UNIVERSIDADE CATÓLICA DO SALVADOR Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação Mestrado/Doutorado em Família na Sociedade Contemporânea LUZILÂNDIA MARIA MACÊDO DE SANTANA FAMÍLIA EM MUDANÇA: A CONTRIBUIÇÃO DO PAI NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS Texto apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica do Salvador – UCSAL-BA - como avaliação da disciplina Família e Educação. Linha de Pesquisa: Família nas Ciências Sociais Orientador: Prof. Dr. Giancarlo Petrini Professores Responsáveis: Prof.ª Dra. Gilca Carrera e Prof. Dr. José Eduardo Santos Salvador -Bahia 2020 FAMÍLIA EM MUDANÇA: A CONTRIBUIÇÃO DO PAI NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS Luzilândia Santana* Gilca Oliveira Carrera ** José Eduardo Ferreira Santos*** RESUMO O presente trabalho apresenta relatos e reflexões sobre o tema família contemporânea nas aulas da disciplina Família e Educação. Aborda o conceito de família em mudança e o seu envolvimento na educação, bem como a contribuição do pai na educação dos filhos. Palavras-chave: Família, educação, pai, mudança. ABSTRACT ave: Família; pai; políticas sociais/familiares. This paper presents reports and reflections on the contemporary Family theme in the Family and Education classes. It addresses the concept of a family that changes over time, with an emphasis on the father's contribution to the education of his children. Keywords: Family, education, father, change. Tentar conceituar ou definir família na contemporaneidade é um ato complexo, haja vista, vários estudos apontam para a amplitude que envolve tal temática, a começar pelo ramo das ciências de interesse: psicologia, sociologia, direito, dentre outras. No entanto, diante de várias leituras, observa-se que todos concordam que a família é uma instituição ou agrupamento humano muito antigo. Se é considerado um agrupamento humano, verifica-se a necessidade de estudar e compreender como essas pessoas convivem, se relacionam, se entendem ou desentendem, se percebem como sujeitos, se estão atentas aos seus direitos e * Mestranda do Programa de Pós-graduação em Família na Sociedade Contemporânea (UCSAL); Graduação em Letra (UEFS); [email protected] **Doutora em Educação (UFBA). Mestre em Educação (UFBA). Graduação em Serviço Social (UCSAL). gilcacarrer[email protected]. ***Doutor em Saúde Pública (UFBA); Mestre em Psicologia (UFBA). Graduação em Pedagogia (UCSAL). [email protected]. deveres etc. Nessa perspectiva, observa-se a extensão de fatores que influenciam para se conceituar ou definir o que é família na contemporaneidade. Conforme Flexor (2015, p. 23), Definir o conceito de família é uma tarefa difícil, por se tratar de um tema muito amplo e que muda, na linha do tempo de longa duração, em função das características sociais, econômicas, culturais, educacionais e legais; por isso mesmo, continua incompleto e, frequentemente, já está ultrapassado. Ao longo da história brasileira a família passou por transformações importantes que, diretamente, influenciaram nas relações de seus membros, desde o patriarcalismo até os dias atuais, pois ela participa dos dinamismos próprios das relações sociais e sofre as influências do contexto político, econômico e cultural no qual está imersa (PETRINI, 2005, p. 42). Isto mostra o quanto a família fica vulnerável diante das mudanças sociais, empenhando-se em reorganizar aspectos da sua realidade que o ambiente sociocultural vai alterando (PETRINI, 2011). Devido ao seu histórico, entende-se a relevância do envolvimento dos vários campos das ciências em tentar compreendê-la. Sabendo-se que se trata de uma temática universal, deve-se tratá-la com clareza diante de tantas dinâmicas que as envolve. Neste sentido, Sarti (2004) esclarece que as relações familiares não sejam naturalizadas e que a família não se torne um terreno fértil para um discurso normativo. Por isso, Cúnico e Arpini (2013) entendem que, ao se tentar definir família, não basta valer-se apenas de um ponto de vista, mas sim, é preciso conhecer qual a sua história e como se deram as mudanças que justificam a pluralidade de organizações familiares presentes em nossa realidade. A família, conforme Dessem e Polônia (2007), é considerada a primeira instituição social que, em conjunto com outras, busca assegurar a continuidade o bem-estar dos membros e da coletividade, incluindo o bem-estar da criança. Assim, esta é a responsável para alicerçar o comportamento do ser humano para viver nas diferentes formas de se relacionar com o mundo exterior e escrever a sua história. Diante de tantos desafios que são lançados na atualidade, a família tem uma parceira que poderia ajudar na formação da criança: a educação escolar. Porém, elas estão longe de se entenderem e incorporar as reais necessidades na construção de novas gerações, principalmente, nas classes populares. Pesquisas mostram que os meios e o vigor das relações entre escola e família variam conforme vários fatores: classe social, escolarização dos pais, tradição, meio rural ou urbano, profissão dos pais, região, etc. De acordo com Faria Filho (2000, p. 44), Constata-se, também, um outro elemento: seja devido a mudanças pelas quais nas últimas décadas têm passado a família, seja em face das constantes e, às vezes, radicais alterações observadas na escola, bem como da consequente discussão (e incertezas) acerca do lugar dessas instituições na formação das novas gerações, observa-se hoje uma exaltação das necessidades de se estabelecer um efetivo diálogo entre a escola e a família. A necessidade de se estabelecer o efetivo diálogo entre escola e família é, de fato, uma emergência. Alguns estudos mostram a complexidade desse vínculo. “A quem caberia a responsabilidade de construir essa relação? ”, perguntam Oliveira e Marinho-Araújo (2010). As autoras escreveram um artigo mostrando a visão da escola, dos pais e dos alunos e consideraram que, “em virtude dessa marca de entrelaçamento entre a família e a escola, as posturas relacionadas a esta relação caracterizam-se por ser defensivas e acusativas, como se cada um buscasse se justificar e encontrar razões para a desarmonia que caracteriza tal relação” (OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010, p. 107) Diante de tantas controvérsias entre família e escola, a mãe era a única a se preocupar com a educação e, ainda hoje, é a mais presente quando se trata deste assunto, segundo estudos. Devido a imagem rude e fria do pai na história, muito tem se questionado sobre o seu relacionamento e envolvimento na escolarização dos filhos. Por muito tempo a figura do pai foi vista como um turbilhão de conflitos, desde narrativas da mitologia grega às inconstantes relações propostas pela sociedade pós-moderna. No Brasil as primeiras pesquisas a respeito da formação da família surgiram com Gilberto Freyre (1933), marcadas sob o regime econômico patriarcal, com características de autoridade paterna prevalecente, desconsiderando qualquer relação afetiva com as crianças. Assim nos relata o historiador Otávio Tarquinio de Sousa (1954), exercendo sua crítica literária em O Jornal (Rio de Janeiro): Nos tempos patriarcais, homem e menino viviam socialmente afastados, não se comunicavam. E se na casa-grande isso se dava, a educação que os meninos recebiam nos únicos colégios de então, que eram os dos padres, em nada concorria para modificar o estado de coisas. Ao contrário, às crianças não se deixava nenhuma iniciativa, sufocando-se o que pudesse haver nelas de espontâneo. A família patriarcal estudada por Gilberto Freyre (1994) entrou em falência e com ela, a figura do pai foi-se decaindo à medida que a sociedade tomava novos rumos. Em um cenário de incertezas, de uma cultura do efêmero (LIPOVETSKY, 1989) e do autoritarismo associado ao modelo patriarcal, a figura do pai é a primeira a entrar em decadência nas relações familiares. O pai emerge na história marcado por posturas contraditórias, ora como relação de dedicação e cuidado com os filhos e dos filhos adultos para com os pais idosos, ora como lugar de conflito (PETRINI, 2019, p. 41), basta observar, ao longo da história, narrativas dramáticas da mitologia grega alusivas às relações entre pais e filhos; Gilberto Freyre (2003) caracteriza o pai da família patriarcal como o provedor, o dominador e o agregador da família. Na contramão da história, Morandé (2005) diz que a família representa uma esperança para a sociedade e para a cultura atual, apesar da institucionalização progressiva de uma cultura do “pai ausente”. É possível perceber que, em algumas famílias, há o desejo de exigências capazes de fortalecer sua convivência, emergindo a busca da felicidade e uma melhor interação na relação familiar. O acompanhamento paterno na escolarização dos filhos ainda é um tema escasso e pouco estudado. Zucoloto e Moreira (2016) fizeram uma pesquisa intitulada “Infância, sua educação e envolvimento paterno no processo de escolarização de crianças: concepções da equipe pedagógica e de alunos do Ensino fundamental I de uma escola particular de Salvador”, que consistiu em um estudo desenvolvido pela primeira e supervisionado pela segunda. As autoras analisaram vários conceitos sobre o envolvimento paterno e observaram que não há consenso entre os pesquisadores. Apesar de não terem encontrado muitas publicações sobre o tema, é de grande importância destacar aqui a conclusão do estudo de uma das pesquisas examinada pelas mesmas, o trabalho de Cia, Barham e Fontaine (2012) que diz que, quanto maior a frequência de comunicação entre pai e filho, a participação do pai no cuidado com os filhos e a participação do pai nas atividades escolares, culturais e de lazer do filho, maior o desempenho acadêmico e o autoconceito das crianças. Zucoloto e Moreira (2016), no trabalho que desenvolveram, observaram que As entrevistadas reconheceram no cotidiano escolar uma nova paternidade, um pai mais presente, e participativo na vida dos filhos [...] e que, na fala das professoras, ficou evidente a percepção da existência de mudanças na paternidade, por exemplo, a presença de um pai mais afetuoso, mais participativo da vida dos filhos, inclusive na vida escolar, ou seja, mais comprometido, disponível e responsável. (ZUCOLOTO; MOREIRA, 2016, p. 157). É nesta conjuntura que aflora a nova figura paterna, imbricada de forma a atender as exigências de uma nova convivência familiar. É com esse olhar que se pretende compreender o novo pai que emerge nas relações familiares, a partir da abordagem relacional que parece delinear percursos que podem favorecer o reencontro da figura paterna e vislumbrar, depois de décadas de decadência, sinais da sua renovação (PETRINI, 2019, p. 58). REFERÊNCIAS CÚNICO, Sabrina Daiana e ARPINI, Dorian Mônica. A família em mudanças: desafios para a paternidade contemporânea. Pensando fam. [online]. 2013, vol.17, n.1, pp. 28-40. ISSN 1679-494X. DAZZANI, Maria Virgínia; FARIA, Marcelo. Família, escola e desempenho acadêmico. In: LORDÊLO, JAC.; DAZZANI, M. V., Orgs. Avaliação educacional: desatando e reatando nós [online]. Salvador: EDUFBA, 2009. 349 p. ISBN 978-85-232-0654-3. Available from SciELO Books. DESSEN, Maria Auxiliadora; POLONIA, Ana da Costa. 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