i livelli proposti
tendono a sovrapporsi e intersecarsi nelle azioni del movimento,
mostrando una grande consapevolezza nell’uso del mezzo visuale e
nella diffusione di immagini persuasive. Dopotutto come sostenuto
dall’antropologa Elizabeth Edwards all’interno di un saggio sulla
ricostituzione dell’utilità delle fotografie per il discorso antropologico, le qualità peculiari del medium mostrano come la polarizzazione
172
Andrea F. Ravenda
della produzione visuale non deve essere letta necessariamente come
opposizionale (realista contro espressiva o di documentazione contro
arte) ma come un fenomeno “oggettivamente connesso e dialetticamente interdipendente” (Edwards, 1999: 59). La fotografia può essere
costruita in modo da creare profonde e cruciali incisioni visuali come
una metafora che collega lo spazio tra visibile e invisibile, che non
comunica necessariamente attraverso il paradigma realista ma tramite
una poetica. L’uso del medium è connesso a uno stile estetico. Per
parafrasare le parole del poeta e cineasta italiano Pier Paolo Pasolini,
si tratta di piccole metafore al contempo limite e possibilità del dire,
del linguaggio dell’azione (Pasolini, 1972). Una consapevolezza del
mezzo visuale che si evince soprattutto dai molti documentari prodotti. Lavori che spaziano da video brevi e amatoriali sulle azioni di
protesta o sulla vita dei contadini che coltivano i campi adiacenti al
nastro trasportatore del carbone, fino ad arrivare a prodotti realizzati da professionisti, giornalisti e videomaker, come ad esempio Il
giorno che verrà di Simone Salvemini, regista brindisino molto vicino
al movimento, che nel suo film intreccia le storie di quattro cittadini
di Brindisi con l’obiettivo di raccontare l’impatto dell’inquinamento
industriale sull’esperienza quotidiana delle persone che vivono sul
territorio. Un film che ha avuto una distribuzione in Italia e all’estero.
Video, foto, documentari, dunque, che entrano prepotentemente nel
dibattito pubblico locale sull’inquinamento ambientale con funzioni
simultaneamente d’informazione, rifrazione e comunicazione che, nel
loro insieme, rappresentano e ri-producono, con una certa efficacia, la
tensione tra l’invasività industriale e la pacifica ma determinata lotta
del movimento composto da cittadini comuni (madri, padri, figli)
secondo quella che con Benjamin potremmo definire facoltà mimetica
sempre uguale e diversa, performativa per chi la produce così come
per chi la guarda (Benjamin, 1962). Tuttavia, tale campo di contesa
visuale non è di esclusivo appannaggio dei movimenti di protesta
poiché, dopo anni di diffusione di loghi come sponsorizzazioni per
eventi pubblici di vario genere, anche le compagnie energetiche hanno
saputo costruire propri strumenti elaborati per veicolare determinati
messaggi. In particolare all’inizio del 2013 i network televisivi, i gior-
Immagini contese
173
nali, i manifesti pubblicitari distribuiti in tutte le città italiane, hanno
iniziato a diffondere immagini di donne e uomini, giovani, anziani,
italiani e migranti, lavoratori, studenti, atleti, lo sguardo profondo che
guarda nella camera, in alto stampato l’hashtag#guerrieri seguito dalla
scritta “qualunque sia la tua battaglia hai tutta l’energia per vincerla,
anche la nostra”. In basso il logo della compagnia energetica (proprietaria della centrale Federico II). Dopo una campagna pubblicitaria
a effetto, il progetto comunicativo ha previsto la realizzazione di un
sito web, di una rete sui social networks, di una piattaforma social di
storytelling, dove gli utenti sono stati invitati a raccontare le loro storie
di lotta quotidiana di quei “guerrieri comuni” che con energia affrontano le avversità quotidiane, anche grazie al sostegno della compagnia
energetica. Le migliori storie, oltre ad essere premiate, ironia vuole,
con una bicicletta elettrica, sono state raccolte in un formato docufiction e mandate in onda durante un programma televisivo nazionale
condotto da un famoso musicista. Tuttavia questa campagna comunicativa non ha avuto l’esito atteso, soprattutto a causa del fallimento
dell’hashtag su twitter4, immediatamente trasformato da un centinaio
di utenti noti (ad esempio il collettivo di scrittori Wu Ming, o Green
Peace Italia) e meno noti, in uno strumento per veicolare controinformazione sulla compagnia energetica. Un processo trasformativo
che ha avuto esiti rilevanti anche nel contesto etnografico di Brindisi.
Dopotutto, il conflitto visuale e comunicativo, nelle diverse posizioni
tra compagnia energetica e movimenti di protesta pare giocarsi, per
così dire, su sequenze condivise, su rappresentazioni del rapporto tra
“persone comuni” quotidianità e compagnia energetica. Quello che
cambia è semplicemente il verso di tale rapporto e il punto di vista di
chi lo rappresenta. Proprio per questo terreno comune, gli attivisti – e
A tale proposito segnalo il sito del collettivo di scrittori Wu Ming che ha giocato un ruolo cruciale nella trasformazione di #guerrieri in una campagna di controinformazione sulla compagnia energetica: http://www.wumingfoundation.com.
Un articolo molto utile per comprendere il processo di trasformazione dell’hashtag
#guerrieri è stato scritto dal blogger pugliese Francesco Montanari “Carburano”
reperibile su http://www.officinawazo.com
4
174
Andrea F. Ravenda
non solo i No al carbone – hanno avuto gioco facile, nella dinamicità
della rete, a cambiare le immagini che sottendevano l’hashtag polarizzando per verso opposto il messaggio della compagnia. I #guerrieri,
pertanto, sono divenuti chi combatte – in Italia ma non solo – contro
l’inquinamento del carbone e l’invasività delle compagnie energetiche, così come, con una buona dose di ironia chi vede tra le proprie
avversità quotidiane, il costo della bolletta energetica: una retorica e
un messaggio che si applicano bene alle strategie visuali già adoperate
dal movimento. Manipolazioni diverse e ancora in corso d’opera,
tali da trasformare la campagna promozionale per la compagnia, sul
web, in una campagna contro la compagnia grazie ad un processo di
trasformazione semiotica dei mezzi visuali e al contempo di concreta
azione comunicativa e politica che si configura come un esempio
paradigmatico delle tensioni e dei rapporti di forza che definiscono
il contesto etnografico.
Prove visuali
Da quanto finora detto, rispetto al contesto etnografico, alle contese tra movimenti di protesta e compagnie energetiche e all’uso di
mezzi visuali, risulta di certo più chiara l’importanza dell’udienza del
28 ottobre la cui descrizione ha aperto questo intervento, così come
l’attesa nei confronti delle prove portate dall’ispettore Cucurachi.
Tornando in aula, infatti, prima ancora di iniziare, il giudice dichiara di aver ricevuto una richiesta da parte dell’ANSA5, tramite
una testata giornalistica locale, per poter scattare alcune foto durante
l’udienza, in particolare sullo schermo dove saranno proiettate le immagini. Le parti acconsentono. Dopo i soliti preamboli introduttivi
che anticipano il rito processuale, l’ispettore si accomoda sul banco
dei teste e dichiarando di affermare il vero, entra subito nel vivo
della questione. Sollecitato dalle domande del pubblico ministero
5
Agenzia Nazionale Stampa Associata
Immagini contese
175
inizia a descrivere le modalità organizzative dell’indagine condotta.
Quando è avvenuta e quanto e durata. S’inizia a proiettare; le prime
sono immagini satellitari che dall’alto ritraggono la zona industriale
di Brindisi, dove è possibile individuare la linea del nastro trasportatore, il carbonile e la centrale a carbone. L’ispettore descrive come il
carbone sia scaricato nel porto della città e condotto tramite il nastro
trasportatore verso il carbonile della centrale che nella foto spicca
come un grande quadrato nero.
La sequenza delle immagini è intervallata dalle domande del pubblico ministero alle quali l’ispettore risponde con precisione e dovizia
di particolari. Sono mostrati i terreni agricoli adiacenti alle strutture di
transito e stoccaggio del carbone, si sofferma sul nastro trasportatore
che dovrebbe essere completamente coperto, lo stesso per il carbonile
che dovrebbe avere delle barriere di protezione. Le foto mostrano
il contrario poiché molti sono i buchi nelle protezioni. Un avvocato
del colosso energetico interviene, sostenendo che non vi è chiarezza
nella numerazione delle foto presentate e sulle date in cui le stesse
sono state prodotte. L’ispettore specifica che tutte le immagini sono
numerate in ordine crescente rispetto all’ordine di presentazione e
che sono riscontrabili le date in cui sono state scattate. La deposizione
continua con un ritmo incalzante. Le immagini del nastro trasportatore privo di protezioni stimolano i commenti degli agricoltori e
degli attivisti presenti, questo avviene soprattutto nel momento in cui
sono mostrati gli ortaggi raccolti nei campi della contrada sporchi di
polveri di carbone, così come la frutta, uva e meloni. Tuttavia si tratta
soltanto di un preludio ai materiali più importanti e più difficili da
valutare, in altre parole i video che mostrerebbero le polveri di carbone
che dalle strutture della centrale finirebbero per posarsi sui campi
agricoli. Durante la sua indagine l’ispettore ha previsto di istallare
alcune videocamere con sistema motion detection fissate nei terreni
adiacenti alle strutture della centrale e rivolte verso il carbonile. Le
riprese sono andate avanti insistentemente per diversi mesi. Quella
mostrata è ovviamente una sintesi di fotogrammi, proiettata con una
velocizzazione: una coltre di polvere nera si alza dal carbonile e dopo
176
Andrea F. Ravenda
qualche istante di sospensione si posa sui terreni agricoli. La proiezione
tuttavia è ben presto interrotta dall’intervento di un avvocato della
compagnia che pone due obiezioni alla proiezione e all’assunzione di
questa documentazione come prova indiziaria. La prima riguarda le
modalità di registrazione. La videocamera nei giorni di monitoraggio
sarebbe stata affidata al proprietario del terreno che è stato uno dei
denunciatori della compagnia. Non è ben chiaro, sostiene l’avvocato,
se le immagini visionate siano state tutte registrate dalla polizia o se
non vi siano nel montaggio parti registrate dal proprietario del terreno
secondo la difesa non attendibile in quanto parte in causa. La seconda
riguarda il filmato proiettato, la velocizzazione e il montaggio che, al
dire dell’avvocato, falserebbero la reale entità del fenomeno registrato. Queste considerazioni irritano il pubblico ministero, che subito
chiede a Cucurachi di chiarire sulle questioni sollevate dalla difesa.
L’ispettore afferma che le riprese sono state effettuate da funzionari
di polizia di stato, il proprietario del terreno ha collaborato solo in
quanto le videocamere per diversi giorni sono state posizionate nelle
sue proprietà. Doveva semplicemente controllare che fossero accese e
che vi fossero le cassette. Mentre l’ispettore pronuncia queste parole,
un attivista del No al carbone presente in aula che tiene la cronaca del
processo su Facebook scrive “se qualcuno mi rubasse il portafoglio e
io lo riprendessi con il mio cellulare, sarei inattendibile in quanto parte
offesa?”. Cucurachi interviene anche sulla seconda questione: le immagini sono state registrate in tempo reale, quella che viene proiettata
è soltanto una velocizzazione perché altrimenti non sarebbe possibile
visionare tutti i materiali, ovviamente per ragioni di tempo. L’avvocato
acconsente sulla prima questione ma sulla seconda è scettico, insiste;
si tratterebbe di un montaggio, di una manipolazione che non dice
niente, inoltre, l’accelerazione falserebbe la percezione del fenomeno.
Chiede l’inammissibilità della prova. Interviene il pubblico ministero
affermando che non si tratta di un montaggio come manipolazione
delle immagini, i frame sono stati attaccati in maniera sequenziale –
rispettando il numero delle cassette – e quello che stiamo vedendo
non è altro che una velocizzazione “se volete – aggiunge – possiamo
Immagini contese
177
restare qui per più giorni e vedere tutte le immagini in tempo reale,
io sono disposto a farlo”. Provocazione questa che chiude il dibattito.
Le prove visive sono ammesse dal giudice con il benestare delle parti,
a patto che siano depositate e considerate nella loro originalità e in
tempo reale. L’udienza si avvia al termine non senza qualche momento
grottesco dovuto all’interruzione dell’energia elettrica, episodio che
accade due volte e che viene immediatamente collegato, con ironia, al
malcontento della compagnia energetica per le prove visuali mostrate
e accolte. Alle 17:30 circa l’udienza si conclude con la soddisfazione
degli attivisti e degli agricoltori. Il giorno dopo, in rete sono già disponibili le immagini visionate durante l’udienza, le foto e una sintesi
del video; le pubblica un giornale on line e immediatamente sono
condivise dagli attivisti6. A distanza di qualche giorno, inoltre, su una
strada molto trafficata della città di Brindisi compare un manifesto tre
metri per sei che ritrae dei grappoli d’uva nelle mani di un agricoltore,
tutto è sporco di polveri di carbone; sotto l’immagine, la scritta “il
carbone sulle nostre tavole”, e il logo “No al carbone”.
Le immagini contese: una conclusione
Nel contemporaneo dibattito antropologico visuale ma non solo,
già da qualche tempo si riflette sulle modalità attraverso le quali i
movimenti sociali di vario tipo utilizzano i mezzi visuali per la produzione di immagini persuasive, come strumenti determinanti nelle
strategie di advocacy (Allen, 2009; Gregory, 2006; Harper, 2012;
McLagan, 2006; Peterson, 2013; Torchin, 2006) secondo diverse
prospettive e orientamenti che vanno dalla rivendicazione di determinati diritti umani nei contesti dominati da conflitti (Allen, 2009;
Gregory, 2006; Hinegardner, 2009; Torchin, 2006), ai processi
Le immagini e una sintesi del video sono reperibili su un blog creato dal movimento appositamente per il processo: http://siamotuttiparteoffesa.blogspot.
it/2013/10/nuova-udienza-del-processo-enel-in-aula.html
6
178
Andrea F. Ravenda
di fabbricazione di prove di legittimità per minoranze culturali (De
Lorenzo, 2006) oppure nelle rivendicazioni proprie della giustizia
ambientale (Harper, 2012). Un dibattito che si è spinto a riflettere in
maniera riflessiva anche sul ruolo giocato dall’antropologia applicata
partecipativa (Pink, 2007, 2012) sulle possibilità e sulle criticità nella
rappresentazione dell’alterità culturale, anche rispetto al tema della
sovranità visuale (Peterson, 2013). Allo stesso tempo il graduale aumento di possibilità tecnologica nella democratizzazione e diffusione
di mezzi, amplificati dalla potenzialità del web ha frammentato e al
contempo moltiplicato le produzioni creando nuove interconnessioni
e cortocircuiti tra dimensioni locali e transnazionali. Come messo
in evidenza da Meg McLagan in un articolo apparso nel 2006 su
American Anthropologist “in today’s globally mediated world, visual
images play a central role in determining which violences are redeemed
and which remain unrecognized” (McLagan, 2006:191). Un assunto
secondo cui “vedere è credere” che per essere perpetuato deve necessariamente essere sorretto da complessi meccanismi di produzione e
comunicazione visuale della testimonianza e della condivisione delle
“verità”. Facendo riferimento a un tale dibattito che nel suo insieme
appare dialogare con quello antropologico legale riferito alla produzione e negoziazione di verità legali nei dibattimenti processuali, le
immagini contese nel contesto Brindisino offrono spunti interessanti.
Le foto che ritraggono gli ortaggi sporchi di carbone sono al centro di
rapporti di forza molto articolati che nella tensione tra le compagnie
energetiche e i movimenti di protesta ne manipolano continuamente
il significato in una contesa che coinvolge diverse sfere della politica, della comunicazione, del diritto, dell’economia, della ricerca
scientifica, dell’azione e della vita quotidiana. Il rituale del dibattimento in aula sull’attendibilità delle prove visuali, sulle tecniche di
registrazione e riproduzione, stabilisce le soglie di attendibilità e di
veridicità delle immagini, che una volta fuori dal tribunale, entrano in
maniera influente nel dibattito pubblico attraverso i mezzi di comunicazione e le manipolazioni degli attivisti che le rendono strumenti
di controinformazione e di accusa nei confronti della compagnia
Immagini contese
179
energetica. Immagini contese che tornando nuovamente nelle aule
di tribunale – come sta avvenendo – assumeranno significati diversi,
nuovamente oggetto di manipolazione. Dopotutto già l’esempio della
festa patronale, o quello della campagna di comunicazione #guerrieri
avevano evidenziato la valenza performativa del mezzo visuale agito
su soglie difficilmente decifrabili, tra poetica e azione, tra politica e
comunicazione. Le immagini degli ortaggi sporchi, o il video, che
ritrae le polveri di carbone, sono inevitabilmente interconnessi ai documentari prodotti dagli attivisti, o alle campagne comunicative della
compagnia energetica e possono essere considerati da un punto di vista
antropologico soltanto nella tensione e nella contesa che li combina
in quanto rapporti di reciproca rappresentazione tra le parti e con la
realtà politica, come i tasselli del mosaico visuale che definisce il – e
che è definito dal – contesto etnografico.
180
Andrea F. Ravenda
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182
Paride Bollettin
Fabrizio Loce Mandes
Do invisível ao visível. Uma análise
etnográfica da representação visual da
surdez nos âmbitos artístico e clínico
Dall’invisibile al visibile. Un’analisi
etnografica della rappresentazione
visuale della sordità nell’ambito
artistico e clinico
Do invisível ao visível
183
O mundo percebido (como a pintura) é o conjunto do meu corpo,
e não uma multidão de indivíduos espaço-temporais – o invisível do
visível. É o seu pertencimento a um raio do mundo.
Merleau-Ponty
(D)a sala operatória
Mais ou menos às nove horas, o cirurgião começa a realizar a incisão atrás do ouvido da paciente. O corpo da mulher está no centro
da sala operatória, mas distinguir a pessoa embaixo dos inumeráveis
lençóis, para proteger e manter estéril o ambiente, é impossível. Do
corte efetuado com o bisturi, na pele depilada e de cor avermelhada
pelo líquido desinfetante, sai um pouco de sangue que, prontamente,
o cirurgião bloqueia com a cauterização de algumas veias, com um
instrumento que parece uma pinça. Começa-se a sentir um leve cheiro de queimado enquanto o cirurgião continua a cortar a carne e a
cauterizar as pequenas veias. Devagar, movo-me para ver um pouco
mais. Continua-se a cortar a pele e a carne para chegar na parte do osso
que sucessivamente será a abertura para o ouvido interno. O cheiro
fica cada vez mais frequente. Um pedaço de pele atrás do ouvido foi
levantado, deixando descoberta uma pequena abertura que mostra
uma parte do osso. O cirurgião começa a perfurar e, simultaneamente,
o enfermeiro banha com um líquido, através de uma pequena seringa,
a parte exposta. Segue-se com maior profundidade e detalhe: o microscópio eletrônico é ligado, a ponta da furadeira é trocada por uma
184
Fabrizio Loce Mandes
menor, redonda e com muitas lâminas ao redor. O cirurgião amplia
o buraco e continua no interior do tecido ósseo. Os dois monitores,
posicionados próximos dos pés e da cabeça da mulher, mostram
diretamente a visão da cirurgia nos mínimos detalhes. Observando o
desenvolver na contraluz é possível ver as pequenas partes de água
que se levantam juntamente com fragmentos ósseos.
Às 9:50, o primário e ao mesmo tempo principal cirurgião dessa
operação, entra na sala; depois de ter trocado de roupa, lavado e vestido as roupas adequadas, segue na cirurgia... A furadeira é trocada e
o som é mais intenso e forte. Ao mesmo tempo, o médico faz algumas
perguntas sobre a cirurgia e as partes do ouvido visíveis à assistente,
ela também observa com o microscópio. Não consigo ouvir bem, há
um pequeno rádio ligado que emite um zumbido contínuo e fastidioso.
Continuam perfurando profundamente... Eles procuram a cóclea. Ao
mesmo tempo, no interior da sala, chega um outro médico juntamente com seus assistentes, como se todos tivessem chegado no mesmo
momento, às 10:25. Agora, há 17 pessoas, incluindo eu, no interior
da sala operatória; a cirurgia é projetada, por meio das filmagens
efetuadas pelo microscópio eletrônico, nas duas telas que chamam
a atenção dos visitantes. De vez em quando, uma especialista aperta
um botão ao lado do aparelho de DVD que está gravando a operação
e, depois de alguns segundos, imprime um papel fotográfico com o
detalhe do microscópio. Faz mais cópias, algumas para o registro da
cirurgia, duas para seu estudo pessoal da matéria que coloca no bolso
de trás e, enfim, entrega duas delas para mim, as quais coloco em meu
caderno. O cirurgião pára e, depois de ter feito um buraco em uma
membrana (cocleostomia), tenta inserir na fenda um sutilíssimo cano
de plástico; trata-se de um cabo formado por eletrodos e a membrana
furada é a entrada para a cóclea.
O relato etnográfico aqui descrito faz referência a uma cirurgia
para o posicionamento do implante coclear1 (daqui em diante I.C.).
O implante coclear é uma operação realizada para melhorar a condição auditiva
de pessoas com hipoacusias [sintomas de diminuição da audição] permenente.
1
Do invisível ao visível
185
Consegui observar essa cirurgia no âmbito de um período de pesquisa
desenvolvido num hospital, dentro da clínica de otorrinolaringologia.
No começo de 2013, em seguida a meu pedido nunca burocratizado,
foi-me concedida, pelo primário de otorrinolaringologia, a realização
de uma temporada como observador no departamento por ele dirigido. Durante um dos nossos encontros no local, o cirurgião especializado em I.C. pediu-me para participar dessa operação, episódio que
se repetiu inúmeras vezes.
A fase etnográfica no interior da clínica faz parte de uma pesquisa antropológica mais ampla que, desde 2010, desenvolvo na Itália,
especificamente na região da Umbria, no centro-norte do país, sobre
as políticas associativas e sanitárias no âmbito da surdez. No campo
etnográfico surgem duas associações: a primeira é independente, constituída pelos pais dos áudio-lesos2 (healing impaired), a segunda tem
um reconhecimento “estadual” mais formal, l’Ente Nazionale Sordi
(ENS – Associação Nacional dos Surdos), formada por surdos3 (deaf).
As duas partes estão envolvidas em um debate sobre a abordagem
terapêutica a ser utilizada com a pessoa surda. Respetivamente, a primeira prefere uma comunicação oral e a outra uma comunicação de
sinais e bilíngue,4 mediante o uso da Lingua dei Segni Italiana5 (daqui
A palavra “audiolesos” é utilizada pela associação dos parentes em contraposição ao termo “surdos”. Tal palavra faz mais referência a uma condição patológica.
3
Existe usualmente uma convenção entre os estudiosos da Deaf Community e
das Sign Languages (SL) que diferencia “deaf” para indicar o distúrbio audiológico
e “Deaf”, com a letra maiúscula, para indicar os pertencentes à comunidade dos
surdos. No interior dos Deaf Studies, o uso de tal diferenciação foi atribuída a James Woodward, quando escreveu, em 1972, Implications for sociolinguistic research
amog the Deaf.
4
O termo “sinalizante” faz referência às pessoas surdas que usam a LIS, o termo
“bilíngue”, usualmente, aquelas que utilizam tanto a língua oral como aquela dos
signos.
5
A LIS é uma linguagem visual/gestual utilizada por alguns surdos que seguiram
um percurso educacional através do uso de signos, ou que mais tarde a escolheram
como método comunicacional preferencial. Em muitos estados europeus, as Línguas dos Signos são largamente oficializadas como “línguas”, na Itália tal reconhecimento não aconteceu.
2
186
Fabrizio Loce Mandes
em diante LIS). Uma discussão que vê as duas “facções” discordarem
sobre as noções de língua, palavra, doença, “cura” e desabilidade,
vivenciando uma verdadeira “battle of ideologies” (Blume, 2010, p. 18).
Diferentes “visões”
No âmbito do quadro geral descrito acima, tive a oportunidade de
observar o papel central das instituições sanitárias e em específico do
hospital, como espaços terapêuticos de relação, no interior dos quais
são realizados os exames, produzidos diagnósticos e escolhidos os
percursos, por meio dos quais se intervêm de acordo com os parentes.
Quando comecei minha pesquisa, em 2010, foquei a observação da
ENS provincial. Depois de aproximadamente dois anos de experiência etnográfica, com as relações instauradas, no campo de pesquisa,
exclusivamente com os surdos sinalizantes, o meu papel nesse complexo campo de forças foi percebido como “de parte” no interior do
debate e, portanto, contrastava com a abordagem oralista. Quando
encontrei o presidente da associação dos pais, em dezembro de 2012,
depois de inúmeros pedidos, ele não demorou em me explicitar a sua
discordância com uma interpretação da surdez como uma “cultura da
qual os Surdos com o ‘S’ maiúsculo fazem parte” e a culpar justamente
a antropologia por tal definição, afirmando sua oposição a uma “visão
antropológica da surdez”.6
Sucessivamente, em fevereiro do mesmo ano, apresentei-me na
sede da Regione Umbria para observar a estruturação de um protocolo regional que servisse como guia para orientar os pais de crianças
surdas e as instituições sanitárias no âmbito do percurso terapêutico.
A estruturação do documento, finalizado em dezembro de 2013, foi
organizada através da colaboração entre a Azienda Ospedaliera (Ospital) e a associação dos pais. Resolvi, assim, participar das reuniões,
depois do convite do primário da clínica de otorrinolaringologia,
6
Os materiais são retomados de minha entrevista com o presidente da associação.
Do invisível ao visível
187
onde já havia começado o meu período de observação etnográfica.
O encontro, cujo intuito era estruturar um percurso de reabilitação,
aprofundou o conceito auditivo da surdez, baseado exclusivamente em
um ponto de vista patológico, reproduzindo, assim, através das suas
conexões associativas, institucionais e sanitárias, também o aspecto
político do fenômeno.
Desse modo, começarei da análise da sala operatória, em particular da operação cirúrgica de um IC, como espaço teatral no interior
do qual a (re)produção de imagens e conhecimento, ligada a uma
transmissão visual, representa um momento fundamental e representativo da abordagem oralista baseada na associação/instituição médica.
Os estudos antropológicos recentes conectados com a prática
sanitária têm colocado em discussão a noção de “vision”, recolocandoa em um quadro mais amplo, ligado às práticas e à construção de
conhecimento (Grasseni, cur., 2009). De forma específica, o intento
era enfrentar o debate sobre as representações visuais e as possíveis
transmissões de saber, não como algo metafórico ou abstrato, mas sim
como um “processo atual que caracteriza a vida cotidiana em diferentes comunidades de práticas (Grasseni, 2009, p. 8). Através da análise
do processo de educação, no contexto sanitário, alguns autores têm
colocado em discussão o uso das imagens e das representações visuais,
mostrando a complexa construção social no interior do fenômeno ver/
conhecer (Saunders, 2009; Roepstorff, 2009).
A transmissão do saber médico ao redor da operação cirúrgica de
IC não termina no interior da sala operatória – mediante os aparelhos científicos, a disposição e a possibilidade de gravar e imprimir
imagens da operação. Aquelas imagens “roubadas” pela especialista
serão utilizadas para “estudar e aumentar o próprio conhecimento em
reconhecer as diferentes fases da operação e a estrutura interna que
leva até a cóclea”.7 Portanto, se analisa a intervenção cirúrgica como
uma “prática do mostrar”, nesse caso a surdez, através de uma ope-
As palavras relatadas são da especialista em medicina. Quando a cirurgia terminou, ela me explicou a razão pessoal para imprimir o material fotográfico.
7
188
Fabrizio Loce Mandes
ração que tem como fim a melhoria das condições auditivas – mediante
os cortes na pele e na carne, o “andar em profundidade” no tecido
ósseo e as imagens projetadas no monitor – sendo possível assistir a
uma representação objetificadora da patologia, dada pela concretude
da cirurgia e a exploração interna dos tecidos, e, ao mesmo tempo
política, através da escolha da protagonista em confiar no médico e
acompanhar o percurso previsto pelas políticas sanitárias. Uma representação e uma ação inscritas no corpo, onde médicos, instituições e
associações fazem parte de um complexo campo etnográfico.
Decidi começar pela descrição da cirurgia de IC, por duas motivações distintas, mas interligadas: a primeira, como explicitado
anteriormente, por representar a conexão entre a associação dos pais
e as instituições sanitárias, e, a segunda, como exemplo paradigmático da minha provável interferência no campo de pesquisa. Ao longo
dos meus encontros com os surdos da ENS, utilizava com frequência
alguns episódios etnográficos, inerentes aos meus pedidos de entrada
no âmbito sanitário, com o fim de suscitar reações e discussões.
Ao longo da pesquisa, os surdos que fazem parte da ENS provincial
não conseguiram instaurar um diálogo produtivo com as instituições
sanitárias e, portanto, decidiram utilizar os laboratórios teatrais e as
exposições artísticas para gerar uma produção visual heterogênea, que
pudesse contar a própria experiência pessoal da surdez. Começando
com um conhecimento do campo etnográfico e dos instrumentos
visuais, especificamente fotos e vídeo, decidi, em 2012, produzir um
documentário sobre esse tema. A partir da relação já instaurada com
os atores sociais, consegui organizar um laboratório teatral, com surdos
e ouvintes, com o objetivo de gravar as performances derivadas das
experiências pessoais, entendidas como formas de representação da
“doença”. O laboratório teatral e a possibilidade de filmar as ações
apresentadas foram inseridas em seguida no âmbito do próprio processo criativo por parte de um artista local surdo, chamado Daniele,
com o qual compartilhava as viagens de carro para ir aos ensaios.
Durante os nossos deslocamentos conversávamos muito sobre a
minha pesquisa e seu trabalho artístico. Como em breve ficará claro,
Do invisível ao visível
189
foi próprio o artista que utilizou as imagens de vídeo gravadas no
âmbito dos diferentes contextos etnográficos, para dar continuidade
a uma série de exposições sobre a sua vida, cruzando assim gravações
etnográficas, performances teatrais e esculturas em cerâmica.
O debate que aborda a antropologia visual aplicada (Pink, 2007)
evidenciou, por meio de abordagens teóricas, metodológicas, e, sobretudo, aplicadas da antropologia, o importante uso dos materiais
visuais, especialmente aqueles produzidos através da colaboração com
os atores sociais. A intenção foi demonstrar especificamente a maneira
pela qual as gravações etnográficas podem ser utilizadas como instrumento de representação da experiência, sem passar necessariamente
pelo documentário etnográfico. Como descreveram Richard Chaflen
e Michael Rich, que aprofundaram o uso das imagens na narração
em âmbito clínico, o uso da antropologia visual aplicada encontra as
próprias bases na representação da imagem, prescrevendo uma solução
para um problema específico, assim “que implementa a comunicação
e a relação entre comunidades interagentes, as quais às vezes têm
ideologias divergentes, se não opostas” (Chaflen; Rich, 2013, p. 53).
Levando em consideração o trabalho de Daniele e o seu cruzamento
com os materiais etnográficos, irei analisar duas exposições artísticas,
uma completa e a outra em andamento, como uma narrativa peculiar
voltada a representar a sua experiência pessoal. A partir da estruturação das suas obras surge a vontade de se confrontar, através da arte,
com o debate entre oralismo e linguagem dos signos no interior do
fenômeno da surdez.
As pesquisas socioantropológicas no campo da surdez muitas vezes
têm evidenciado a presença de uma polarização “nós surdos versus
vocês ouvintes”. Tal perspectiva dicotômica é apropriada por muitos
atores sociais para evidenciar uma diferente condição sensorial e um
sentimento de pertencimento a uma comunidade “outra”: aquela
dos que usam a linguagem dos signos (Padden, 2001; Sacks, 1991;
Nakamura, 2006). Uma dicotomia que tende a se enfraquecer em
uma perspectiva etnográfica capaz de colocar o fenômeno da surdez
no interior dos contextos culturais, sociais e políticos, caracterizados
190
Fabrizio Loce Mandes
por sua complexidade e contradição. No campo dos estudos sobre
os métodos comunicativos das pessoas surdas (Nakamura, 2006;
Padde; Humphries, 1988; 2005; Stokoe, 1976, só para citar alguns),
as pesquisas mostraram como os diferentes gestos/signos, movimentos
corpóreos, métodos linguísticos utilizados (Língua dos Signos, oralismo e bilinguismo) são o resultado de processos históricos específicos;
diferenças derivadas não só geograficamente, mas também e sobretudo
dos núcleos familiares, dos processos educativos e das relações com
as próprias instituições.
Desde outra perspectiva, a antropologia visual tem debatido
longamente as produções artísticas, obras pictóricas, esculturais e
teatrais, por parte dos surdos.8 Alguns autores em específico (Pade;
Humphries, 1988, 2005; Fjord, 1999; Silver, 1999; Cohen, 1989, só
para citar alguns) têm evidenciado não tanto a modalidade expressiva,
mas a temática peculiar que “reflete e representa a passagem de uma
retórica de vitimização a uma de resistência – a recusa da “ouvintização” [hearingization] das pessoas Surdas” (Durr, 1999, p. 47) e o
conjunto dos “valores da cultura Surda” (Schertz; Lane, 1999, p. 20).
É possível identificar em específico uma representação dicotômica
do fenômeno da surdez. Se por um lado há uma tentativa terapêutica,
que visa “melhorar” a condição auditiva, por outro lado, é possível
fazer surgir uma ação política, que vai além da noção de deficiência,
através de uma concepção não médica dos problemas ligados à surdez. Portanto, se os materiais visuais podem ser utilizados e considerados como instrumentos potentes de conhecimento, socialidade e
construção identitária (Grasseni, 2010), deriva disso uma utilização
diferente pelas partes: um médico, técnico e objetivante da patologia,
o outro subjetivo e ligado à experiência da surdez.
O número especial de Visual Anthropology Review de 1999, n. 15, issue 2, traz
reflexões interessantes nesse sentido.
8
Do invisível ao visível
191
“Pão”
Encontrei pela primeira vez Daniele em uma exposição de arte,
onde ele expunha algumas de suas obras. Entrando na sala, organizada como um laboratório dos artistas, vi um rapaz com próteses
auditivas que estava trabalhando com cerâmica. Ele estava de costas.
Não sabia como me dirigir a ele, e assim me coloquei diante de seu
rosto e tentei um golpe no ombro. Tirando-me do constrangimento,
ele imediatamente acendeu as próteses, que normalmente mantinha
desligadas para se concentrar no trabalho, e me explicou que sabia
ler os lábios, portanto não precisávamos do uso dos signos. A sua
paixão pela arte, surgida na escola secundária e continuada ao longo
da universidade, o levou a trabalhar com a cerâmica. Usualmente, ele
compõe obras que ele define de “natureza primordial”, redondas e
parecidas com invólucros. Através desses trabalhos, Daniele nunca
conseguiu encontrar para si um espaço na comunidade artística.
Quando o conheci, ele tinha perdido a pouco tempo o trabalho
como ceramista em uma pequena indústria familiar e teve que começar
a trabalhar às noites, como padeiro. Como artista, era fascinado pelo
intercurso paralelo entre a cerâmica e o pão. Contou-me que era interessado pela manipulação dos materiais com os quais trabalhava e a
natureza semelhante dos elementos utilizados em ambos os produtos:
água, terra, farinha, calor, ar, para o crescimento e a respiração das
obras de arte, mas sobretudo pela manipulação por parte de suas
mãos. Instigado pelo seu trabalho, e pelos meus incessantes pedidos
em poder observá-lo no trabalho, ele resolveu fazer das suas obras
uma exposição artística que foi especialmente apreciada pelos críticos e artistas locais. As obras de arte teriam sido formas de pães em
cerâmica. Unindo os dois trabalhos, decidiu utilizar algumas fôrmas
de pão, realizadas à noite, para fazer os modelos de giz que, em seguida, seriam recobertos por argila. O meu objetivo era filmá-lo ao
longo de todo o desenvolvimento. O tempo que passamos juntos e o
instrumento cinematográfico se revelaram eficazes para adentrar em
profundidade a sua história.
192
Fabrizio Loce Mandes
Três horas e nove minutos, Daniele em um sms: “ok, estou fora,
nos encontramos na tabacaria em frente”.
Pego a câmera já montada com o microfone e saio. Embaixo da
chuva, seguimos na rodovia que leva ao forno (figura 4), um galpão
no meio de um pequena zona industrial. Descemos do carro e com
passos firmes nos aproximamos da porta. Em um pequeno quarto
utilizado como camarim, ele abre seu armário onde tem seu uniforme
de trabalho, branco, com algumas sombras escuras, devido a manchas.
Ele retira as próteses colocando-as em cima do lavabo e começa a se
despir. Pega as duas camisetas e as veste com muita calma. A primeira
camiseta é muito justa, uma segunda pele, aquela do trabalho. Depois
coloca a superior, a calça, o chapéu, sempre de cor branca (figura
5), e enfim recoloca as próteses, não para o trabalho, mas para mim.
Como de hábito, ele começa a acender os vários aparelhos, como uma
máquina. Há um forte cheiro de farinha e de pão pronto. A poeira está
tanto no ar como no piso. O resultado das gravações é que Daniele
fica muito à vontade diante (de mim e) da câmera, dois observadores
externos no interior de “seu espaço”. Trabalha, conversa, abre-se como
raramente havia feito, mesmo sabendo que as imagens poderiam ter
sido usadas para qualquer coisa. Ele me conta do trabalho, da família,
da escola (figura 6).
Enquanto o pão está no forno, Daniele fuma um cigarro e me conta
de sua preocupação com o trabalho (figura 7); explica seu medo de
perder o trabalho, que ele gosta e gostaria de continuar:
Sabe, convencer alguém a contratar um surdo não é fácil. Mesmo que
você sinta algo, leia o labial, aprenda a interpretar o que escuta depois dos
duros anos de fonoaudiologia, sempre tem uma distância; os problemas
comunicativos, o medo de deixar um surdo trabalhando sozinho, sabe,
se acontece algo tenho que enviar um sms para o chefe e ele tem que
ligar para o técnico, as diferenças são muitas. Pelo menos aqui aprendi
um trabalho, para um futuro como padeiro, como pizzaiolo. Poderia me
fazer um currículo em vídeo, assim evito de falar. Nas buscas anteriores
de trabalho, depois de um tempo, evitava falar da surdez, fingia, mas as
próteses veem-se do mesmo jeito.”
Do invisível ao visível
193
Depois, sua psicóloga o apresentou ao proprietário do forno, que
estava procurando por alguém para entregar o pão. Depois de uma
longa conversa sobre a cerâmica, os fornos, a sua experiência com
os materiais plasmáveis por meio das mãos, o proprietário resolveu
fazer uma prova:
Aprendi imediatamente, foi suficiente observá-lo uma vez para repetir
os movimentos para fazer o pão, a única diferença é que um ouvinte
compreende os ruídos da máquina, eu ao contrário experimento a massa
com os olhos. Aprendi com a experiência a interpretar algum som, mas
é diferente. O ruído para mim raramente é razão de emoção. Para mim
as emoções vêm das vibrações.
Mudando logo de assunto, ele me pergunta:
Quando começa a falar uma criança? Quando eu era pequeno minha mãe
viu que algo não estava certo, era animado, mas tinha algo de estranho,
assim me fez o teste auditivo e perceberam que sou surdo profundo.
Sempre era ela que me levava para fazer fonoaudiologia. Se não entrava
comigo, olhava de fora, tentava aprender os exercícios para fazermos
juntos em casa. Mesmo que a fonoaudióloga não dissesse para ela, ela fazia
do mesmo jeito. Tinha que recuperar muito porque não falava. Lembro
de muitas cartas coloridas que representavam animais ou personagens.
Foi duro, ela se aplicou muito, em seis meses recuperei o tempo perdido. Mas foi duro, ela se cansou tanto que teve problemas – em outros
momentos Daniele me explicou que a mãe teve uma crise nervosa e sofre
de distúrbios psíquicos, quando conta isso, sempre diz que foi causado
pelo esforço que ela colocou na sua habilitação na língua oral – só ela
sempre me ajudou.
Daniele dá um longo suspiro e apaga de pressa o cigarro, o pão
está pronto.
Poucos dias depois, observamos juntos as gravações realizadas.
Decidimos utilizar uma montagem rápida, de “vídeo arte”, como
definia Daniele, para mostrar os dois aspectos do trabalho, fazendo
194
Fabrizio Loce Mandes
emergir dessa maneira as conexões entre os dois tipos de pão e os
contextos recíprocos de trabalho (figuras 8-14).
No interior da exposição (figuras 15-16), as obras eram colocadas
no centro da sala, com alguns recipientes diferentes ao redor, cestos de
plástico e sacos de papelão, cheios de alguns filetes de pão “verdadeiro” e aqueles de cerâmica. No fundo, estava o monitor que transmitia
repetidamente um vídeo de aproximadamente oito minutos sobre o
duplo processo profissional/artístico. Através do uso exclusivo das
obras artísticas, Daniele queria representar a conexão entre as duas
dimensões, aparentemente tão distantes. Dessa forma, enquanto artista, ele tinha a possibilidade de descrever os dois cenários, deixando
de lado algumas peculiaridades que o levaram até tal ponto. As obras
podiam evidenciar implicitamente o seu percurso. Por meio do vídeo,
realizado com gravações etnográficas, ele tinha decidido acrescentar
detalhes ulteriores e multissensoriais que compõem a sua cotidianidade. “Experimentar a massa”, “observar os instrumentos”, o “longo
respiro” para o cozimento do pão, “observar para aprender a fazer
o pão”, por meio de uma experiência pregressa de manipulação da
argila – são algumas das caraterísticas que podiam aparecer aos visitantes. Mas se a exposição em sua totalidade conseguia transmitir a
união entre os percursos profissional e artístico, o que escapava era a
conexão entre a sua condição auditiva e a trajetória que o tinha levado
até aquele ponto.
“Expresso a minha vida, expresso a minha vida”
Em um campo etnográfico complexo, onde as associações que se
ocupam de pessoas que vivem a experiência da surdez debatem há
tempos sobre as políticas de gestão do “déficit sensorial”, segundo
posições que oscilam de uma abordagem terapêutica (ausência ou
presença de próteses acústicas e implantes cocleares) a um enfoque
linguístico (oralista, dos signos e bilíngue), Daniele decidiu dar a sua
própria contribuição com a arte.
Do invisível ao visível
195
Através da mostra sobre sua obra ainda em curso, a intenção de
Daniele é a de representar três momentos distintos, mas estritamente
conectados, de seu percurso enquanto surdo: “quero fazer uma exposição que narre todo o percurso que segui, da doença à LIS, quero
mostrar que existe mais além da deficiência”.
A complexidade de narrar o próprio percurso e ao mesmo tempo
um campo etnográfico, no interior do qual as políticas sanitárias e
associativas têm um papel relevante, é enfrentada por Daniele, em três
momentos, que ele define como “cruciais”: a condição biológica da
patologia, o processo político/sanitário da habilitação oral e, enfim,
a língua dos signos, como uma escolha comunicativa.
Por meio dos esboços de duas obras ainda em andamento (figuras
18-19) é possível observar a intenção do protagonista de representar a
cóclea e a sua má-formação, que causa um tipo de surdez (neurossensorial), nesse caso aquela de Daniele. Trata-se especificamente de uma
interpretação que quer evidenciar ao espectador uma parte interna
do ouvido: a cóclea na sua forma estilizada de caracol. Na parte mais
escura do desenho, é apresentada a possível abertura da obra para
adentrar o seu interior, e assim poder observar e tocar as células ciliadas
representadas também em uma segunda grande escultura (figura 19).
Na segunda fase da exposição, ele decidiu utilizar algumas gravações etnográficas, que eu tinha realizado no interior do laboratório
teatral, entre usuários e surdos. O interesse era dirigido especificamente para as performances que tinham como objetivo mostrar a
interpretação do processo oralista. O vídeo deveria ser projetado em
uma tela, no interior de um corredor, sucessivo à sala utilizada pelas
obras da cóclea.
No interior do laboratório, consegui filmar uma improvisação de
três jovens surdos que representavam a própria escolha de utilizar a
língua dos signos. A cena acontece no interior de uma sala de aula
escolar, onde os rapazes, após as acusações de um professor em razão
do uso dos sinais, batem as mãos nas mesas; levantam-se em pé e
narram por meio dos signos a própria história e a escolha deliberada
em utilizar a LIS.
196
Fabrizio Loce Mandes
As imagens que seguem referem-se a essa encenação pouco antes
do espetáculo (figuras 20 e 21).
O fechamento do percurso narrativo da exposição prevê uma representação da LIS em uma sala com as obras que ilustram o alfabeto
na LIS. No interior das imagens, é possível observar a criação, no
laboratório de Daniele, de uma mão direita fechada a punho (figura
22), que representa a letra “A” do alfabeto, enquanto, na sala posterior,
uma possível instalação (figura 23) suspensa na parede.
Os casos etnográficos relatados neste trabalho representam de
forma diferente, mas estritamente correlata, diferentes (re)produções
visuais da surdez.
Se, no interior da sala operatória, por meio das ações do cirurgião
e dos outros protagonistas, é possível assistir uma representação que
visa objetificar a patologia, com a operação colocada em ato para uma
melhoria auditiva; na outra, com o uso das imagens etnográficas e das
obras artísticas, Daniele visa restituir a subjetividade e a pluralidade
de vozes do debate em curso.
Como mostram Chalfen e Rich, que refletiram sobre o uso aplicado
das Visual Illness Narratives:
O propósito da antropologia visual aplicada é de oferecer experiências de
produção e de sensibilidade cultural à representação visual da experiência
humana, e tentar utilizar as competências ao apresentar a informação
audiovisual para implementar transformações sociais. (2007, p. 53)
Portanto, se podemos considerar as exposições de Daniele, em
particular aquela em curso, como narrativas visuais complexas da
“doença”, então o constante diálogo entre imagens e antropologia
visual aplicada demonstra ser eficaz em mostrar a complexidade de
um campo etnográfico, nesse caso aquele da surdez.
Do invisível ao visível
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Fig 23
Fig 23
Dall’invisibile al visibile
207
Il mondo percepito (come la pittura) è l’insieme delle vie del mio corpo,
e non una moltitudine di individui spazio temporali - L’invisibile del visibile.
È la sua appartenenza a un raggio del mondo.
Merleau-Ponty
(Dal)la sala operatoria
Intorno alle ore 9 il chirurgo inizia ad effettuare l’incisione dietro
l’orecchio della paziente. Il corpo della donna è al centro della sala
operatoria, ma distinguere la persona sotto gli innumerevoli teli, per
proteggere e mantenere sterile l’ambiente, è impossibile. Dal taglio
effettuato con il bisturi sulla pelle rasata e di color rossiccio per il
liquido disinfettante, esce poco sangue che, prontamente, il chirurgo
ferma tramite la cauterizzazione di alcune vene, con uno strumento
rassomigliante una pinzetta. Si inizia a sentire un lieve odore di bruciato mentre il chirurgo continua a tagliare la carne e a cauterizzare
le piccole vene. Lentamente mi sposto per vedere un po’ di più. Si
continua a tagliare la pelle e la carne per arrivare alla parte dell’osso
che successivamente farà da apertura per l’orecchio interno. L’odore
aumenta. Il crepitio causato dalla pinzetta, come una moltitudine di
piccole bolle che scoppiano, diventa sempre più frequente. Il lembo di pelle posteriore all’orecchio è stato alzato lasciando scoperta
una piccola fessura che mostra una parte di osso. Il chirurgo inizia
a trapanare e, contemporaneamente, l’assistente irrora con un liqui-
208
Fabrizio Loce Mandes
do, tramite una piccola siringa, la parte esposta. Si va sempre più in
profondità e in dettaglio; viene accesso il microscopio elettronico,
cambiata la punta del trapano con una più piccola, rotonda e con
tante lame tutto intorno. Il chirurgo allarga il buco e continua all’interno del tessuto osseo. I due monitor posti rispettivamente ai piedi
e alla testa della donna mostrano in diretta la visione dell’operazione
nei suoi più minuti dettagli. Osservando lo svolgimento contro luce
è possibile vedere delle piccole parti d’acqua che si alzano insieme a
frammenti ossei.
Ore 9.50, il primario, e allo stesso tempo chirurgo principale di
questa operazione, entra in sala; dopo essersi cambiato, lavato e indossato gli abiti preposti prosegue l’operazione…Il trapano è cambiato e il suono è più forte e più intenso. Nel frattempo il medico
fa alcune domande sull’operazione e sulle parti dell’orecchio visibili
all’assistente, anche lei con il microscopio; non riesco a sentire bene,
c’è una piccola radio accesa che emette un brusio continuo e fastidioso. Continua a scavare e andare in profondità… Si continua a cercare,
si cerca la coclea. Nel frattempo all’interno della sala è arrivato un
altro medico insieme ai suoi assistenti, come se fossero venuti tutti allo stesso momento, ore 10:25. Adesso ci sono 17 persone, me
incluso, all’interno della sala operatoria; l’operazione è proiettata,
tramite la riprese effettuata dal microscopio elettronico Carl Zeiss,
sui due schermi che attirano l’attenzione dei visitatori. Ogni tanto
una specializzanda preme un pulsante di fianco all’attrezzatura dvd
che sta registrando l’operazione e, dopo alcuni secondi, ne esce fuori
una carta fotografica con il dettaglio del microscopio; ne stampa più
copie, alcune per il registro dell’intervento, un paio per il suo approfondimento personale della materia che infila nella tasca posteriore
della divisa e, infine, me ne porge due che infilo nel mio quaderno. Il
chirurgo si ferma e, dopo aver effettuato un buco su una membrana
(cocleostomia) (figura 2), cerca d’inserire all’interno della fessura un
sottilissimo tubo di plastica; si tratta di un particolare cavo formato
da elettrodi (figura 3), e la membrana bucata è l’ingresso per la coclea.
Dall’invisibile al visibile
209
Il resoconto etnografico qui descritto fa riferimento ad un intervento chirurgico per il posizionamento di un impianto cocleare1
(d’ora in poi I.C.). Sono riuscito ad osservare questa operazione
all’interno di un periodo di osservazione svolto presso un’azienda
ospedaliera, nello specifico la Clinica Otorino. All’inizio del 2013,
dietro una mia richiesta mai burocratizzata, mi fu concesso dal primario di otorinolaringoiatria di effettuare un periodo di osservazione
all’interno del reparto da lui diretto. Durante uno dei nostri incontri
presso la struttura il chirurgo, specializzato negli I.C., mi chiese di
partecipare a tale operazione, episodio che si è ripetuto più volte.
La fase etnografica all’interno della Clinica Otorino fa parte di
una più ampia ricerca antropologica che dal 2010 conduco in Italia, nello specifico in Umbria una regione del centro-nord del paese,
sulle politiche associative e sanitarie nell’ambito della sordità. Nel
campo etnografico emergono due associazioni: la prima è indipendente, costituita dai genitori degli audiolesi2 (hearing impaired), e la
seconda ha un riconoscimento “statale” più formale l’E.N.S. (National Association of Deaf), formata da Sordi3 (Deaf). Le due parti sono
coinvolte in un acceso dibattito riguardante l’approccio terapeutico
da utilizzare per la persona sorda, rispettivamente, la prima predi-
L’impianto cocleare è un’operazione che è eseguita per migliorare la condizione
uditiva di persone affette da ipoacusia permanente.
2
La parola “audiolesi” è utilizzata dall’associazione dei genitori in contrapposizione a quella di “sordo”. Tale termine fa riferimento maggiormente alla condizione
patologica.
3
Vi è di solito una convezione tra gli studiosi delle “Deaf community” e delle Sign
Languages (S.L.) che distingue l’uso di “deaf”, per indicare il disturbo audiologico,
e “Deaf”, con una “D” capitalizzata, per indicare gli appartenenti alla comunità dei
Sordi. All’interno dei Deaf Studies l’utilizzo di tale differenziazione è stata attribuita
a James C. Woodward quando nel 1972 scrisse “Implications for sociolinguistic
research among the Deaf”. Ho utilizzato tale convenzione in questo momento poiché i rappresentanti della National Association of Deaf hanno più volte esplicitato
l’appartenenza ad una “cultura Sorda”.
1
210
Fabrizio Loce Mandes
lige una comunicazione orale e l’altra una segnante, e bilinguista4,
mediante l’utilizzo di una Lingua dei Segni Italiana5 (d’ora in poi
L.I.S.). Una discussione che vede le due “fazioni” scontrarsi sulle
nozioni di lingua, parola, malattia, “cura” e disabilità dando vita ad
una vera e propria “battle of ideologies” (Blume, 2010: 18).
Differenti “visioni”
All’interno del quadro generale appena descritto ho avuto modo
di osservare il ruolo centrale delle istituzioni sanitarie e nello specifico l’ospedale, come spazi terapeutici di relazione all’interno dei quali
sono effettuati gli esami, prodotta una diagnosi e scelto il percorso
tramite cui intervenire di concerto con i genitori.
Quando iniziai la ricerca nel 2010, partii dall’osservazione
dell’Ente Nazionale Sordi provinciale. Dopo circa due anni di esperienza etnografica con le relative relazioni instaurate all’interno del
campo di ricerca esclusivamente con i sordi segnanti, il mio ruolo
in questo complesso campo di forze fu percepito come “di parte”
all’interno del dibattito e, pertanto, contrastante all’approccio riabilitativo oralista. Quando incontrai il presidente dell’associazione genitoriale nel dicembre del 2012, dopo continue richieste, non tardò
ad esplicitare la sua contrarietà ad una interpretazione della sordità
come una “cultura di cui i Sordi con la “S” maiuscola fanno parte”
ed ad incolpare proprio l’antropologia per tale definizione affermando l’opposizione ad “una visione antropologica della sordità”6.
Il termine “segnante” fa riferimento alle persone sorde che utilizzano una Lingua dei Segni. Quella “bilinguista”, di norma, si riferisce a chi utilizza sia la lingua
orale che quella dei segni.
5
La Lingua Italiana dei Segni è una lingua visivo/gestuale utilizzata da alcuni
sordi che hanno seguito un percorso educativo tramite l’uso dei segni, o che in tarda
età l’hanno scelta come metodo comunicativo preferenziale. In molti stati europei le
Lingue dei Segni sono largamente ufficializzate come “lingue”, in Italia, tale riconoscimento “statale” non è avvenuto.
6
I materiali sono ripresi da una mia intervista con il presidente dell’associazione.
4
Dall’invisibile al visibile
211
Successivamente, nel febbraio dello stesso anno mi sono presentato presso la sede della Regione Umbria per osservare la strutturazione di un protocollo regionale che servisse da guida per orientare
i genitori di bambini sordi e le istituzioni sanitarie all’interno del
percorso terapeutico; la strutturazione del documento, completato
nel dicembre del 2013, era stato organizzato tramite la collaborazione tra l’Azienda Ospedaliera e l’associazione genitoriale. Decisi di
partecipare alle riunioni, dopo l’invito da parte del primario della
clinica otorino all’interno della quale avevo già iniziato il mio periodo di osservazione etnografica. L’incontro, volto a strutturare un
percorso riabilitativo, approfondisce il disturbo uditivo della sordità
esclusivamente da un punto di vista patologico, riproducendo così,
attraverso le sue connessioni associative-istituzionali-sanitarie, anche
l’aspetto politico del fenomeno.
Pertanto, partirò dall’analisi della sala operatoria, in particolare
l’operazione chirurgica di un I.C., come uno spazio teatrale all’interno del quale la (ri)produzione di immagini e conoscenza, legata
ad una trasmissione visiva, rappresenta un momento fondamentale
e rappresentativo dell’approccio oralista individuato nell’associazione/istituzione medica.
I recenti studi antropologici connessi alla pratica sanitaria hanno
messo in discussione la nozione di “vision”, reinserendola in un più
ampio quadro legato alle pratiche e alla costruzione di conoscenza
(Grasseni, 2009). In modo particolare, l’intento era quello di affrontare il dibattito sulle rappresentazioni visuali e le possibili trasmissioni del sapere, non come qualcosa di metaforico o astratto, ma,
come un “actual process that characterises everyday life in different
communities of practice” (Grasseni, 2009: 8). Attraverso l’analisi del
processo di apprendimento nel contesto sanitario, alcuni autori hanno messo in discussione l’uso delle immagini e delle rappresentazioni
visuali mostrando la complessa costruzione sociale all’interno del fenomeno vedere/conoscere (Saunders, 2009; Roepstorff, 2009).
La trasmissione del sapere medico intorno all’operazione chirurgica di un I.C. non si ferma all’interno della sala operatoria – me-
212
Fabrizio Loce Mandes
diante l’attrezzatura scientifica a disposizione e la possibilità di registrare e stampare immagini dell’intervento – quelle foto “rubate”
dalla specializzanda saranno utilizzate per “studiare e aumentare la
propria conoscenza nel riconoscere le diverse fasi dell’operazione e
la struttura interna che porta verso la coclea”7. Pertanto, se si analizza l’intervento chirurgico come una “pratica del mostrare”, in questo
caso della sordità, attraverso un’operazione che ha come fine il miglioramento della condizione uditiva – mediante i tagli della pelle e
della carne, l’“andare in profondità” del tessuto osseo e le immagini
proiettate sui monitor – è possibile assistere ad una rappresentazione
oggettivante della patologia, data dalla concretezza dell’intervento
e l’esplorazione interna dei tessuti, e allo stesso tempo politica, mediante la scelta della protagonista di affidarsi al medico e seguire il
percosso previsto dalle politiche sanitarie; una rappresentazione e
un’azione inscritta nel corpo, dove i medici, le istituzioni e le associazioni fanno parte di un complesso campo etnografico.
Ho deciso di partire dalla descrizione dell’operazione chirurgica
dell’I.C. per due distinti ma correlati motivi: il primo, come esplicitato in precedenza, per rappresentare la connessione tra l’associazione
genitoriale e le istituzioni sanitarie, il secondo, come esempio paradigmatico della mia possibile modificazione del campo di ricerca.
Durante i molti incontri intercorsi con i sordi dell’E.N.S., utilizzavo
spesso alcuni episodi etnografici, inerenti le mie richieste d’entrata
nell’ambito sanitario, allo scopo di suscitare reazioni e discussioni.
Durante la mia ricerca, i sordi facenti parte dell’E.N.S. Provinciale non sono mai riusciti ad instaurare un dialogo proficuo con
le istituzioni sanitarie e pertanto, decisero di utilizzare i laboratori
teatrali e le mostre artistiche per dare vita ad una eterogenea produzione visuale che possa raccontare la propria esperienza personale
della sordità. Partendo da una conoscenza del campo etnografico
e degli strumenti visuali, foto e video in particolare, decisi nel 2012
Le parole riportate sono della specializzanda di medicina che, a intervento ultimato, mi spiegò il motivo della sua personale stampa fotografica.
7
Dall’invisibile al visibile
213
di produrre un documentario sulla tematica in questione. Dalla relazione ormai instaurata con gli attori sociali riuscii a organizzare un
laboratorio teatrale, con sordi e udenti, con lo scopo di registrare le
performance derivate da esperienze personali, intese come forme di
rappresentazione della “malattia”. Il laboratorio teatrale e la possibilità di filmare le azioni rappresentate, furono inseriti successivamente all’interno del proprio processo creativo da parte di un artista
locale sordo, Daniele, con il quale condividevo i viaggi in macchina
per dirigermi alle prove teatrali. Durante i nostri spostamenti discutevamo spesso della mia ricerca e del suo lavoro artistico. Come si
vedrà in seguito, fu proprio l’artista ad utilizzare le immagine filmiche registrate all’interno dei differenti contesti etnografici per dare
seguito ad una serie di mostre sulla sua vita, incrociando così riprese
etnografiche, performance teatrali e sculture in ceramica.
Il dibattito che ruota intorno all’antropologia visuale applicata
(Pink, 2007) ha evidenziato, mediante approcci teorici, metodologici, ma soprattutto applicativi dell’antropologia, l’importante utilizzo
dei materiali visuali, in modo particolare quelli prodotti tramite le
collaborazioni con gli attori sociali. Nello specifico l’intento è stato
quello di mostrare il modo in cui le riprese etnografiche possono
essere utilizzate come strumento per la rappresentazione dell’esperienza, senza passare necessariamente per il documentario etnografico. Come descritto da Richard Chalfen e Michael Rich, che hanno
approfondito l’uso delle immagini nella narrazione in ambito clinico,
l’uso di un’antropologia visuale applicata trova le sue basi nella rappresentazione dell’immagine prescrivendo una soluzione ad uno specifico problema, così “of improving communication and relationship
between interacting communities, which sometimes have diverging,
even opposing ideologies” (Chalfen e Rich, 2007: 53, in: Pink, 2007).
Prendendo in considerazione il lavoro di Daniele e il suo incrocio con i materiali etnografici andrò ad analizzare due mostre artistiche, una completa e l’altra in corso d’opera, come una particolare
narrazione volta a rappresentare la sua personale esperienza. Dalla
strutturazione delle sue opere emerge la volontà di confrontarsi, at-
214
Fabrizio Loce Mandes
traverso l’arte, sul dibattito tra oralismo e lingue dei segni all’interno
del fenomeno della sordità.
Le ricerche socio-antropologiche nel campo della sordità hanno
più volte evidenziato la presenza di una contrapposizione “Noi sordi\
Voi udenti”. Tale prospettiva dicotomica è fatta propria da molti attori sociali sordi per evidenziare una diversa condizione sensoriale e
un senso di appartenenza a una comunità “altra”: quella dei segnanti
(Padden, 2001; in: Duranti, 2001; Sacks, 1991; Nakamura, 2006).
Una dicotomia, questa, che tende a venir meno in una prospettiva
etnografica in grado di collocare il fenomeno della sordità all’interno
dei complessi e contraddittori contesti culturali, sociali e politici che
lo caratterizzano. Nel campo degli studi sui metodi comunicativi delle persone sorde (Nakamura, 2006, Padden C. - Humphries T. 1988,
2005, Stokoe W., 1976, solo per citarne alcuni) le ricerche hanno
mostrato come i differenti gesti/segni, movimenti corporei, metodi
linguistici utilizzati (Lingua dei Segni, oralismo e bilinguismo), siano il risultato di specifici processi storici; differenze derivate non
solo geograficamente, ma anche e soprattutto dai nuclei familiari, dai
processi educativi e dai rapporti con le stesse istituzioni.
In un altra prospettiva, l’antropologia visuale ha a lungo riflettuto
sulle produzioni artistiche, opere pittoriche, scultoree e teatrali da
parte dei sordi (si veda il numero monografico di Visual Anthropology Review del 1999, n. 15 Issue 2). In modo particolare alcuni
autori (Padden e Humphries, 1988, 2005; Fjord, 1999; Silver, 1999;
Cohen, 1989; solo per citarne alcuni) hanno sottolineato, non tanto la modalità espressiva, ma la peculiarità tematica che “reflect and
represent the shift from a rhetoric of victimization to resistance – a
rejection of the ‘hearingization’ of Deaf people” (Durr, 1999: 47) e
l’insieme dei “values of Deaf culture” (Schertz e Lane, 1999: 20).
Nello specifico è possibile individuare una dicotomica rappresentazione del fenomeno della sordità, se da una parte vi è un tentativo terapeutico con lo scopo di “migliorare” la condizione uditiva,
dall’altra è possibile far emergere un’azione politica che va oltre la
nozione di disabilità mediante una concezione non medica dei pro-
Dall’invisibile al visibile
215
blemi legati alla sordità. Pertanto, se i materiali visuali possono essere
utilizzati e considerati come un potente strumento della conoscenza,
socialità e costruzione identitaria (Grasseni, 2010), ne scaturisce un
differente uso dalle parti: uno medico, tecnico e oggettivante della
patologia, l’altro soggettivo legato all’esperienza della sordità.
“Pane”
Incontrai la prima volta Daniele presso una mostra d’arte, dove
esponeva alcune opere. Entrando nella sala, adibita come laboratorio per gli artisti, vidi un ragazzo con le protesi acustiche intento a lavorare la ceramica. Era di spalle. Non sapendo come rivolgermi a lui
mi affacciai verso il suo volto e accennai un colpo sulla spalla destra.
Togliendomi dall’imbarazzo immediatamente accese le protesi, che
di norma manteneva spente per concentrarsi sul lavoro, e mi spiegò
che sapeva leggere il labiale e non c’era bisogno di utilizzare i segni.
La sua passione per l’arte, nata nella scuola secondaria e proseguita
all’università, lo ha portato a lavorare con la ceramica. Solitamente
compone opere che lui definisce di “natura primordiale”, tondeggianti e simili ad involucri. Tramite questi lavori, Daniele, non è mai
riuscito a ritagliarsi uno spazio all’interno della comunità artistica.
Quando lo conobbi aveva da poco perso il lavoro come ceramista
in una piccola fabbrica a conduzione familiare, e si ritrovò a lavorare
di notte come panettiere. Come artista era affascinato dal parallelismo intercorso tra la ceramica e il pane. Mi raccontò che era attratto dalla manipolazione dei materiali con cui lavorava e la natura
similare degli elementi utilizzati in entrambi i prodotti: acqua, terra, farina, calore, aria per la levitazione e la respirazione delle opere
d’arte, ma soprattutto dalla manipolazione delle sue mani. Attirato
dal suo lavoro, e incuriosito dalle mie incessanti richieste per poterlo
osservare all’opera, decise di farne una mostra artistica che risultò
particolarmente apprezzata dai critici e dagli artisti locali. Le opere
d’arte sarebbero state delle forme di pane in ceramica. Unendo i due
216
Fabrizio Loce Mandes
lavori, decise di utilizzare alcune sfilatini, realizzati la notte, per farne
dei calchi con il gesso che, in seguito, avrebbe ricoperto con l’argilla.
Il mio obiettivo era di riprenderlo durante tutto lo svolgimento. Il
tempo trascorso insieme e lo strumento cinematografico si rivelarono efficaci per approfondire la sua storia.
Ore 3.09: Daniele sms “ok sono fuori ci vediamo al tabacchino
di fronte”.
Prendo la telecamera già montata con il microfono ed esco. Sotto
la pioggia continuiamo sulla superstrada che porta al forno (fig. 4),
un capannone nel mezzo di una zona industriale. Scendiamo dalla
macchina e con passo deciso si avvicina alla porta. In una piccola
stanza con bagno adibita a spogliatoio apre il suo armadietto dove
conserva la tenuta da lavoro, bianca, con qualche ombra scura dovuta alle macchie. Leva le protesi appoggiandole sul lavandino e inizia
a spogliarsi. Prende le due magliette e le indossa con molta calma. La
prima maglietta è molto stretta, una seconda pelle, quella del lavoro.
Poi quella superiore, pantaloni, pannella, cappello sempre di colore
bianco (figura 5) e infine risistema le protesi, non per il lavoro, ma
per me. Con abitudine e come una macchina inizia ad accendere
i vari macchinari. C’è un forte odore di farina e di pane cotto. Le
polveri sono tanto nell’aria quanto sul pavimento. Il risultato delle
riprese è che Daniele è molto a suo agio davanti (a me e) alla telecamera, due osservatori esterni all’interno del “suo spazio”. Lavora,
parla, segna, si è aperto come raramente ha fatto, pur sapendo che le
immagini potevano essere utilizzate per qualsiasi cosa. Mi racconta
del lavoro, della famiglia, della scuola. (figura 6).
Mentre il pane è nel forno, Daniele si ferma per fumare una sigaretta e mi narra della sua preoccupazione per il lavoro (figura 7). Mi
spiega la sua paura di perdere il posto, questo gli piace e lo vorrebbe
mantenere.
Sai, convincere una persona ad assumere un sordo non è facile. Anche
se senti qualcosa, leggi il labiale, impari ad interpretare quello che senti
durante i duri anni di logopedia c’è sempre un distacco; i problemi comunicativi, la paura di lasciare un sordo a lavorare da solo, sai se succede
Dall’invisibile al visibile
217
qualcosa devo mandare un sms al capo che poi chiama il tecnico, le differenze sono tante. Almeno qui ho imparato un mestiere, per un futuro
come fornaio, pizzaiolo. Potrei fare un curriculm video, così evito di parlare. Nelle ricerche passate del lavoro dopo un po’ ho evitato di parlare
della sordità, facevo finta di niente, ma le protesi si vedono lo stesso.
Poi la sua psicologa lo ha presentato al proprietario del forno perché cercava qualcuno nella consegna del pane. Dopo una lunga conversazione sulla ceramica, sui forni, sulla sua esperienza con le materie
plasmabili attraverso le mani, il datore ha deciso di metterlo alla prova.
Ho imparato immediatamente, mi è bastato osservarlo una volta per
replicare i movimenti per fare il pane, l’unica differenza è che un udente
capisce i rumori del macchinario, io invece tasto l’impasto e l’osservo.
Ho imparato con l’esperienza ad interpretare qualche rumore, ma è diverso. Il rumore per me raramente è fonte di emozioni. Per me le emozioni vengono dalle vibrazioni.
Cambiando subito argomento mi chiede:
Quando inizia a parlare un bambino? Quando ero piccolo mia madre
aveva visto che qualcosa non andava, ero vispo ma c’era qualcosa di
strano così mi hanno fatto la prova audiologica e hanno capito che ero
sordo profondo. Mi accompagnava sempre lei a fare logopedia. Se non
entrava con me osservava da fuori, cercava d’imparare gli esercizi per
farli insieme a casa. Anche se la logopedista non glielo diceva, lei lo
faceva lo stesso. Dovevo recuperare tanto poiché non parlavo. Ricordo
molte carte colorate che rappresentavano animali o personaggi. È stata
dura, si è molto applicata, in sei mesi ho recuperato il tempo perso.
Però è stata dura, si è talmente stancata che ha avuto problemi – in altri
momenti Daniele mi ha spiegato che la madre ha avuto un esaurimento
nervoso e soffre di alcuni disturbi psichici. Quando lo racconta dice
sempre che è stato causato dall’impegno che ha investito nell’abilitazione della lingua orale – mi ha sempre aiutato solo lei.
Daniele fa un lungo respiro e spegne frettolosamente la sigaretta,
il pane è cotto.
218
Fabrizio Loce Mandes
Pochi giorni dopo osservammo insieme le riprese effettuate. Decidemmo di utilizzare un montaggio veloce, di “video arte” come
lo definiva Daniele, per mostrare i due aspetti del lavoro così da far
emergere le connessioni tra i due tipi di pane e i reciproci contesti
lavorativi (figure 8-14).
All’interno della mostra (figure 15-16), le opere erano poste al
centro della sala, con intorno alcuni contenitori differenti, cestelli
di plastica e sacchi di cartone, riempiti con alcuni sfilatini di pane
“vero” e quello di ceramica. Sullo sfondo era posizionato il monitor che trasmetteva in loop un video di circa 8 minuti sul duplice
processo lavorativo/artistico. Attraverso l’uso esclusivo delle opere
artistiche, Daniele, voleva rappresentare la connessione tra i due
ambiti, apparentemente tanto distanti. In quanto artista, aveva la
possibilità di descrivere i due scenari tralasciando alcune peculiarità
che lo hanno portato fino al quel punto. Potevano essere le opere
ad evidenziare implicitamente il suo percorso. Attraverso il video
realizzato mediante riprese etnografiche, aveva deciso di aggiungere
ulteriori dettagli come quelli multi sensoriali che compongono la sua
quotidianità. “Tastare l’impasto”, “osservare i macchinari”, il “lungo respiro” per la cottura del pane, “osservare per imparare a fare
il pane” tramite un’esperienza pregressa di manipolatore di argilla,
sono solo alcune delle caratteristiche che potevano apparire ai visitatori. Ma se la mostra nella sua totalità riusciva a trasmettere l’unione
tra il percorso lavorativo e quello artistico, quello che sfuggiva era la
connessione tra la sua condizione uditiva e il percorso che lo aveva
portato fino a quel punto.
«Esprimo la vita, esprimo la mia vita»
In un campo etnografico complesso, dove le associazioni che si
occupano di persone che vivono l’esperienza della sordità dibattono
da tempo sulle politiche di gestione del “deficit sensoriale”, secondo
posizioni che oscillano dall’approccio terapeutico (assenza o presen-
Dall’invisibile al visibile
219
za di protesi acustiche e impianti cocleari) a quello linguistico (oralista, segnante e bilinguista), Daniele decise di portare il suo personale
contributo utilizzando l’arte.
Attraverso la mostra progettata, ancora in corso d’opera, l’intento
di Daniele è di rappresentare tre momenti distinti ma strettamente connessi al suo percorso di Sordo: “Voglio fare una mostra che
racconta tutto il percorso che ho seguito, dalla malattia alla L.I.S.,
voglio mostrare che c’è dell’altro oltre la disabilità”.
La complessità nel narrare il proprio percorso, e allo stesso tempo il campo etnografico all’interno del quale le politiche sanitarie e
associative giocano un ruolo fondamentale, è affrontata da Daniele
tramite tre momenti che lui stesso definisce “cruciali”: la condizione
biologica della patologia, il processo politico/sanitario dell’abilitazione orale e, concludendo, la lingua dei segni come una scelta comunicativa.
Attraverso gli schizzi riportati di due opere ancora in corso (figura 18, figura 19) è possibile osservare l’intenzione del protagonista
di rappresentare la coclea e la sua malformazione che causa un tipo
di sordità (neurosensoriale vedere nota 1), in questo caso quella di
Daniele. Nello specifico, nella figura 18, si tratta di un’interpretazione che vuole mostrare al visitatore una parte interna dell’orecchio: la
coclea nella sua forma stilizzata di chiocciola. Nella parte più scura
del disegno è riportata la possibile apertura dell’opera, per accedere
al suo interno, così da osservare e toccare le cellule cigliate, rappresentate anche in una seconda grande scultura (figura 19).
Nella seconda fase della mostra decise di utilizzare alcune riprese etnografiche che avevo girato all’interno del laboratorio teatrale
tra sordi e udenti. In modo particolare, l’interesse era rivolto alle
performance che avevano come obiettivo quello di mostrare l’interpretazione del percorso oralista. Il video dovrebbe essere proiettato
su di uno schermo all’interno di un corridoio, successivo alla sala
predisposta per le opere della coclea.
All’interno del laboratorio riuscii a filmare un’improvvisazione di
tre ragazzi sordi che rappresentavano la loro scelta di utilizzare la lin-
220
Fabrizio Loce Mandes
gua dei segni. La scena si svolge all’interno di una classe scolastica dove
i ragazzi, dopo le accuse ricevute dal maestro a causa dell’utilizzo dei
segni, sbattono i pugni sui banchi; alzandosi in piedi, tramite i segni,
raccontano la loro storia e la libertà di scelta nell’utilizzo della L.I.S.
Le immagini che seguono fanno riferimento alla messa in scena
poco prima dello spettacolo finale (figura 20, figura 21).
La chiusura del percorso narrativo/mostra prevede una raffigurazione della L.I.S. mediante una stanza con opere che illustrano
l’alfabeto nella Lingua dei Segni Italiana. All’interno delle immagini
è possibile osservare la creazione, all’interno del laboratorio di Daniele (figura 17), di una mano destra, chiusa a pugno (figura 22),
rappresentante la lettera A dell’alfabeto, mentre nella successiva una
possibile istallazione (figura 23) tramite sospensione sulla parete.
I casi etnografici riportati all’interno di questo lavoro rappresentano in modo differente, ma strettamente correlato, differenti (ri)
produzioni visuali della sordità.
Se all’interno della sala operatoria, mediante le azioni del chirurgo e degli altri protagonisti, è possibile assistere ad una rappresentazione che tende ad oggettivare la patologia, tramite l’operazione
messa in atto per il miglioramento uditivo, dall’altra Daniele, attraverso l’uso delle immagini etnografiche e delle opere artistiche, tende a restituire soggettività e una pluralità di voci al dibattito in corso.
Come mostrato da Chalfen e Rich, che si sono occupati dell’uso
applicativo delle Visual Illness Narrative,
the purpose of the applied visual anthropologist is to offer production
experience and socio cultural sensitivity to the visual representation of
human experience, and exert skills in presenting the audiovisual information to implement social change (Chalfen e Rich, 2007: 53).
Pertanto, se si possono considerare le mostre di Daniele, in particolar modo quella in corso, come delle complesse narrazioni visuali
della “malattia”, allora il costante dialogo tra le immagini e l’antropologia visuale applicata risulta efficace nel mostrare la complessità
di un campo etnografico, in questo caso della sordità.
Dall’invisibile al visibile
221
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Fabrizio Loce Mandes
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Os autores/Gli autori
223
Os autores/Gli autori
Paride Bollettin
Pós-doutorando no Centro de Estudos Ameríndios da Universidade de São Paulo com um financiamento da Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo. Publicou os livros: Amazzonia Indigena (Roma: Bulzoni, 2008), Ricerca sul Campo in Amazzonia (Roma:
Bulzoni, 2009), Lévi-Strauss. Visto dal Brasile (Padova: Cleup 2011)
e a serie Etnografie Amazzoniche, 3 Volumi (Padova: Cleup, 20122013), além de vários outros artigos. É sócio fundador da Associação
Contro-Sguardi e a anos organiza o homônimo Festival Internacional
de Cinema Antropológico.
Borsista di Post-Dottorato presso il Centro de Estudos Ameríndios
della Universidade di São Paulo, con un finanziamento della Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Ha pubblicato
i volumi: Amazzonia Indigena (Bulzoni, 2008), Ricerca sul Campo in
Amazzonia (Bulzoni, 2009), Lévi-Strauss. Visto dal Brasile (Cleup
2011) e la serie Etnografie Amazzoniche, 3 Volumi (Cleup, 2012),
oltre a vari altri articoli. È socio fondatore dell’Associazione ControSguardi e da anni organizza l’omonimo Festival Internazionale di
Cinema Antropologico.
224
Os autores/Gli autori
Sylvia Caiuby Novaes
Professora Titular no Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo e Coordenadora do Laboratório de Imagem
e Som em Antropologia. Suas pesquisas entre os índios Bororo de
Mato Grosso, resultaram nos livros: Mulheres, Homens e Heróis - dinâmica e permanência através do cotidiano da vida Bororo (São Paulo:
FFLCH-USP, 1986) e Jogo de Espelhos - imagens da representação de
si através dos outros (São Paulo: EDUSP, 1993), traduzido e publicado
pela University of Texas Press – The Play of Mirrors (1997), além de
vários outros artigos. A partir de 1990 enveredou pela Antropologia
Visual, fez pós doutoramento nesta área na Inglaterra e publicou
vários artigos.
Professoressa Ordinaria al Departamento de Antropologia della
Universidade de São paulo e Coordinatrice del Laboratório de Imagem
e Som em Antropologia. Le sue ricerche tra gli indigeni Bororo del
Mato Grosso hanno prodotto i libri: Mulheres, Homens e Heróis –
dinâmica e permanência através do cotidiano da vida Bororo (São Paulo:
FFLCH-USP, 1986) e Jogos de Espelhos – imagens de representaçnao de
si através dos outros (São Paulo: Edusp, 1993), tradotto e pubblicato
dalla University of Texas Press – The Play of Mirrors (1997), oltre a
vari altri articoli. A partire dal 1990 si è interessata all’Antropologia
Visuale, ha realizzato un post-dottorato sul tema in Inghilterra e ha
pubblicato numerosi articoli.
Rose Satiko Hikiji
Professora do Departamento de Antropologia da Universidade de
São Paulo, vice-coordenadora do LISA e do GRAVI e coordenadora
do PAM. É autora dos livros Imagem-violência – Etnografia de um
cinema provocador (São Paulo: Terceiro Nome, 2013) e A música e
o risco (São Paulo: Edusp; Fapesp, 2006), coautora de Lá do Leste
(São Paulo: Humanitas, 2013), e é coorganizadora de Antropologia
Os autores/Gli autori
225
e performance (São Paulo: Terceiro Nome, 2013), Escrituras da imagem (São Paulo: Edusp, 2004) e Imagem-conhecimento (São Paulo:
Papirus, 2009). Realizou diversos filmes etnográficos, entre eles A
Arte e a Rua (2011), Lá do Leste (2010), Cinema de Quebrada (2008)
e Pulso, um vídeo com Alessandra (2006) e os webdocumentários Lá
do Leste (http://ladoleste.org), Bixiga em Artes e ofícios (http://www.
yayabixiga.com.br).
Professoressa Associata del Departamento de Antropologia della
Universidade de São Paulo, vice-coordinatrice del LISA e del GRAVI
e coordinatrice del PAM. È autrice dei libri: Imagem-violência – Etnografia de um cinema provocador (São Paulo: Terceiro Nome, 2013)
e A música e o risco (São Paulo: Edusp; Fapesp, 2006), coautrice de Lá do Leste (São Paulo: Humanitas, 2013), ed é co-organizzatrice di
Antropologia e performance (São Paulo: Terceiro Nome, 2013), Escrituras da imagem (São Paulo: Edusp, 2004) e Imagem-conhecimento (São
Paulo: Papirus, 2009). Ha girato diversi film etnografici, tra i quali A
Arte e a Rua (2011), Lá do Leste (2010), Cinema de Quebrada (2008)
e Pulso, um vídeo com Alessandra (2006) e i documentari sul web Lá
do Leste (http://ladoleste.org), Bixiga em Artes e ofícios (http://www.
yayabixiga.com.br).
Renato Athias
Professor de antropologia e coordenador do Núcleo de Estudos e
Pesquisas sobre Etnicidade da Universidade Federal do Pernambuco
(UFPE). É membro do Laboratório de Antropologia Visual do Núcleo
Imagem e Som & Ciências Humanas da UFPE. Foi coordenador nacional do Grupo de Trabalho “Antropologia Visual” da Associação
Brasileira de Antropologia, bem como Diretor da Associação Nacional
de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Atualmente é o Coordenador
Geral de Museus da Fundação Joaquim Nabuco em Recife e Diretor
do Festival do Filme Etnográfico do Recife.
226
Os autores/Gli autori
Professore Associato di antropologia e coordinatore del Núcleo
de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade della Universidade Federal
do Pernambuco (UFPE). È membro del Laboratório de Antropologia Visual del Núcle de Imagem e Som & CiIencias Humanas da
UFPE. È stato il coordinatore nazionale del Grupo de Trabalho
“Antropologia Visual” della Associação Brasileira de Antropologia,
come anche Direttore della Associação Nacional de Pós-Graduação
em Ciências Sociais. Attualmente è il Coordenador Geral de Museus
della Fundação Joaquim Nabuco a Recife e Direttore del Festival do
Filme Etnografico do Recife.
Allison Jablonko
Realizou pesquisas de campo entre os Maring da Papua Nova
Guiné utilizando o filme como base para a observação e a analise da
dança e dos momentos de vida. Foi uma grande promotora da preservação e da manutenção das filmagens etnográficas. Colaborou em
fundar a Society for Visual Anthropology (SVA) em 1984 na American
Anthropological Association e ajudou a criar a SVA Conference on
Visual Research.
Ha realizzato ricerche di campo tra i Maring della Papua Nuova
Guinea utilizzando il film come mezzo per l’osservazione e l’analisi
della danza e dei momenti di vita. È stata una grande promotrice
della preservazione e della manutenzione delle riprese etnografiche.
Ha collaborato alla fondazione della Society for Visual Anthropology
(SVA) nel 1984 della American Anthropological Association e ha
aiutato a creare la SVA Conference on Visual Research.
Tullio Seppilli
Antropólogo italiano, Presidente honorário do Festival dei Popoli,
preside a Società Italiana di Antropologia Medica (S.I.A.M.) e a Fon-
Os autores/Gli autori
227
dazione Angelo Celli por uma cultura da saúde. Fez parte dos comitês
diretivos das revistas “Critica Marxista” e “La questione criminale”.
Dirige a revista especializada “AM. Rivista di Antropologia Medica”
e a serie “Biblioteca di Antropologia Medica”.
Antropologo italiano, Presidente onorario del Festival dei Popoli,
presiede la Società Italiana di Antropologia medica (S.I.A.M.) e la
Fondazione Angelo Celli per la cultura della salute. Ha fatto parte
dei comitati direttivi delle riviste “Critica marxista” e “La questione
criminale”. Dirige la rivista specialistica “AM. Rivista di Antropologia
medica” e la collana “Biblioteca di Antropologia Medica”.
Andrea Ravenda
Professor de antropologia cultural na Università degli Studi di
Perugia. Conseguiu o doutorado em Metodologie della Ricerca EtnoAntropologica na Università degli Studi di Siena. Em 2011 publicou
a monografia: Alì fuori dalla legge. Migrazione biopolitica e stato di
eccezione in Italia (Verona: ombre corte, 2011).
Professore a contratto di antropologia culturale presso l’Università
degli Studi di Perugia. Ha conseguito il dottorato in Metodologie della
ricerca Etno-Antropologica (Mrea) presso l’Università degli Studi di
Siena (2009). Nel 2011 ha pubblicato la monografia: Alì fuori dalla
legge. Migrazione biopolitica e stato di eccezione in Italia (Verona:
ombre corte, 2011).
Fabrizio Loce Mandes
Doutorando em Antropologia na Università degli Studi di Perugia,
onde desenvolve uma pesquisa sobre as politicas sanitárias relativas à
surdez. Ao longo dos anos se especializou nas técnicas de filmagem e
documentação visual utilizadas em pesquisas etnográficas sobre diferentes temáticas. Enquanto membro da Associação Contro-Sguardi,
228
Os autores/Gli autori
da qual é Presidente desde 2012, organiza, com os outros associados,
o homônimo Festival de Cinema Antropológico e encontros de antropologia visual.
Dottorando di ricerca in Antropologia presso l’Università degli
Studi di Perugia con una ricerca sulle politiche sanitarie e associative
riguardanti la sordità. Negli anni si è specializzato sulle tecniche di
ripresa e di documentazione visuale utilizzate in ricerche etnografiche
su differenti tematiche. Come membro dell’Associazione ControSguardi, di cui è Presidente dal 2012, organizza, insieme agli altri
associati, l’omonimo Festival di Cinema Antropologico e incontri
sull’antropologia visuale.
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
229
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
reitor da Universidade de São Paulo Marco Antonio Zago
vice-reitor da Universidade de São Paulo Vahan Agopyan pró-reitora de cultura e extensão universitária Maria Arminda do Nascimento Arruda
pró-reitor de pesquisa José Eduardo Krieger
pró-reitor de graduação Antonio Carlos Hernandes
pró-reitora de pós-graduação Bernadete Dora Gombossy de Melo Franco
PRÓ-REITORIA DE CULTURA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
pró-reitora de cultura e extensão universitária Maria Arminda do Nascimento Arruda
230
Paride Bollettin
pró-reitor adjunto de extensão universitária Moacyr Novaes
pró-reitora adjunta de cultura Marina Mitiyo Yamamoto
suplente da pró-reitora Lucas Antônio Moscato
assessores técnicos de gabinete
José Nicolau Gregorin Filho
Rubens Beçak
CINUSP
diretora
Patricia Moran Fernandes
vice-diretora
Esther Hamburger
coordenador de produção
Thiago de André
coordenador de programação
Marcos Kurtinaitis
estagiária de comunicação
Juliana Domingos de Lima
estagiários de produção
Afonso Moretti
Ana Julia Travia
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
231
Breno Benedyct
Bruna Mass
Cauê Teles
Cédric Fanti
Henrique Figueiredo
Lorena Duarte
Mariani Ohno
projecionista
Fransueldes de Abreu
secretária
Maria José Ipólito
auxiliar administrativa
Maria Aparecida Santos
LABORATÓRIO DE IMAGEM E SOM EM ANTROPOLOGIA
coordenadora
Sylvia Caiuby Novaes
vice-coordenadora
Rose Satiko Gitirana Hikiji
especialista em conservação e restauro
Mariana Vanzolini
documentação
Paula Morgado
especialistas audiovisuais
Leonardo Fuzer
Ricardo Dionisio Fernandes
232
Paride Bollettin
CENTRO DE ESTUDOS AMERÍNDIOS
coordenadora
Dominique Tilkin Gallois
vice-coordenador
Eduardo Góes Neves
ISTITUTO ITALIANO DI CULTURA DI SÃO PAULO
diretor
Renato Poma
vice-diretora
Livia Raponi
Contro-Sguardi: olhares, encontros e diálogos na antropologia visual
233
234
Paride Bollettin
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